Título: Brasil e França levarão proposta única para Conferência do Clima
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 15/11/2009, O País, p. 4

Lula critica EUA e China: "A gente percebe a tentativa de criação de um G2"

PARIS. Brasil e França concluíram uma proposta comum sobre redução das emissões de gases para levar à Conferência do Clima das Nações Unidas, em Copenhague, em dezembro. O anúncio foi feito ontem em Paris pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo seu colega francês, Nicolas Sarkozy. Em duro pronunciamento, os dois cobraram de Estados Unidos e China ¿ aliada tradicional do Brasil no bloco dos países emergentes ¿ proposta concreta para redução de emissões. É um sinal de que o bloco dos emergentes pode rachar em Copenhague.

Lula não mediu palavras: disse que não vai aceitar que China e Estados Unidos ¿ maior poluidor e o mais hesitante a assumir compromissos ¿ cheguem a um acordo entre eles e criem uma espécie de G-2 (grupo de dois) para decidir tudo: ¿ Não temos o direito de permitir que o presidente (Barack) Obama (EUA) e o presidente Hu Jintao (China) façam um acordo com base apenas nas realidades políticas e econômicas de seus países.

Lula cobrou mais ousadia dos chineses. E não parou: ¿ No fundo, o que a gente está percebendo é a tentativa de criação de um G2 (grupo de dois) com interesses específicos para resolver o problema político e climático dos dois países, sem se importar com a responsabilidade que temos que ter com a Humanidade.

Lula diz que proposta é ¿Bíblia climática¿ O texto de três páginas que Brasil e França levarão a Copenhague, divulgado ontem ¿ ¿nossa Bíblia climática¿, disse Lula, após a reunião com Sarkozy no Palácio do Eliseu¿ prevê que os países industrializados reduzam emissões em pelo menos 80% até 2050, em relação à década de 1990. Aos emergentes, os líderes francês e brasileiro pedem formas de crescimento com baixa emissão de carbono, com ajuda financeira dos países ricos, e tomem medidas para reduzir o ritmo no qual crescem suas emissões.

Também levarão a proposta de se empenhar para convencer outros países, como China e Estados Unidos, a não deixar a conferência fracassar.

¿ Tornamos público hoje um texto brasileiro e francês, porque queremos que Copenhague seja um sucesso, não aceitaremos um acordo qualquer ¿ declarou Sarkozy.

E disse que espera mais ação dos chineses e americanos: ¿ Um acordo (em Copenhague) só será suficiente se for ambicioso e engajar. O Brasil é o primeiro emergente que assumiu compromisso desta natureza.

Obama e Hu Jintao vão se encontrar em Pequim na terçafeira. Lula disse que ligará para Obama amanhã.

¿ É preciso que os Estados Unidos, como a maior economia do mundo, sejam o mais ousado do mundo para melhor, e não para trás.

Sarkozy endossou: ¿ Com o presidente Lula, vamos percorrer o planeta para convencer (os outros), porque o mundo é multipolar.

A atitude de grandes poluidores, como os EUA, e de emergentes como China e Brasil, vai determinar o sucesso ou o fracasso da conferência. Lula disse que o Brasil fez a sua parte ao anunciar o compromisso de reduzir emissões entre 36,1% e 38,9% até 2020. O Brasil é o quinto maior emissor mundial.

França e Brasil defenderam uma ideia que os franceses adoram: a criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente, que monitoraria os compromissos de redução de emissões. Lula deixou a ministra Dilma Rousseff, sua pré-candidata para 2010, explicar à imprensa francesa a proposta brasileira. Respondendo à pergunta de um jornalista francês, Lula recomendou ao ex-militante da esquerda italiana Cesare Battisti não fazer greve de fome.

¿ Já fiz¿e é ruim ! ¿ afirmou, insistindo que esperará a decisão do STF sobre o caso.

Em Cingapura, líderes da Cúpula do Fórum de Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico modificaram um rascunho da proposta de reduzir emissões, eliminando a referência ao corte de ao menos 50% até 2050. Comprometeram-se a baixar ¿substancialmente¿ a contaminação. O grupo desses países, como Austrália, Canadá, EUA, Chile, Rússia e Japão, responde por 60% das emissões.