Título: Os países que escolherem a energia nuclear vão sobreviver, diz especialista
Autor: Melo, Liana
Fonte: O Globo, 29/09/2009, Economia, p. 24

Pressão ambientalista cria uma `paranóia¿ que só pressiona custos, afirma

Especialista em economia sustentável, o suíço Andre Maïsseu, presidente do Conselho Mundial de Trabalhadores Nucleares (Wonuc, sigla em inglês), está no Rio participando do International Nuclear Atlantic Conference (Inac, sigla em inglês). Radicado na França e professor da Universidade de Sorbonne, o economista está convencido de que a pressão ambientalista está criando uma ¿paranóia por segurança¿ na União Europeia.

Liana Melo

O GLOBO: O Brasil e a França estão virando fortes parceiros comerciais, inclusive na área nuclear. Só que entidades ambientalistas, como é o caso do Greenpeace, criticam duramente a gigante francesa Areva. Se os ambientalistas estiverem com a razão, isto significa que o Brasil estaria correndo o risco de fechar negócio com um parceiro ultrapassado do ponto de vista tecnológico?

ANDRE MAÏSSEU: As críticas do Greenpeace e de outras entidades ambientalistas demonstram incompetência ou uma vontade deliberada de manipular a opinião pública. Ao contrário do que dizem essas entidades, o European Pressurized Reactores (EPRs) é um reator de terceira geração, que utiliza uma tecnologia madura, perfeitamente conhecida e aprovada.

Não é o caso dos reatores de quarta geração, que, por enquanto, não existem, e que, quando começarem a ser fabricados, utilizarão uma tecnologia nova. Hoje, existem cerca de 300 reatores EPR espalhados pelo mundo.

Não seria então o caso de comprar os modelos mais novos?

MAÏSSEU: A novidade dos EPRs de quarta geração são os equipamentos de segurança complementares. Só que estes equipamentos estão sendo fabricados num clima de paranóia de segurança, que tomou conta das mentes dos funcionários da União Europeia.

É que eles estão vivendo hoje sob pressão constante dos grupos ambientalistas.

Considero estes equipamentos de segurança inúteis, já que eles não aumentam a segurança dos reatores. Apenas pressionam os custos de produção do equipamento, o que acaba tornando o quilowatt/ hora da energia nuclear menos competitivo.

Um relatório recente da ONG francesa Global Chance acusa a Areva, responsável pelo reator da usina de Olkiluoto, na Finlândia, de superfaturamento.

O senhor acha que esta acusação também é sem fundamento?

MAÏSSEU: O s problemas que a Areva está enfrentando na Finlândia são dificuldades administrativas e não técnicas. Realmente, os custos desta usina hoje já atingiram a soma de C 2,3 bilhões.

É provável que este valor venha a superar a barreira de C 3 bilhões.

Tramitano Congresso Nacional uma proposta para a quebra do monopólio estatal de exploração do urânio. Se aprovada, isto poderá provocar uma corrida ao país, já que o Brasil é uma das poucas potências mundiais de urânio que realiza praticamente todo o processo de enriquecimento do produto?

MAÏSSEU:Por que o Brasil sacrificaria sua posição privilegiada no tabuleiro internacional como fornecedor de combustível nuclear contra um papel modesto no comércio exterior? Se fizer isso, vai acabar ficando sujeito aos caprichos da variação de preço das commodities minerais.

Com a quebra do monopólio, o país resolveria apenas um problema de curto prazo, porque aumentaria seus lucros com a venda do urânio.

Só que esta posição não combina com a política energética brasileira. A meu ver, seria um opção meramente comercial.

O senhor acredita que a energia nuclear é a tecnologia do século XXI?

MAïSSEU: A tecnologia nuclear vai ajudar a construir um novo ciclo que, em vez de superexplorar os recursos naturais, investirá no desenvolvimento das capacidades humanas. A Idade Média foi capaz de crescer por meio da exploração da energia hidrelétrica.

A Grã-Bretanha assumiu a liderança dos países desenvolvidos com a mineração de carvão no século XIX.

Os EUA fizeram o mesmo com o petróleo e, assim, impôs sua liderança. Os países que escolherem, no século XXI, a energia nuclear vão sobreviver, enquanto os outros tendem a desaparecer. Por não produzir resíduos e não emitir gases de efeito de estufa, a energia nuclear oferece à humanidade a possibilidade de viver, nos próximos dois mil anos, com recursos energéticos abundantes e a um custo mais competitivo. O Brasil só tem a ganhar.

Considero estes equipamentos de segurança inúteis. Acabam tornando o quilowatt/hora nuclear menos competitivo

A tecnologia nuclear vai ajudar a construir um novo ciclo que ajudará no desenvolvimento das capacidades humanas