Título: Pré-sal: Rio pode perder US$ 30 bilhões
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 23/10/2009, Economia, p. 37

Cálculo considera que não haverá cobrança de PEs sobre barris usados na capitalização da Petrobras

BRASÍLIA e CURITIBA. O Estado do Rio terá uma perda de receita de US$ 30 bilhões ao longo de 26 anos sem a cobrança de Participação Especiais (PEs) nas áreas que serão cedidas pela União à Petrobras no processo de capitalização da estatal. O projeto enviado pelo governo ao Congresso prevê apenas o pagamento de royalties sobre a exploração dos até cinco bilhões de barris que servirão de lastro para o aumento de capital.

O cálculo, feito pelo consultor legislativo da Câmara dos Deputados Paulo César Lima, exfuncionário da Petrobras e especialista em energia, aponta ainda que a União, que recebe metade dos valores destinados às PEs, também deixará de receber US$ 30 bilhões. Ao todo, portanto, a Petrobras deixaria de pagar US$ 60 bilhões de PEs.

Paulo Lima alerta que, nesta previsão, a Petrobras poderá sair com uma vantagem bilionária.

Caso o valor da capitalização a ser pago pelo governo chegue a US$ 50 bilhões ¿ como afirmado no anúncio dos projetos ¿ a estatal estará levando, na prática, um bônus de US$ 10 bilhões.

¿ A supressão da participação especial pode fazer com que a cessão deixe de ser onerosa e passe a ser, até mesmo, com bônus para a Petrobras.

O relator do projeto, deputado João Maia (PR-RN), ainda não definiu se vai alterar a proposta do governo, incluindo o pagamento das PEs. Até o início da noite de ontem ele ainda não havia terminado o texto. Segundo o presidente da Comissão Especial que analisa o texto, deputado Arnaldo Jardim (PPSSP), esse é um dos temas que ainda estão em discussão, justamente por envolver recursos que deveriam ser destinados aos estados e municípios.

O governo é contra o pagamento de PEs, sob argumento de que reduziria o valor a ser contabilizado para a estatal no processo de aumento de capital.

A pressão em torno da inclusão desse dispositivo é grande. O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, enviou correspondência à comissão alertando que os produtores devem ter tratamento diferenciado e apresentou emendas ao projeto. Numa delas, sugere que o processo de cessão onerosa deve seguir os princípios dos contratos de concessão (regime atual de exploração), o que garante a PE.

O secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado do Rio, Júlio Bueno, também reagiu.

Segundo ele, o não pagamento da PE seria inconstitucional, pois a cessão onerosa das áreas pelo governo está sendo feita sob o modelo atual de concessão, e não da partilha.

Governo pressiona relator para reduzir `royalties¿ O montante que o Rio ¿ e a União ¿ irá perder pode ser ainda maior, admite o consultor legislativo. Ele explica que fez o cálculo ¿por baixo¿, ao utilizar parâmetros bastante conservadores.

Para chegar à sua estimativa, previu o valor médio do barril produzido no pré-sal em US$ 70 ¿ enquanto as projeções internacionais apontam valor médio de U$ 95 o barril na próxima década. Quanto ao custo da produção no pré-sal, Lima calculou em US$ 18, bem mais do que os US$ 10 anunciados pelo governo e muito acima dos valores estimados por analistas, que não ultrapassam US$ 5.

Como os cinco bilhões de barris de petróleo deverão vir das franjas dos campos de Tupi e Iara, a maioria das participações governamentais ficaria na área de influência do Rio. Mas, se o projeto passar dessa forma, a bancada do Rio ameaça ir ao Supremo Tribunal Federal (STF).

¿ Estamos no primeiro tempo.

Haverá ainda o segundo tempo no Senado e, possivelmente, um terceiro tempo nos tribunais.

A capitalização da Petrobras não pode ser feita em detrimento dos estados e municípios produtores ¿ diz o coordenador da bancada fluminense, deputado Hugo Leal (PSC).

Assustado com a possibilidade de perder numa votação do projeto que trata do regime de partilha na produção do présal, o governo fez ontem um apelo para que o líder do PMDB e relator da proposta, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), desistisse de aumentar para 15% alíquota dos royalties, hoje em 10%. O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, segundo o deputado, argumentou que a alta traria prejuízos ao governo, mas o líder do PMDB disse que não faria a mudança.

Lobão ameaça com novo regime de urgência Ontem, Alves foi chamado ao Palácio do Planalto para uma reunião com Barbosa e a secretáriaexecutiva da Casa Civil, Erenice Guerra: ¿ Recebi apelo, respeitoso, da área econômica para que eu não elevasse os royalties de 10% para 15%, que eu permanecesse no patamar em 12%. Mas disse que não abrirei mão dos 15%.

Em Curitiba, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, criticou o excesso de emendas apresentadas por parlamentares aos projetos do pré-sal. E disse que o governo recorrerá ao regime de urgência caso os deputados não votem as matérias até 10 de novembro. Segundo ele, já foram apresentadas cerca de 850 emendas aos quatro projetos enviados pelo governo. Já o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, lembrou que, caso as emendas sejam aprovadas, o presidente Lula poderá vetá-las

COLABORARAM Cristiane Jungblut e Ana Paula de Carvalho, especial para O GLOBO