Título: O papel do Brasil
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Fonte: O Globo, 13/11/2009, Opinião, p. 6

Os decepcionantes resultados das reuniões preparatórias para a Conferência do Clima (de 7 a 18 de dezembro, em Copenhague) deixam no ar uma enorme preocupação quanto à capacidade dos líderes mundiais de responderem ao desafio inédito para o futuro da Humanidade que são o aquecimento global e as mudanças climáticas.

Preocupação que leva à angústia diante da torrente de informações sobre o que já está acontecendo com o planeta: desaparecimento de florestas, a constatação de que a expressão ¿gelo eterno¿ não tem mais razão de ser, aumento da temperatura global e inexplicáveis fenômenos climáticos, com risco para regiões e cidades costeiras e para paísesilha ¿ estes, os mais ameaçados, e que acabam de fazer pungente apelo por um acordo consistente em Copenhague.

Preocupação e angústia só fazem crescer na medida em que encolhem os dias ¿ agora são 24 ¿ que precedem o início da conferência.

A impressão é que há, da parte dos diferentes grupos de países (ricos, Brics, em desenvolvimento, pobres) politicagem demais e vontade política de menos na implementação dos planos e metas a serem acordados em dezembro.

Um dos complicadores é o custo, estimado pela Agência Internacional de Energia em US$ 10,5 trilhões até 2030 apenas no que toca aos investimentos necessários na área de energia. E os países ricos terão de financiar boa parte das inversões ¿verdes¿ dos demais.

Os EUA, que disputam com a China o triste papel de maior poluidor mundial, apesar de uma nova atitude na área ambiental com Barack Obama, podem chegar a Copenhague sem metas concretas, pois o Senado até agora não aprovou a lei de mudanças climáticas.

É bom lembrar que a conta não fecha sem a adesão dos EUA, que nunca assinaram Kioto.

A China, não obstante grandes esforços para mitigar os danos de uma economia fortemente baseada na queima de combustível fóssil, não quer aceitar metas específicas de redução.

O governo indiano deve chegar a Copenhague com um plano semelhante ao chinês.

O que se deve lembrar, sempre e cada vez mais, é que não há antagonismo entre proteger o meio ambiente e promover o crescimento econômico. Abrem-se oportunidades de investimento e empregos no desenvolvimento de energias renováveis, na pesquisa tecnológica, na fabricação de novos equipamentos, na melhoria de processos produtivos, nos transportes não (ou menos) poluentes, na agricultura sustentável, em obras de infraestrutura.

O Brasil ainda pode dar uma contribuição importante em Copenhague se propuser uma forte redução de emissões, criando um desafio aos demais.

Não faz mais sentido autoridades como a ministra Dilma Rousseff, que vai chefiar a delegação brasileira, afirmarem que o Brasil está dispensado da fixação de metas de redução das emissões porque isto é obrigação dos países do Anexo I (os maiores emissores), cabendolhe apenas a apresentação de um ¿objetivo voluntário e consensual¿ de redução ¿ que, segundo os últimos números do governo, seria de 40% até 2020.

Anexo I é linguagem antiga, do Tratado de Kioto, que expira em 2012. É preciso, isto sim, que o Brasil apresente uma meta realista, que possa cumprir, mas ousada o suficiente para romper o círculo vicioso das pressões e contrapressões que mantêm a comunidade internacional patinando.