Título: Briga por domínio do mercado do lixo já provocou dois assassinatos
Autor: Bruno, Cássio; Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 21/09/2008, O País, p. 4

Albertino Guedes, em Belford Roxo, e Kenedi Jaime, em Meriti, foram as vítimas

Cássio Bruno e Chico Otavio

A briga por uma fatia do mercado do lixo, uma indústria que movimenta R$40 milhões por mês nas 22 maiores cidades fluminenses (com mais de 100 mil habitantes), já produziu dois crimes na Baixada Fluminense. Como ocorre na maior parte dos crimes políticos na região, nenhum dos dois assassinatos, ocorridos em Belford Roxo e São João de Meriti, foi esclarecido.

Em 2005, recém-rebaixada ao Grupo B, a Inocentes de Belford Roxo, escola de samba da cidade, atravessou a avenida louvando a reciclagem. ¿Tem que tirar da cabeça a solução genial. Reciclar, aproveitar, transformando o lixo em luxo, é a saída¿, conclamava o samba. Em outro trecho, a composição alertava que ¿a sede da ambição transforma o homem em devorador¿. Cinco meses depois, em 26 de agosto, o vereador Albertino Martins Guedes seria morto a tiros no município, no meio de um escândalo ligado ao lixo.

Albertino era o relator da CPI que apurou o desvio de R$1,8 milhão da União para a construção de um aterro sanitário na cidade em 2004. O vereador foi morto um dia antes de apresentar o relatório final no plenário. No documento, o ex-secretário de Governo João Santana ¿ da gestão do ex-prefeito e hoje candidato a vereador Waldir Zito (PSDB) ¿, fora citado como o ¿grande mentor¿ da fraude.

¿ Fui ouvido na CPI e não soube de mais nada. Você (repórter) é o primeiro a me dizer isso. Não tive acesso ao relatório ¿ afirmou Santana.

Hoje, João Santana (PSDB) é candidato a vice-prefeito de Belford Roxo na chapa de Claudio Henrique, o Barack Obama da Baixada (PTB). Santana é ligado ao deputado José Camilo Zito (PSDB), irmão de Waldir e candidato a prefeito de Duque de Caxias. Além de Albertino, Marquinhos Gandra (PDT) e Dennis Macedo (PTC) faziam parte da CPI do Lixo.

O titular da Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), Ruchester Barbosa, disse que o inquérito está na fase de análise das interceptações telefônicas.

¿ Vou convocar cinco pessoas para depor nas próximas semanas, incluindo alguns políticos ¿ garantiu Ruchester.

Em São João, vítima era da comissão de licitação

Em 2002, o então presidente da Comissão de Licitação da prefeitura de São João de Meriti, Kenedi Jaime de Souza Freitas, também foi morto na briga do lixo. O crime ocorreu depois que a empresa Monteiro & Ferrari perdeu a concorrência para a Prata Ambiental Ltda, que pertencia ao filho do ex-deputado Cornélio Ribeiro, Alexsander Ribeiro.

Um dos sócios da Monteiro & Ferrari, Ronaldo Ferrari, foi preso, em 2003, suspeito de ser o mandante do crime. Além dele, o diretor comercial do jornal ¿Hora H¿, José Roberto Ornelas de Lemos, também foi preso acusado de chefiar o grupo de extermínio que executou Kenedi. A Justiça não encontrou indícios que comprovassem as participações de Ronaldo e Roberto no assassinato.

Em depoimento ao Ministério Público (MP), Ronaldo e o sócio Artur Monteiro disseram que combinavam as renovações dos contratos sem licitação com o então vice-prefeito Iranildo Campos, que negou envolvimento. O ex-prefeito Antônio de Carvalho chegou a fazer, em cinco anos, 15 contratos sem licitação com a Monteiro & Ferrari, totalizando R$24 milhões.