Título: Conselho de Segurança sob ataque
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 27/09/2009, O Mundo, p. 43

Insatisfeito com atuação do órgão diante do golpe, Lula defende reformas

HONDURAS E SEUS DOIS PRESIDENTES

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez ontem duras críticas ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, ao discursar na abertura da Segunda Cúpula América do SulAacute;frica (ASA).

Lula demonstrou insatisfação com a atuação do conselho, diante do golpe de Estado em Honduras e do cerco à embaixada brasileira em Tegucigalpa, que desde segunda-feira passada abriga o presidente deposto hondurenho, Manuel Zelaya.

¿ Nesse debate sobre a nova governança global, uma coisa é certa: o Conselho de Segurança das Nações Unidas perdeu relevância. Devemos trabalhar juntos pela sua reforma, sob pena de perdermos a oportunidade de garantir nosso direito a uma voz nas grandes questões da agenda internacional ¿ afirmou o presidente.

Kadafi também condena conselho

Segundo Lula, 65 países com mais de um bilhão de pessoas estão excluídos das decisões centrais do conselho.

Pouco antes das críticas, o presidente brasileiro voltou a repudiar o golpe em Honduras, como vem fazendo desde a queda de Zelaya. Para Lula, não se pode mais permitir retrocesso democrático na região.

¿ Lutamos muito para varrer para a lata de lixo da História as ditaduras militares de outrora. Não podemos permitir retrocessos desse tipo em nosso continente. Esta é uma lição importante para nós, sul-americanos, no limiar do século moldado pela democracia e o multilateralismo ¿ disse.

As declarações de Lula foram precedidas por discursos dos presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, e da Líbia, Muamar Kadafi. O líder líbio também voltou a criticar o Conselho de Segurança da ONU: ¿ O mundo não é o Conselho de Segurança. O Conselho de Segurança é insustentável. Eles (países que integram o conselho em caráter permanente) têm direito a veto e nos não temos direito algum ¿ disse Kadafi.

A reunião de chefes de Estado da América do Sul e da África deve se encerrar hoje com uma veemente condenação formal contra o golpe em Honduras e também contra o cerco à embaixada do Brasil em Tegucigalpa.

A ideia para incluir a condenação na declaração final partiu do governo brasileiro e teve imediato apoio de Chávez. O presidente venezuelano chegou a oferecer apoio financeiro e logístico para o retorno de Zelaya a Honduras, na última segunda-feira.

¿ Em qualquer lugar que vamos, temos que rechaçar com muita força esta agressão à embaixada brasileira ¿ disse Chávez, pouco antes do início da cúpula, ontem à tarde.

O documento seria apresentado aos demais presidentes presentes ao encontro. Mas Chávez disse que não tinha dúvidas de que a declaração receberia apoio de todos os chefes de Estado e de governo reunidos em Isla de Margarita.

A primeira proposta de condenação ao golpe foi preparada pelo governo brasileiro na noite de sexta-feira. O Brasil decidiu aumentar a pressão contra o governo de Roberto Micheletti, que está no comando de Honduras desde o golpe de Estado, após o suposto ataque com gás tóxico à embaixada brasileira em Tegucigalpa.

¿ O que está se discutindo aqui é a democracia na América do Sul ¿ disse um diplomata brasileiro.

Mas o eventual apelo pelo retorno da normalidade democrática em Honduras pode não ter a força esperada por Lula e Chávez. Entre os chefes de governo que participam da cúpula estão os presidentes da Líbia, Muamar Kadafi (cujo país sediará a próxima reunião do grupo, por sugestão de Chávez), e do Zimbábue, Roberto Mugabe. Os dois estão há longos anos no poder.

Num dos intervalos da cúpula, estava prevista uma reunião bilateral entre Lula e Chávez para tratar de assuntos econômicos de interesse dos dois países. Mas até o fim do dia isso não se confirmou e existia expectativa de que a reunião bilateral ocorreria hoje pela manhã.

Diplomatas brasileiros e venezuelanos estavam também trabalhando para garantir, ainda durante a cúpula, a assinatura do acordo de criação do Banco do Sul, formado por todos os países da Unasul (União das Nações da América do Sul). O banco terá por objetivo financiar obras de infraestrutura e de integração entre os países da região.