Título: Eleições, marco da cidadania
Autor: Corrêa, Maurício
Fonte: Correio Braziliense, 31/05/2009, Opinião, p. 17

O brasiliense passou longo tempo sem direito de eleger senador e deputado federal, prefeito ¿ denominação substituída posteriormente para governador ¿ e deputado de câmara que legislasse para a cidade. Somente a partir da promulgação da Constituição de 1988, com a outorga da autonomia política para Brasília, é que os eleitores da capital conquistaram o direito de votar para governador e para deputados distritais. Antes mesmo da instalação da Assembleia Nacional Constituinte, por força de norma federal autorizadora, votada com alguma antecedência àquele ato, o eleitor do Distrito Federal já pôde votar em deputados e senadores para que estes pudessem participar da elaboração da futura Constituição da República.

Durante as discussões travadas na Constituinte não houve praticamente resistência à ideia de autonomia política da capital. A perspectiva traduzia vontade unânime dos parlamentares eleitos por Brasília. A proposta de emancipação política fluiu com tranquilidade entre constituintes de todo o país, já que à esmagadora maioria pareceu flagrante omissão perpetrada contra a cidade. Notadamente, porque todas as unidades da Federação elegiam seus governadores e deputados às assembleias legislativas, constituindo execrável injustiça não assegurar igual direito ao povo da nova capital. Inaugurada em 1960, ficou Brasília por mais de 28 anos a conviver com singular disparidade, sem que o povo pudesse escolher pelo voto direto o governador, e a padecer da ausência de um órgão legislativo próprio.

O fato já havia levado Tancredo Neves, depois eleito presidente da República, a afirmar em memorável conferência na sede da OAB/DF paradigmática frase, de que ¿conhecia cidadãos cassados, mas não conhecida cidade cassada¿. O discurso energizou ainda mais os debates que o órgão de classe dos advogados realizava, antes mesmo do reconhecimento da representação política da capital no Congresso Nacional. Não houve dúvida, a Assembleia Nacional Constituinte, quase por unanimidade, aprovou a criação da Câmara Distrital, composta de 21 deputados distritais, e o direito de os eleitores de Brasília elegerem o governador da cidade. Estava assim consumada a autonomia política da capital, igualando-se em direitos políticos aos outros estados da Federação.

Estamos em 2009, ano do 49º aniversário da cidade. A autonomia política do DF se consolidou com a promulgação da Constituição em 5 de outubro de 1988. Os partidos políticos já começam a se agitar para as eleições de outubro do ano que vem. O eleitorado brasiliense vai novamente poder escolher seus representantes no Congresso ¿ senadores e deputados federais ¿, os 21 deputados da Câmara Legislativa e o governador que vai dirigir a cidade por mais quatro anos. Será, como sempre, festa cívica que dá vitalidade à cidadania. O voto encerra em si responsabilidade para com a nação. É dele que depende o sucesso da escolha do eleitor. Se recair em candidatos descompromissados com a ética, é quase certo que os eleitos farão parte de igual grupo de parlamentares que traíram a confiança do eleitor e estão a usar das funções delegadas pelo povo para a realização de negócios ilícitos. Dissimulam o dever de mandatários da nação na prática de atos que configuram antítese do exercício parlamentar.

O melhor juiz para condenar infratores eleitorais, o mais eficiente tribunal para julgar os que violam a lei e a mais eficiente polícia para combater crimes por certo será o próprio eleitor ao dar seu voto. O que as autoridades poderão futuramente fazer para punir os que roubam do povo, o eleitor antecipadamente poderá evitar se souber adequadamente qualificar o voto. Não existe polícia mais eficiente ou juiz mais zeloso no combate e punição dos maus representantes do povo do que o eleitor na escolha do voto. Nesse caso, haverá economia para o Estado, que não terá que suportar despesas com investigações e julgamentos dos que conspurcam o mandato popular.

O frenesi do momento fica por conta das acomodações de quem é quem nos partidos. Grande problema para muitos que desejam mudar de partido é a fidelidade partidária. Quem se elegeu por determinada agremiação e nela se acha desconfortado, não terá condições de migrar para outra, a não ser em restritas hipóteses. As eleições de Brasília, como as do resto do país, serão medidas pela definição das candidaturas à Presidência da República. Pouco adiantará fechar as portas de um partido contra o ingresso de terceiros não convenientes, se amanhã esse partido tiver candidatura própria à Presidência ou se coligar com outro que já a tenha.

Se assim se verificar, de nada ou de quase nada valerá fechar as portas de entrada dos partidos. A basear-se na amostragem política de hoje, duas serão as principais candidaturas mais iminentes ao Palácio do Planalto. Outras poderão existir, mas serão simplesmente periféricas. As candidaturas a governador nos estados gravitarão em torno dessas duas. Em Brasília pode ganhar quem tiver mais competência para compor e tiver mais bases eleitorais conquistadas.

De tudo resulta que o eleitor precisa saber votar. Estará com isso recompensada a luta pela conquista da autonomia política da cidade.