Título: Senado desobedece ao STF
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 04/11/2009, O País, p. 3

Apesar de ter sido cassado, Expedito Júnior é mantido como senador até ser ouvido na CCJ

BRASÍLIA

A Mesa do Senado decidiu dar sobrevida de pelo menos mais uma semana ao senador Expedito Júnior (PSDB-RO), mesmo depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter determinado, semana passada, a cassação de seu mandato e a posse do segundo colocado nas eleições de 2006, o empresário Acir Gurgacz (PDT-RO). Embora a posse do novo senador estivesse marcada para as 17h de ontem, a Mesa aceitou recurso dos advogados do senador tucano, solicitando que lhe seja garantido amplo direito de defesa perante a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O clima esquentou no Senado.

O PDT chegou a ameaçar com uma ação pedindo a prisão dos integrantes da Mesa por crime de desobediência.

Expedito foi cassado em 2008 pelo Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, por abuso de poder econômico e compra de votos na campanha de 2006. Em junho passado, o Tribunal Superior Eleitoral confirmou a decisão.

Na última semana, o STF, por sete votos a um, ordenou a saída imediata do tucano e a posse do segundo colocado nas eleições. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), ironizou a ameaça de prisão: ¿ Peço que não me levem cigarros (na prisão), porque não fumo.

Mas que me confortem.

Em nota, porém, e depois em pronunciamento no plenário, ao ser questionado por Cristovam Buarque (PDT-DF), Sarney alegou ter sido voto vencido na reunião da qual participaram também Heráclito Fortes (DEMPI), Mão Santa (PSC-PI), Adelmir Santana (DEM-DF), César Borges (PRBA), Cícero Lucena (PSDB-PB) e Serys Slhessarenko (PT-MG), a única que se absteve. Nos bastidores, Sarney é apontado como um dos mentores da estratégia de Expedito.

¿ Prezo pela harmonia entre os Poderes. A decisão do Supremo Tribunal Federal era impositiva e devia, portanto, ser cumprida. Mas como ela foi encaminhada expressamente à Mesa, eu não poderia decidir sozinho ¿ defendeu-se Sarney.

Suplente da Mesa, César Borges (PR-BA) contestou essa versão: ¿ Sarney não ficou contra. Ele simplesmente não votou durante a decisão.

Basta ver a ata da Mesa para verificar se houve algum voto contra.

Antes de receber as explicações de Sarney, Cristovam o responsabilizara diretamente pela decisão: ¿ O presidente Sarney trata o Senado como se fosse a casa dele. É um acinte.

¿Vou defender meu mandato até o fim¿

O presidente da CCJ, Demóstenes Torres (DEM-GO), antecipou que vai avocar para si a relatoria do recurso e que se declarará favoravelmente ao cumprimento da decisão do STF.

Mas só na quarta-feira que vem.

¿ O Supremo decidiu, acabou. Não há recurso administrativo contra decisão judicial ¿ disse Demóstenes, que comentou a ameaça de prisão dos integrantes da Mesa: ¿ A Mesa não decidiu nada, mandou ouvir a CCJ.

Expedito rebateu os argumentos de Cristovam. Lembrou que a postura do colega foi outra em relação à decisão da Justiça Eleitoral que cassou o mandato de João Capiberibe (PSB-AP), quando Cristovam defendeu que o plenário e a CCJ fossem ouvidos: ¿ Não se pode usar dois pesos e duas medidas. Só resolvi pedir que me fosse dado amplo direito de resposta.

Vou defender meu mandato até o fim. Recebi 60 mil votos a mais do que o segundo colocado.

Acir Gurgacz, que convidara parentes e amigos para a posse, disse estar surpreso com a decisão da Mesa e chegou a defender a ética na política.

Só não mencionou que, assim como Expedito, responde a processos no TSE e no TRE de Rondônia por abuso de poder político e econômico e uso indevido dos meios de comunicação de propriedade de sua família.

¿ Todos esses processos já foram resolvidos ¿ disse Gurgacz.

Vem se tornando preocupante esta arbitrária resistência das Mesas da Câmara e do Senado. Essa insubordinação é lamentável. É algo inconcebível no estado democrático de direito.

Estamos vendo, neste caso, reiterada recusa por parte da Mesa do Senado a cumprir uma ordem judicial.

Isso é uma anomalia, se situa na patologia do exercício e da prática do poder

Celso de Mello, ministro do STF, na semana passada.