Título: Brasil não crê em respaldo de Haia a Honduras
Autor: Scofield Jr., Gilberto; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 30/10/2009, O Mundo, p. 33

Sob pressão dos EUA, o diálogo é retomado. Equipe de Micheletti diz que aceita levar decisão sobre Zelaya ao Congresso

BRASÍLIA e WASHINGTON. O governo brasileiro acredita que a ação legal aberta contra o Brasil na Corte Internacional de Justiça de Haia, na Holanda, pelo governo interino de Honduras não terá amparo junto ao tribunal. Isto porque, segundo o Itamaraty, não há legitimidade na administração de Roberto Micheletti.

Um fato novo e avaliado como positivo pelo Itamaraty, ocorrido ontem, foi o comunicado da chanceler do governo deposto, Patricia Rodas, encaminhado a Haia, à secretaria-geral da ONU e ao Conselho de Segurança das Nações Unidas em defesa do Brasil. No texto, ela classificou de ¿absurdo jurídico¿ a ação contra o governo brasileiro.

Ela lembrou que a Corte de Haia é um órgão das Nações Unidas que, por sua vez, teria condenado o golpe de Estado.

EUA aceitariam acordo sem Zelaya no poder O governo Micheletti alega ingerência do Brasil em assuntos internos. A queixa, apresentada na quarta-feira, foi detalhada ontem.

Nela, o governo interino acusa Zelaya de usar a Embaixada do Brasil como plataforma política, ameaçando a paz e ordem pública. E se vê no direito de pedir reparações por qualquer dano que resulte das ações do Brasil, de sua embaixada e de pessoas nela refugiadas.

Em Tegucigalpa, as equipes de Zelaya e Micheletti retomaram as negociações, um dia após a chegada da missão americana.

No que parece ser um primeiro reflexo da pressão dos EUA, um negociador de Micheletti disse que a comissão do governo interino aceitou o pedido de Zelaya para que o Congresso decida sobre a sua restituição. A decisão, se confirmada, abre caminho para um acordo.

¿ Só falta assiná-lo porque nós aceitamos que seja o Congresso (quem decida), ou seja, a proposta de Zelaya ¿ disse Arturo Corrales.

Os EUA, por sua vez, podem concordar com uma solução para a crise que não passe pela recondução de Zelaya ao poder.

Thomas Shannon, secretário-assistente de Estado para o Continente Americano, afirmou que os EUA continuam defendendo a volta de Zelaya ao poder. Mas deixou claro que, caso o acordo selado entre Zelaya e Micheletti seja do interesse das partes e dê legitimidade à eleição presidencial de novembro, ainda que não inclua a restituição do deposto, os americanos o apoiarão.

¿ Não viemos aqui para impor soluções, mas para facilitar um entendimento. A volta de Zelaya ao poder é o ponto principal que, até agora, vem impedindo um acordo. Se os dois lados concordarem em uma solução negociada alternativa que traga o país de volta à normalidade institucional e democrática, não vamos nos opor ¿ disse Shannon, em vídeoconferência de Tegucigalpa, aonde chegou na quarta-feira acompanhado do assessor da Casa Branca para a América Latina, Dan Restrepo.

O embaixador Ruy Casaes, representante do Brasil na OEA, diz que se for fechado um acordo em que o presidente deposto não seja reconduzido ao cargo, mas em que seus interesses sejam contemplados, dificilmente o Brasil ou qualquer outro país poderá se opor. Mas ele é cético sobre essa possibilidade.

Shannon é mais otimista e espera retornar hoje aos EUA com uma solução acertada. Ele afirmou que a mensagem dos EUA a Micheletti e Zelaya é: um acordo entre as partes facilita a aceitação internacional dos resultados da eleição. E advertiu que o tempo está se esgotando, pois só falta um mês para o pleito: ¿ A solução está sobre a mesa.

Não é questão de proposta. É questão de vontade política