Título: BC não segura dólar
Autor: Allan, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 23/05/2009, Economia, p. 18

Sinal de que Brasil sairá rapidamente da crise amplia fluxo de capitais na economia e dificulta objetivo do Banco Central de conter a desvalorização da moeda. Divisa está próxima de romper barreira dos R$ 2

O Banco Central (BC) já comprou cerca de US$ 2 bilhões no mercado à vista, deve continuar com as operações diárias, mas não vai deter a queda da moeda dos Estados Unidos. Vários especialistas asseguram que a cotação deve romper a barreira de R$ 2 nas próximas semanas, podendo recuar mais na queda de braço entre os investidores e a autoridade monetária. A divisa está se enfraquecendo por causa da entrada maciça de capital no Brasil, principalmente para a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que voltou a ficar atraente como destino de recursos estrangeiros de curto prazo. Ontem, a queda do dólar foi de 0,39%, com o encerramento do dia de negócios em R$ 2,027.

No ano, a moeda já perdeu 13,4% do seu valor diante do real. Desde que a cotação chegou a R$ 2,50 em 5 de dezembro de 2008, alcançando o teto nesse período de crise econômica internacional, a desvalorização já atinge 18,9%. ¿É quase inevitável que fique abaixo de R$ 2. Quando isso acontecer, o mercado vai continuar testando o BC para saber até onde ele pode chegar. A partir daí, a tendência será romper a barreira de R$ 1,90 e, depois, de R$ 1,80¿, afirma o economista-chefe da agência de classificação de riscos Austin Rating, Alex Agostini. No melhor momento da confiança na economia brasileira, o dólar atingiu o piso de R$ 1,55, em 1° de agosto do ano passado.

Depois de 15 de setembro, quando o governo George W. Bush deixou o banco de investimentos Lehman Brothers quebrar, o dinheiro sumiu. À medida que bancos e empresas anunciavam prejuízos, suas sedes retiraram as aplicações em países emergentes para cobrir os rombos em casa. Os investidores também passaram a achar os países em desenvolvimento arriscados para os poucos recursos disponíveis. A combinação desses dois fatores provocou uma saída expressiva de dólares do Brasil, principalmente da Bovespa, que se desvalorizou drasticamente. Isso tudo fez a cotação do dólar subir.

Fluxo de capitais O que está ocorrendo agora é justamente o contrário. ¿Nas últimas semanas, houve um movimento claro de menor aversão ao risco com o anúncio de alguns bons indicadores. Como o Brasil ficou estável durante a crise e tem uma expectativa boa de retomada do crescimento, vem recebendo um fluxo bastante grande de capitais. Os investidores que foram embora estão voltando¿, afirma o economista Filipe Albert, da Tendências Consultoria. Até 15 de maio, a entrada de dinheiro no país superou a saída em US$ 2,1 bilhões. Em abril, esse número havia sido de US$ 1,4 bilhão. Em março, foi negativo em US$ 800 milhões. Até 19 de maio, a entrada líquida na Bovespa foi de US$ 2 bilhões.

Para Albert, se o fluxo continuar positivo, o que deve ocorrer, o BC não vai conseguir segurar a queda do dólar. ¿Em algum momento, ele vai cair abaixo de R$ 2, mas deve fechar o ano um pouco acima disso¿, aposta. O BC voltou a comprar a moeda no mercado à vista em 8 de maio. Desde então, operou todos os dias, sem informar os montantes adquiridos. As consultorias estimam que o volume total não é inferior a US$ 2 bilhões. Segundo Albert, o BC vai continuar atuando para diminuir as oscilações do câmbio e voltar a acumular reservas internacionais, depois de torrar US$ 15 bilhões para tranquilizar o mercado nos piores meses da crise. Hoje, as reservas estão em US$ 204 bilhões.

Na opinião de Agostini, as compras do BC serão calculadas segundo as necessidades de financiamento do déficit que o Brasil tem em suas transações com o resto do mundo. Além do maior apelo dos ativos brasileiros, inclusive aplicações em renda fixa, o dólar está se desvalorizando em relação a várias outras moedas. Isso ocorre principalmente por causa dos déficits fiscal e externo do país. As contas só tendem a se deteriorar com os planos do presidente Barack Obama de gastar trilhões para salvar os bancos e estimular a economia. Nesta semana, a agência de classificação de risco Standard&Poor¿s ameaçou reduzir o rating dos EUA, que perderia a nota AAA.

Commodities Ontem, a Bovespa se beneficiou da alta do preço das commodities, rompeu três dias de baixa e fechou com valorização de 0,96%. O feriado nos EUA na segunda tirou o fôlego dos negócios. Numa mostra da volta do capital estrangeiro, a bolsa subiu 6,93% no mês e 34,67% no ano. A expectativa é quando ela vai superar os 52.392 pontos do último pregão antes da quebra do Lehman Brothers. As bolsas europeias tiveram um dia morno: Frankfurt (0,37%) e Londres (0,46%). Em Nova York, os índices ficaram no vermelho: Dow Jones (-0,18%), S&P 500 (-0,15%) e Nasdaq (-0,19%).