Título: Real deve continuar forte pelo menos até 2010, segundo os especialistas
Autor: Frisch, Felipe; D'Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 21/10/2009, Economia, p. 24

Se novas ações forem adotadas, grau de investimento pode ficar em risco

RIO e SÃO PAULO. A decisão do governo de taxar a entrada de investimentos no país em 2% via Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é inócua, na visão de analistas. A avaliação é que a medida não vai conter a queda do dólar e que o real deve se manter forte pelo menos até 2010, com a alta das commodities e a recuperação do país.

O Brasil é considerado o primeiro país emergente com câmbio flutuante a adotar medidas taxando a entrada de recursos. Em geral, estas nações estão preocupadas com a desvalorização de suas moedas ¿ não com a valorização delas ¿ e a inflação decorrente do câmbio depreciado.

O objetivo em outros países emergentes, igualmente ao argumento usado pelo governo brasileiro agora, é inibir o chamado ¿capital especulativo¿, que entra e sai rapidamente, derrubando a moeda local. A medida anunciada pelo Ministério da Fazenda foi comparada apenas à quarentena adotada pelo Chile nos anos 1990, quando a economia do país estava em forte expansão. Na ocasião, de 10% a 30% do valor ingressado ficava retido como compulsório.

¿ O mercado está voltando agora, não se pode cortar as asas de quem avalia bem o Brasil. O governo acabou de dar uma vantagem comparativa de 2% aos outros países emergentes ¿ diz o especialista em câmbio e sóciodiretor da Tendências Consultoria, Nathan Blanche, discorda que haja ¿capital especulativo¿, como o governo argumenta.

Para o economista, a situação do Brasil não é diferente da de outros países exportadores de commodities, como Austrália, Canadá e Nova Zelândia. Nesses países, o dólar americano cai 23,94%, 13,90% e 22,76%, respectivamente, no ano. Para Nathan, também não é um problema que o câmbio no Brasil volte a ser de ¿R$ 1 para US$ 1¿.

O vice-presidente de Crédito Soberano para a América Latina da agência Moody¿s, Mauro Leos, afirmou ontem que a decisão do governo brasileiro ¿pouco efetiva¿ para conter os fluxos de moeda estrangeira ao país e seus efeitos sobre o câmbio. Segundo Leos, por ter retomado o processo de crescimento já a partir do segundo trimestre, o Brasil está ¿no topo da lista¿ dos investidores em todo o mundo.

¿ Quem já está no Brasil pensa em aumentar sua exposição, e quem não está quer investir no país ¿ afirmou.

Mesmo com a taxação, observou, os retornos oferecidos pelo país são um atrativo. Ele citou a taxa real de juros, acima de 5% ao ano, e que remunera aplicações de renda fixa. A expectativa é que os fluxos internacionais para o Brasil continuem fortes até ano que vem.

¿ O real vai continuar forte o resto deste ano, e pelo menos até o fim de 2010.

Leos lembrou que há outras medidas possíveis para atenuar o efeito do câmbio sobre as empresas exportadoras, tais como a concessão de benefícios tributários e incentivos financeiros.

Mas estas, disse, também são ações com efeito restrito sobre a apreciação do real.

¿ As companhias terão que aprender a conviver com essa realidade (o real forte) por um período de tempo.

Dólar sofre `morte lenta¿, para professor de Harvard A agência concedeu ao país, em setembro, o ¿grau de investimento¿ ¿ chancela dada a países considerados seguros para se investir. Foi a terceira grande agência a fazer isso.

Para Nathan, da Tendências, a taxação da entrada de recursos não muda a avaliação do Brasil.

No entanto, se novas medidas, como a taxação de exportações, forem adotadas, à semelhança da Argentina, a nota do Brasil pode, sim, ser afetada negativamente.

¿Daqui a dez anos haverá mais de uma moeda para reservas internacionais¿, afirmou ao blog Tech Ticker o professor da Universidade de Harvard Niall Ferguson, acrescentando que o dólar ¿está sofrendo uma morte lenta¿. ¿A morte do dólar está sendo procrastinada. É um processo que levará décadas¿, afirmou Ferguson, autor do livro ¿A ascensão do dinheiro: Uma história financeira do mundo¿ (editora Planeta). Ele espera que a moeda americana se desvalorize mais 20% ainda este ano.