Título: Empresa ligada à Petrobras vira alvo
Autor: Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 31/05/2009, Política, p. 2

Na CPI, oposicionistas e governistas miram na Transpetro, responsável pelo transporte de combustíveis. Mas o que eles querem mesmo é acertar o presidente da subsidiária, apadrinhado de Renan Calheiros

Os senadores elegeram a Transpetro como um dos principais focos da investigação da CPI da Petrobras. O ponto de partida das apurações será as auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU), que apontam irregularidades na subsidiária da Petrobras responsável pelo transporte ¿ por tubos, em terra, ou por navios, no mar ¿ de óleos e derivados. Inspeções do TCU já identificaram casos de pagamentos indevidos no processo bilionário de compra de navios até gastos com artigos de luxo. Ao focar na Transpetro, senadores oposicionistas, e até governistas, têm o objetivo de minar o poder do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, amigo e padrinho político do presidente da subsidiária, Sérgio Machado. A CPI começa na próxima terça.

Com o aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Renan Calheiros comandou toda a negociação para a escolha da tropa de choque governista na CPI. Depois de um período sabático, o movimento o expôs politicamente e causou atritos dos lados oposicionista e governista. A oposição vê a comissão como uma possibilidade de ir à forra. Não engoliram até hoje o fato de Renan ter escapado da cassação quando presidia o Senado em 2007. Senadores do PT, por sua vez, estão em atrito com Renan depois de terem sido alijados das principais negociações da CPI. Os petistas tentaram sem sucesso entregar a presidência da comissão para o DEM de forma a não dar mais poder ao PMDB.

Reservadamente, todos enxergam Machado como o calcanhar de aquiles do atual líder peemedebista. O presidente da Transpetro chegou ao cargo, há seis anos, por indicação de Renan. Ex-líder tucano no Senado, perdeu a disputa ao governo cearense em 2002, já filiado ao PMDB. Antes de assumir o comando da Transpetro, no Rio, alugou um flat que Renan Calheiros tinha em Brasília. Mas manteve, segundo senadores, a proximidade com o líder do PMDB. Nos últimos anos, colegas de Renan relataram terem presenciado vários encontros entre o senador e o presidente da Transpetro em conversas sobre projetos da subsidiária. Segundo uma das testemunhas, num encontro recente ocorrido tarde da noite no gabinete de Renan, no 15º andar do Senado, o peemedebista emitio opiniões sobre empreendimentos da empresa.

Procurado, o líder do PMDB não retornou aos recados deixados no celular e com os assessores. Em resposta enviada pela assessoria de imprensa por e-mail, o presidente da Transpetro não respondeu sobre o motivo dos eventuais encontros dele com Renan. Disse apenas que ¿suas viagens à capital federal atendem a uma agenda administrativa, comum a qualquer executivo de uma empresa estatal¿. ¿Machado mantém contatos com senadores de diversos partidos, não apenas pelo cargo que ocupa atualmente, como também por ter sido ele mesmo senador da República pelo estado do Ceará durante oito anos¿, aponta a nota da assessoria do presidente da Transpetro.

Auditorias À cata de informações, os senadores pretendem usar investigações do TCU para lançar luz na Transpetro. Uma auditoria do tribunal constatou irregularidades no processo de compra de 26 navios, um investimento avaliado em R$ 5,6 bilhões. Num dos casos de 2007, os auditores descobriram que um escritório de advocacia contratado por R$ 4,7 milhões pela subsidiária não tinha a devida ¿notória especialização¿, argumento que levou a Transpetro prescindir da licitação. Além de realizar serviços de advocacia que seriam atribuições do próprio departamento jurídico, o escritório subcontratou juristas de fora para fazerem pareceres durante a fase de pré-qualificação. Por determinação de ministros do TCU, a investigação passou a correr num processo independente.

Na mesma auditoria, o TCU ordenou que a Transpetro excluísse cobranças indevidas de dois contratos de construção de navios. Segundo o TCU, no primeiro, de US$ 517 milhões, houve a inclusão equivocada de US$ 1,034 milhão a título de gastos a serem efetuados com causas trabalhistas. No segundo contrato, colocaram US$ 698 mil em despesas com salários e encargos trabalhistas fora de hora. Só nesses dois erros, de acordo com o TCU, os custos dos contratos aumentaram em R$ 3,9 milhões.

Canetas Outra auditoria do tribunal se debruçou sobre gastos da comunicação social do órgão e identificou, desde a compra de canetas Mont Blanc, patrocínios para uma escola de samba e até para um evento de um parente de um ex-diretor da subsidiária. Em resposta por e-mail, a estatal disse que nenhuma conta da companhia, incluindo as três citadas pela reportagem, foi julgada irregular pelo TCU. ¿Todas as recomendações do tribunal, decorrentes das auditorias de rotina, são observadas e as informações necessárias prontamente repassadas. A Transpetro, como empresa do Sistema Petrobras, adota o procedimento de licitação simplificado regulado pelo Decreto Presidencial 2.745/98¿, defendeu-se a Transpetro em nota. A empresa sustenta que, com base na Constituição, ¿não está citada como `fato determinado¿ da CPI em questão¿. Ou seja, não pode, em tese, ser alvo da investigação. Os senadores discordam. E miraram na subsidiária e, por tabela, no líder do PMDB. ¿Renan sabe que não pode brincar na CPI¿, alerta um cacique petista, interessado em minar o poder do peemedebista.