Título: Acordo sobre o clima é adiado
Autor:
Fonte: O Globo, 16/11/2009, O Mundo, p. 19

A 22 dias de Copenhague, líderes decidem deixar metas de corte de emissões para depois

Os Estados Unidos, a China - as duas nações mais poluidoras do mundo - e outros países reunidos em Cingapura para um fórum de líderes da região Ásia-Pacífico decidiram ontem abandonar a tentativa de se chegar a um acordo concreto sobre metas de redução de gases causadores do efeito estufa na Conferência do clima em Copenhague, em dezembro. A decisão - tomada junto com o primeiro-ministro da Dinamarca e anfitrião do encontro de Copenhague, Lars Lokke Rasmussen, numa reunião sobre clima convocada de última hora - basicamente joga pelo ralo as esperanças de que haja uma decisão conjunta sobre metas na conferência do mês que vem.

- Houve uma avaliação de que seria irreal esperar um acordo fechado, amarrado legalmente em nível internacional para ser negociado entre hoje e o início de Copenhague, em 22 dias - disse Michael Froman, negociador da comitiva americana, após a reunião que contou com líderes de EUA, China, Japão, Rússia, México, Austrália e Indonésia, entre outros.

A decisão seria uma forma de salvar Copenhague diante da total falta de acordo entre países ricos e em desenvolvimento às vésperas do evento. A avaliação é que Copenhague se transformaria num grande encontro político, que funcionaria como importante preparador para uma futura reunião de resultados mais concretos, possivelmente em 2010 ou até depois. Na prática, a decisão sobre metas estaria sendo desmembrada em duas etapas, a segunda ainda sem data marcada, possivelmente no México ou na Alemanha.

- Considerando-se o fator tempo e a situação de alguns países, precisamos, nas próximas semanas, focar no possível e não nos deixar distrair pelo que não é possível - disse Rasmussen, que voou da Dinamarca para Cingapura para o encontro, paralelo ao Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec).

Senado americano ganha tempo

O líder dinamarquês, no entanto, ressaltou que o encontro de 7 a 18 de dezembro será fundamental para avançar em questões cruciais como o estabelecimento de metas e a criação de um fundo para ajudar países em desenvolvimento a combater o aquecimento global. Na reunião também se estabeleceria um prazo para a redação de um acordo final.

Sobre a situação singular de alguns países, Rasmussen se referia especialmente aos Estados Unidos, onde o Senado não conseguiu chegar a um acordo a tempo sobre limite de emissões. No entanto, com esse adiamento, os EUA ganham mais tempo para que senadores aprovem uma legislação sobre emissão de gases, permitindo que o governo Obama apresente suas metas para 2020 e propostas de financiamento.

Copenhague era visto como a última chance para que países chegassem a um consenso sobre um sucessor do Protocolo de Kioto, que expira em 2012. Mas as negociações não avançaram como se previa, com países em desenvolvimento cobrando maiores esforços de nações industrializadas e acusando-as de não apresentarem metas significativas para corte da emissão de gases até 2020. Na semana passada, o Brasil apresentou isoladamente uma meta voluntária para reduzir as emissões entre 36,1% e 38,9% até 2020.

Protesto de ambientalistas

O secretário de Energia e Clima do Reino Unido, Ed Miliband, disse que a questão era difícil, mas que estava otimista.

- Isso é sobre salvar o mundo. Se conseguirmos um conjunto claro de compromissos de líderes mundiais em Copenhague, não apenas Europa, não apenas EUA, mas Índia, China e outros países, então teremos avançado enormemente - afirmou.

A organização ambiental WWF protestou contra o adiamento.

"Houve conversa demais sobre adiamento na Apec, e sobre o que não vai ser alcançado em Copenhague. Isso não parece uma estratégia inteligente para se ganhar a batalha contra o aquecimento global", disse a porta-voz Diane McFadzie numa declaração.

No sábado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu colega de cargo francês, Nicolas Sarkozy, anunciaram que estavam levando uma proposta conjunta sobre redução da emissão de gases para Copenhague, defendendo que os países industrializados se comprometessem a reduzir em pelo menos 80% suas emissões até 2050, em relação aos níveis da década de 1990. Também consta do documento de três páginas uma proposta de financiamento para que países mais pobres reduzissem as emissões. Na divulgação, Lula criticou o unilateralismo de China e EUA sobre o tema, no que apelidou de G-2.

A estocada aconteceu logo depois que líderes reunidos no fórum da Apec em Cingapura haviam modificado o rascunho da proposta conjunta sobre a redução de emissões, eliminando do texto a referência ao corte de ao menos 50% até 2050. Juntos, os 21 países da Apec, entre eles Austrália, Canadá, EUA, Chile, Rússia, Japão, Indonésia, respondem por 60% das emissões mundiais. O Brasil é o quinto maior emissor, principalmente pela queimadas de florestas.