Título: Agora só falta o Senado
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 09/11/2009, O Mundo, p. 19

Em votação apertada, Câmara aprova reforma da saúde de Obama

NANCY PELOSI, presidente da Câmara dos Representantes, comemora a aprovação da reforma no sistema de saúde dos EUA, uma antiga bandeira de seu partido democrata e promessa de campanha de Barack Obama

OBAMA DEIXA a Câmara: presidente pediu aos democratas que "respondessem ao chamado da História¿

O PAINEL MOSTRA o resultado: 220 a favor e 215 contra. Só um republicano votou a favor da reforma

Numa votação apertada ¿ 220 votos a favor e 215 contra ¿ que se estendeu pela noite de sábado e foi acompanhada de perto pelo presidente Barack Obama, os democratas conseguiram aprovar na Câmara dos Representantes a lei de reforma do sistema de saúde nos EUA, uma bandeira do Partido Democrata há décadas. Ao custo de US$1,1 trilhão a serem gastos nos próximos dez anos, a reforma ¿ batizada ¿Lei da Saúde ao alcance da América¿ ¿ busca levar atendimento de saúde a 36 milhões de americanos que hoje não têm garantido o serviço. Além disso, pretende acabar com o que muitos encaram como abusos das empresas de seguros de saúde privados, como a falta de cobertura a doenças preexistentes ou o estabelecimento de prêmios de seguro elevados para coberturas pequenas.

Trata-se de uma importante vitória para o presidente Obama, que fez da reforma do sistema de saúde a sua principal briga política doméstica. O presidente chegou a ir à Câmara ao meio-dia de sábado para pedir aos democratas que ¿respondessem ao chamado da História¿ e aprovassem o projeto. Desde o início dos debates sobre a reforma, o Partido Republicano vinha lutando com todas as armas políticas para boicotá-la, incluindo campanhas na TV e no rádio, além de ásperas discussões durante toda a tramitação do projeto até a tarde de sábado, quando a votação se iniciou finalmente no plenário da Câmara. Apenas um deputado republicano ¿ Anh Cao, da Louisiana ¿ votou a favor da reforma. A lei segue agora para o Senado, onde já tramita um projeto próprio que pode ser incorporado ao aprovado na Câmara.

¿ O projeto que a Câmara produziu nesta histórica votação vai prover estabilidade e segurança para os americanos que têm seguros; qualidade e opções baratas para aqueles que não têm; e menos gastos para as famílias e os negócios ¿ comemorou Obama após a votação. ¿ Agora cabe ao Senado receber o bastão e trazer este esforço para a linha de chegada em benefício do povo. Eu estou absolutamente confiante de que ele o fará.

Aborto e déficit no centro da disputa

Curiosamente, os democratas tiveram de brigar também entre si, especialmente com a bancada mais conservadora do partido, que temia que o financiamento indiscriminado de abortos previsto na versão original fosse jogar contra as candidaturas do partido no próximo ano eleitoral. A presidente da Câmara e líder dos democratas na Casa, Nancy Pelosi, forçou os políticos mais liberais a recuarem e, com o uso de dinheiro público limitado a abortos em casos já previstos em lei (estupros, malformação do feto, risco para a saúde da mãe), a reforma ganhou finalmente aprovação da maioria do partido. Ainda assim, 39 democratas votaram contra a lei ¿ entre os quais 24 deputados da coalizão conservadora Blue Dogs, um grupo de parlamentares que se preocupa com os custos da reforma e seu impacto no déficit público (a principal queixa dos republicanos também).

Esta batalha deve se repetir no Senado, onde a preocupação com os custos da reforma é ainda maior. De fato, a nova lei aprovada na Câmara torna o governo um importante ator no palco do sistema de saúde, com atribuições gerais de regulamentação e fiscalização do sistema mais amplas e até na oferta de opções públicas de seguro, um dos pontos mais criticados pelos republicanos, para os quais Estado forte é Estado mínimo. A nova lei exige de todos os americanos um seguro de saúde; força as seguradoras privadas a darem coberturas a doenças preexistentes; determina que grandes empresas paguem até 70% dos seguros de seus funcionários; força para baixo os preços com a criação de uma bolsa de seguros na qual os consumidores poderão pesquisar e comparar custos e planos; e cria uma seguradora pública (ou cooperativada, dependendo ainda de regulamentação especial).