Título: Pagador da conta
Autor:
Fonte: O Globo, 03/11/2009, Opinião, p. 6

Tema em discussão : municípios

Descentralização é palavrachave em administração.

No caso da pública, defende-se, com razão, que muitos serviços sejam prestados pelos municípios, entes federativos mais próximos das ruas, da população.

No Brasil, o princípio foi seguido à risca. Chegada a redemocratização, sacramentada pela Constituição de 1988, relaxaramse as normas para a criação de municípios.

Houve uma farra, com a instalação do que foi chamado de ¿indústria¿ de prefeituras. No ano de promulgação da Carta, o país reunia 4.180 municípios. Mas, posta em funcionamento a ¿indústria¿, surgiram mais mil, até que, constatado o furor municipalista, no governo FH, baixaram-se normas para conter a festa.

Hoje, há 5.564 prefeituras. Até não seria demais considerando o tamanho do Brasil. Sucede que a maioria dos novos municípios passou a existir devido a interesses políticos paroquiais, sem qualquer preocupação técnica.

Como resultado, a esmagadora maioria das prefeituras não vive de recursos próprios, depende de repasses federais e estaduais.

Mesmo que os repasses tenham sustentação legal, prefeito sem dinheiro termina seduzido, com facilidade, pelo clientelismo da pequena política brasileira.

Se não tivesse ocorrido a proliferação excessiva de municípios, uma parte do custo da manutenção de assembleias de vereadores, suas respectivas mordomias e da folha do funcionalismo municipal não existiria.

Teria sido menor a fatia da renda dos contribuintes que os municípios abocanharam quando a União, com a descentralização tributária, não cortou custos e inventou ¿contribuições¿ (CPMF, Cide, PIS-Cofins, por exemplo) para arrecadar sem ter de dividir a coleta de impostos com estados e municípios.

Como estes trataram, também, de ampliar as receitas, a carga tributária brasileira, em pouco mais de uma década, deu um salto estratosférico de cerca de dez pontos percentuais do PIB, chegando aos 35% do Produto, dado de antes da crise, nível recorde no universo de economias emergentes.

Não é arriscado concluir que, no balanço de custos e benefícios, a descentralização municipalista, da maneira como ocorreu, deu-se em prejuízo do contribuinte.