Título: Dois padrões de aprendizado
Autor: Klingl, Erika; Toscano, Izabel
Fonte: Correio Braziliense, 27/05/2009, Cidades, p. 21

Análise do ensino nas escolas públicas do DF mostra que o conteúdo assimilado pelos alunos é acima da média nacional nos primeiros anos. Após atingir mais alto patamar do país na 4ª série, nível de conhecimento despenca

Os alunos da rede pública de ensino do Distrito Federal têm ótimo desempenho nos primeiros anos da vida escolar. Na 4ª série, o nível de aprendizado dos estudantes é o melhor do país. No entanto, a partir da 6ª série do ensino fundamental, a quantidade de conhecimento adquirido nas salas de aula começa a perder ritmo e o ensino da capital deixa de fazer parte da elite do país. A queda se reflete no aprendizado até o último ano do ensino médio. O diagnóstico faz parte de um conjunto de avaliações feitas pelo próprio governo e que foram divulgadas ontem pelo governador José Roberto Arruda. Os resultados mostram que a maioria dos estudantes alcança o conhecimento básico (mínimo) em todos os níveis, mas que, a cada ano escolar, cresce a distância entre as competências esperadas para meninos e meninas e o que é efetivamente apreendido.

¿A grande vantagem da avaliação não é saber onde a gente melhorou, mas, sim, onde precisamos melhorar. Os relatórios pedagógicos darão a cada professor instrumentos para que ele identifique o que os alunos sabem menos e em que parte do conteúdo programático eles têm de se aprimorar¿, argumentou Arruda, na apresentação do Sistema de Avaliação de Desempenho das Instituições Educacionais do DF (Siade). A partir desta semana, as 539 escolas que participaram das provas receberão um boletim apontando as falhas em cada instituição. Junto virá um relatório pedagógico que permitirá aos professores trabalharem focados no que os alunos não estão aprendendo.

Para se ter uma idéia, na 2ª série do ensino fundamental a nota dos estudantes em português é 25 pontos maior do que o esperado para alunos nessa faixa escolar. Na prática, isso quer dizer que eles aprendem mais do que precisariam para passar de ano. Em matemática, o patamar é considerado adequado. Na 4ª série, o bom desempenho se mantém e, com a atual nota do Siade, o DF ocupa o primeiro lugar nacional na competência dos estudantes quando comparados com o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2007, divulgado ano passado pelo Ministério da Educação. A liderança se repete pelo segundo ano consecutivo, uma vez que, na ocasião, o DF também ficou em primeiro. A avaliação do MEC se resume às 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e 3º ano do ensino médio. O GDF acrescentou duas outras séries: 2ª e 6ª do ensino fundamental.

Mudança radical O salto de conhecimento adquirido é consistente até chegar à 6ª série (veja tabela). De acordo com o Siade, a partir daí, a curva do ganho de aprendizagem perde força. Em língua portuguesa, a evolução vai de 195,1 pontos (4ª série) para 204,1 (6ª série) ¿aumento de apenas nove pontos, contra 130 entre a 2ª série e a 4ª série. Já em matemática, a pontuação passa de 207,8 (4ª série) para 211,2 (6ª série) ¿ 3,6 pontos. Da 2ª série para a 4ª série, a evolução é de 160 pontos. ¿Estudamos preliminarmente os dados e concluímos que a defasagem pode ser causada pela mudança que ocorre na 5ª série, quando o aluno passa a ter um professor por disciplina, o que exige adaptações e, eventualmente, menos ganho de aprendizagem¿, justifica o secretário de Educação José Luiz Valente.

¿Na 4ª série, somos os primeiros do país e caímos para o sétimo lugar na 8ª série. Sempre imaginamos um problema no fim do ciclo. Com o Siade, descobrimos que ele é anterior e tem relação com a mudança significativa que os alunos sofrem¿, avalia Gláucia Araújo Guerra, coordenadora de avaliação da educação da Secretaria. A análise da pesquisadora deve-se, em parte, à comparação com outros estados que fizeram avaliação semelhante na 6ª série e encontraram quedas no aprendizado dos alunos. É o caso de Rio Grande do Sul, Pernambuco e São Paulo.

Atualmente na 6ª série, Maria Luyne Araújo e Amanda Idala Dias de Silveira, ambas de 12 anos, sabem bem das dificuldades da passagem pela 5ª. As colegas, que estudam na parte da tarde no Centro de Ensino Fundamental 8, na QNA 52 de Taguatinga, precisaram se desdobrar para se adaptar à nova rotina. ¿Antes, a gente tinha uma professora e quatro matérias. Era fácil aprender. Hoje, são uns 10 professores¿, afirma Maria. ¿Agora, a gente precisa dividir bem os horários para dar conta de estudar todas as matérias ao mesmo tempo¿, emenda Amanda. Para elas, o volume de disciplinas e o aumento no número de professores se tornaram uma barreira a ser transposta.

Carga horária A professora de língua portuguesa Ana Paula Carrijo conhece a dura rotina dos jovens alunos e se esforça para ajudá-los. ¿Eles enfrentam dificuldades porque ainda são crianças e, ao mesmo tempo, adolescentes. O volume de matérias é superior ao da 4ª série, por exemplo, e o de professores também. Eles têm que aprender a administrar a carga horária e cada professor tem um perfil, uma forma de ensinar¿, explica Ana Paula. Para a professora, o maior obstáculo é que na 6ª série as disciplinas são lecionadas de forma mais específica. Até a 4ª, os assuntos eram passados de forma geral. ¿Agora, até o uso da caneta é novidade. Antes só existia o lápis¿, diz a professora.

A queda nas 5ª e 6ª séries é levemente superada nos anos que se seguem, mas, em nenhum outro momento, a nota média volta a alcançar os níveis esperados de aprendizagem. ¿Estamos numa estabilidade perigosa, porque não avançamos¿, avalia o governador, que defende que os resultados do Siade sejam usados como parâmetro para pagar o 14º salário aos professores. O projeto está na Câmara Legislativa.