Título: Acordo ainda distante para crise em Honduras
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 08/10/2009, O Mundo, p. 33

Representantes da OEA chegam ao país e pedem a governo interino que Zelaya possa sair da Embaixada do Brasil

TEGUCIGALPA. Em clima tenso marcado por recriminações de ambos os lados, representantes da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do governo interino de Honduras descartaram completamente a possibilidade de um acordo imediato que ponha fim à crise que já dura mais de três meses, intensificada nas últimas semanas com o retorno do presidente deposto Manuel Zelaya ao país. A expectativa é que as negociações avancem na próxima semana. Ontem, acordou-se a criação de duas subcomissões: uma para debater a restituição de Zelaya e outra para discutir os outros temas.

O secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, e o chanceler do governo interino, Carlos Lopes Contreras, descartaram uma solução imediata.

- Isso é para uma semana ou mais - disse Insulza, que ontem à noite pediu ao governo interino que Zelaya, instalado com dezenas de seguidores na embaixada brasileira, possa ir para "um local mais confortável".

Micheletti acusa OEA de não querer saber a verdade

No discurso de abertura da rodada de negociação, Insulza deixou claro que o marco para o início do diálogo é o acordo de San José, articulado em julho pelo presidente da Costa Rica, Oscar Árias. Insulza destacou cinco dos 11 pontos originais do acordo: restituição de Zelaya, retirada do projeto de reforma constitucional, anistia política, formação de um governo de conciliação e presença de organismos internacionais para garantir o cumprimento do pacto.

Insulza deixou claro que a solução será doméstica, mas foi duro ao cobrar resultados.

- Não estamos aqui para fazer recriminações mútuas nem para um debate histórico. Viemos para encontrar soluções concretas para uma situação que já não pode se prolongar - afirmou.

O presidente interino, Roberto Micheletti, usou um tom duro ao discursar para a OEA.

- Vocês não sabem toda a verdade e não quiseram saber. Nunca escutaram nossas razões. Aqui não temos medo dos EUA, nem do Brasil, nem do México, temos medo de Manuel Zelaya, ficamos aterrorizados com Manuel Zelaya - disse Micheletti, negando que a suspensão das liberdades individuais tenha afetado a população. - O decreto que suspendeu algumas garantias constitucionais não é estado de sítio. Foram os dias mais tranquilos para a população.

Segundo fontes na OEA, a negociação enfocará a restituição e a anistia, pois os demais pontos estão próximos do consenso. Para John Biehl, assessor de Insulza, o prazo é de 15 dias.

Em seu discurso, Contreras voltou a cobrar que o Brasil defina o status diplomático de Zelaya e pedir que a embaixada não seja usada como plataforma pelo presidente deposto. Além disso, rebateu a acusação do enviado brasileiro, Ruy Casaes, de que Zelaya não teve direito a um julgamento nem a defesa plena.

- A Carta Democrática (da OEA) também prevê sanções a governos que atentem contra a democracia, e a OEA não fez nada contra Zelaya.

O chanceler, que afirmara estar revogado o decreto suspendendo direitos civis, vigente há 11 dias, foi desmentido pelo porta-voz da polícia.

- O decreto continua em vigência e com base nele fizemos esta ação policial - disse Daniel Molina, justificando a dura repressão a um protesto de 200 aliados de Zelaya na porta da Embaixada dos EUA.

A repressão ao protesto foi o ponto alto da escalada de tensão em Tegucigalpa com a chegada da delegação da OEA. Centenas de policiais e soldados circulavam pela cidade e cercavam o hotel onde ocorreu a reunião. Os chanceleres entraram no hotel por um corredor formado por policiais com fuzis AR-15.