Título: Viés centralizador
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Fonte: O Globo, 13/10/2009, Opinião, p. 6

A produção brasileira de petróleo e gás certamente dará um salto quando estiverem em operação os campos já descobertos na chamada camada do pré-sal. Embora essa expansão só possa ser efetivamente assegurada quando forem delimitadas as reservas, e os testes de longa duração confirmarem a produtividade provável dos campos, simulações indicam que o Brasil terá um saldo positivo na balança comercial do petróleo (exportações menos importações), da ordem de 1 milhão de barris diários.

Com isso, o petróleo deverá liderar a lista dos produtos que o Brasil estará exportando mais ao fim da próxima década. O petróleo é negociado para pagamento à vista (menos de 90 dias). Então é um volume de recursos que pode ter, de fato, forte impacto nas finanças externas do país. Como é uma riqueza finita, a prudência e a experiência econômica recomendam que o Brasil tente poupar ao máximo essa renda adicional proveniente das exportações de petróleo. O mecanismo mais usual é conhecido como fundo soberano, por meio do qual as divisas são mantidas em aplicações seguras que proporcionem, preferencialmente, bom retorno e ainda contribuam positivamente para o desenvolvimento da economia brasileira.

Os resultados dessas aplicações devem ser direcionados para investimentos internos que possibilitem avanços sociais importantes (educação, infraestrutura, meio ambiente, ciência e tecnologia). É uma estrutura que precisa estar institucionalmente bem definida, abrindo-se a possibilidade de renovação nas prioridades, que devem ser ajustadas à realidade futura.

Não são poucos os exemplos de oportunidades desperdiçadas por países pouco desenvolvidos que descobriram grandes reservas de petróleo. O Brasil, face ao tempo que se tem pela frente até que a produção do pré-sal se materialize, pode se preparar para evitar esse tipo de maldição.

Um equívoco é a centralização da administração dos recursos no Executivo federal. É o que acontecerá com o fim da participação especial, distribuída entre estados e municípios das áreas produtoras.

Com o pré-sal, governadores e prefeitos, mantida a participação especial, teriam condições de executar projetos com o conhecimento da realidade local, distante do burocrata de Brasília. E sem prejudicar a Federação, pois o Tesouro recolhe quase a metade desses recursos, e pode destiná-los a outras regiões.