Título: Partidos políticos de direita do Uruguai comemoram vitória tripla nas eleições
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 27/10/2009, O Mundo, p. 24

Filho de ex-ditador Juan María Bordaberry recebe votação surpreendente

MONTEVIDÉU. A direita uruguaia teve motivos para comemorar uma vitória tripla na eleição de domingo. Além de conseguir levar o pleito presidencial para o segundo turno, dois outros fatos inesperados ocorreram. Por um lado, os opositores da Lei de Caducidade ¿ que anistiou militares envolvidos em crimes da ditadura (1973-1985) ¿ não conseguiram os 50% dos votos no referendo que garantiriam sua anulação. Assim, a lei continuará protegendo os membros das Forças Armadas e dificultando os processos na Justiça. No mesmo dia, o candidato do Partido Colorado, Pedro Bordaberry, filho do ex-presidente Juan María Bordaberry, que governou o país entre 1973 e 1976 (na segunda parte de seu mandato como chefe de Estado do regime militar), transformou-se no grande fenômeno da eleição.

Bordaberry ficou em terceiro lugar com quase 17% dos votos, aumentando em mais de 70% a votação dos colorados, que na última eleição, em 2004, tinham conseguido pouco mais de 10%. O partido era considerado quase um cadáver político, mas, com o resultado, ressurge das cinzas.

¿ O Partido Colorado está muito bem de saúde ¿ comemorou ele, que optou por uma campanha alheia à troca de acusações entre o esquerdista José ¿Pepe¿ Mujica e o ex-presidente Luis Alberto Lacalle.

Segundo Bordaberry, ¿a partir de agora começa uma nova etapa para o partido¿. O candidato manifestou seu apoio a Lacalle no segundo turno e espera negociar acordos com o Partido Nacional (conhecido como Blanco).

Lei da Caducidade recebera aprovação popular em 1989

Para colorados e blancos, a derrota do ¿sim¿ no referendo sobre a anulação da Lei de Caducidade foi uma ótima notícia. Os partidos defendem a necessidade de terminar com a revisão do passado e de se concentrarem esforços no futuro do país. Já ONGs lamentaram o resultado.

A polêmica lei foi aprovada pelo Congresso em 1986 e ratificada em referendo em 1989, com 56,7% dos votos. Ontem, o ¿sim¿ não conseguiu passar dos 45%.

¿ Com esta lei o Estado renunciou à faculdade de punir os militares. É uma lei incompatível com as bases democráticas da sociedade uruguaia e com os tratados internacionais que nosso país assinou ¿ explicou o deputado da Frente Ampla Felipe Michelini, filho do congressista Zelmar Michelini, sequestrado na Argentina em 1976 e até hoje desaparecido. ¿ A anulação da lei teria ajudado a terminar com o pacto de impunidade que ainda existe em nosso país.

Pelo caso Michelini e outros a Justiça ordenou a detenção de Bordaberry, em 2006. Atualmente, o ex-presidente cumpre regime de prisão domiciliar, à espera de seu julgamento.

Apesar da vigência da lei, os uruguaios começaram a investigar crimes da ditadura durante o governo do presidente Jorge Batlle, antecessor colorado do esquerdista Tabaré Vázquez. Os tribunais locais confirmaram as primeiras detenções e aberturas de processos contra responsáveis por assassinatos de opositores do regime militar. Em todos os casos, os crimes foram cometidos fora do país e por isso podem ser julgados. Além da prisão de Bordaberry, às vésperas da eleição a Justiça condenou o ex-ditador Gregório Álvarez (1981-1983) a 25 anos de prisão, por sua responsabilidade em 37 assassinatos. (Janaína Figueiredo)