Título: Freio na Bolsa e no dólar
Autor: Rangel, Juliana; Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 21/10/2009, Economia, p. 23

Após taxação de estrangeiros, moeda sobe a R$ 1,745. Bolsa cai 2,8% e ação da BM&FBovespa despenca 8,4%

A decisão do governo de taxar com Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 2% os investimentos estrangeiros, para segurar a valorização do real frente ao dólar, caiu como uma bomba ontem nos mercados de câmbio e ações. Investidores que consideravam que a Bolsa já havia subido muito no ano venderam seus papéis para embolsar lucros. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), fechou em queda de 2,88%, aos 65.303 pontos ¿ nenhuma ação encerrou em alta. Foi o maior recuo percentual desde 22 de junho, quando despencou 3,66%. O dólar também teve a maior alta desde a mesma data: chegou a subir 3,03% e bateu em R$ 1,765, mas fechou o dia a R$ 1,745, com valorização de 1,87%.

No pior momento do dia, a queda da Bolsa chegou a 4,7%. As ações que mais sofreram foram as da própria BM&FBovespa. Como sua principal fonte de ganhos são os emolumentos (taxas sobre a negociações), ela poderá ter quedas de receita, com a inibição do investimento estrangeiro em ações. Os papéis tiveram a maior queda do Ibovespa, de 8,41%.

¿ Entre comprar uma ação aqui ou uma ADR (American Depositary Receipt, espécie de recibo de ação de empresa brasileira negociado nos Estados Unidos) sem imposto, o investidor estrangeiro vai preferir a ADR ¿ disse Felipe Viana, gestor da SLW Asset.

A empresa chegou a convocar uma conferência com analistas, durante a qual teria afirmado que tentará reverter a medida. Um dos principais argumentos é que as companhias menores, sem condições de sustentar um programa de ADRs, serão as principais prejudicadas, e podem perder liquidez.

As ADRs da Vale, por exemplo, caíram 3,08% na Bolsa de Nova York. O papel ordinário (ON, com direito a voto) recuou 1,80% no Brasil mas, considerada a desvalorização do real, as perdas sobem para 3,60%. O mesmo ocorreu com as ADRs da Petrobras: caíram 3,44% nos EUA. No Brasil, a queda das ações ON foi de 4,08% em dólares e de 1,77% em reais.

Especialistas veem efeito apenas a curto prazo

Apesar da reação inicial, especialistas acham que o novo imposto não afetará investimentos estrangeiros, especialmente aqueles que pensam a médio e longo prazos: ¿ Na Bolsa é possível ganhar muito mais, 2% de IOF é pouco. Mas, sem dúvida, isso trava um pouco o fluxo estrangeiro nesse primeiro momento e, como a Bolsa já estava esticada (sobrevalorizada, no jargão do mercado), a força vendedora do investidor local prevaleceu ¿ disse o analista da Um Investimentos, Hersz Ferman.

Além disso, o decreto que elevou a alíquota do IOF ¿ zerada em outubro de 2008, em meio à crise internacional ¿ diz que recursos estrangeiros já aplicados no Brasil não serão afetados. Com isso, algumas operações de day trade (compra e venda no mesmo dia) de quem já está no mercado brasileiro não serão taxadas, a não ser que os investidores tragam mais dinheiro.

No câmbio, o efeito deverá ser ¿psicológico¿, na avaliação do diretor-executivo da NGO Corretora de Câmbio, Sidnei Nehme.

¿ Não há fundamento para (o dólar) subir ainda. Pode até reduzir o fluxo para o país, mas não é o fluxo que tem determinado a queda do dólar, mas os investimentos dos bancos no mercado futuro ¿ defende.

Segundo ele, antes, os bancos estariam vendendo dólar no mercado à vista. Com o novo IOF, teriam mudado de estratégia, apostando na alta da moeda em contratos negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), o que teria ajudado a puxar a cotação no mercado à vista ontem.

Com o IOF, a negociação de dólar à vista na BM&F movimentou US$ 520 milhões, suprimindo a máxima anterior, de US$ 420,750 milhões, de setembro de 2008.