Título: Ofensiva do Rio no pré-sal
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 21/11/2009, Economia, p. 23

Cabral vai a Brasília tentar impedir mudança de distribuição de royalties para áreas já licitadas

O Rio de Janeiro vai deflagrar na próxima semana uma ofensiva para impedir que cresça a onda em favor da alteração da atual legislação de distribuição de royalties de petróleo, ampliando para as áreas já licitadas do pré-sal e até do pós-sal a nova divisão da arrecadação. Se efetivada, a mudança representará um golpe nas receitas do estado, maior produtor de petróleo do país, que arrecadou R$ 6,7 bilhões em 2008 em participações governamentais. O governador Sérgio Cabral desembarca terça-feira em Brasília para se reunir com o relator do projeto que cria o modelo de partilha de produção, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e os governadores do Piauí, Wellington Dias, e do Ceará, Cid Gomes, que representarão os estados do Nordeste.

Segundo Alves, o objetivo é alcançar entendimento sobre as reivindicações apresentadas recentemente pela bancada do Nordeste.

A principal proposta nordestina é estender para as áreas já licitadas do pré-sal os novos índices de distribuição. Pelo texto do relator, caberão aos estados e municípios não produtores 44% da receita de royalties, um volume muito superior aos atuais 7,5%.

A divisão do que já está licitado seria feita sob a atual alíquota de 10%, para não mexer nos contratos. Para os novos campos do présal, a alíquota foi ampliada para 15%.

A segunda proposta ¿ que tem como forte defensor fora da bancada nordestina o deputado gaúcho Ibsen Pinheiro (PMDB) ¿ é aplicar os novos critérios para toda a atividade petrolífera, o que inclui as áreas no pós-sal e em terra. Essa emenda deve ser apresentada em plenário esta semana. Para rechaçar as duas emendas, o governo estadual deve contar com o suporte da bancada fluminense no Congresso, que terá uma reunião com Cabral no mesmo dia.

Para Alves, a discussão deixou de ser técnica, ainda não passou pelo crivo jurídico, mas se tornou eminentemente política. Ele lembra que a aprovação, com relativa facilidade, do seu parecer na Comissão Especial deve-se ao tamanho reduzido desse fórum. No plenário, com 513 parlamentares, ¿o jogo é diferente¿. Por isso, não arrisca indicar no que pode resultar a conversa entre os governadores, sugerida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quinta-feira, em viagem que fizeram juntos.

¿ Expus ao presidente a situação, e ele está preocupado. Temos de chegar a algum entendimento, mas não tenho a menor ideia do que vai ocorrer ¿ admite Alves, que é contrário a alterações.

Rio poderá revidar contra Nordeste

O relator, que também é líder do PMDB na Câmara, admite que a argumentação do Rio ¿é muito forte¿, levando-se em conta o princípio do direito adquirido e a expectativa dada de receita para os próximos anos. Para o Rio, as duas propostas significam mudar regras com o jogo em andamento.

Mas Alves pondera também que os governadores do Nordeste têm argumentos razoáveis, entre eles que a receita com os novos campos do pré-sal só vai jorrar em dez anos e que não há razão para o resto do país esperar tanto.

¿ Há argumentos por todos os lados, e precisamos achar uma solução ¿ reconheceu.

O temor do relator ¿ e do governo ¿ é que o acirramento da disputa na Câmara leve a um apagão na votação dos projetos do marco regulatório do pré-sal. Só um texto foi votado desde o dia 10, prazo estabelecido pelo presidente da casa, Michel Temer (PMDB-SP), para iniciar a tramitação no plenário. Trata-se do que cria a Petro-Sal, estatal que irá coordenar e fiscalizar a exploração do óleo. O próximo da fila é o da partilha, do qual dependem os outros dois.

O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) adverte que o crescente clima de radicalização no Parlamento terá resposta. Ele lembra que o Rio de Janeiro apoiou vários incentivos fiscais dados por estados nordestinos e que isso pode ser revisto, gerando uma espiral de revides.

¿ Querer romper com o princípio da federação é algo complicado. Estão radicalizando e agora vamos radicalizar de verdade.

O risco é o projeto não ser votado na semana que vem, nem nunca mais ¿ afirmou.

O parlamentar exige uma posição clara do governo federal nessa disputa. Ele cita como exemplo a advertência feita pelo Palácio do Planalto ao veto do projeto de reajuste dos aposentados. Da mesma forma, acredita que, sem uma mediação do presidente Lula, o encontro dos governadores não terá efeito: ¿ Será jogar uma partida de futebol sem juiz.

A bancada nordestina, que ensaiava esse movimento há semanas, consolidou a ofensiva na terça-feira, quando o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), comandou reunião na Câmara. No encontro, foi decidido que a bancada apresentará emendas ao relatório que trata do sistema de partilha com vistas à redistribuição dos recursos.

Naquele dia, sabendo da movimentação, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o vice-governador, Luiz Fernando Pezão, que estavam no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede provisória do governo federal, foram à Câmara investir contra a iniciativa nordestina.

O governador Sérgio Cabral alterou a sua agenda para estar na terça-feira em Brasília, onde se reunirá ainda com Temer e a bancada do Rio. Ele ressaltou, por meio de sua assessoria, que o presidente Lula já havia se comprometido a não haver qualquer mudança em relação às receitas geradas por essas áreas.

O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, disse que não se envolverá na disputa: ¿ Para a Petrobras e as empresas (exploradoras), a distribuição dos royalties a estados produtores e não produtores é indiferente. A Petrobras vai pagar os 15% de qualquer maneira.

E ela não paga ao estado, mas diretamente ao Tesouro Nacional ¿ afirmou, em uma audiência na Assembleia Legislativa do Ceará.

A declaração foi uma resposta à provocação do senador Inácio Arruda (PCdoB), que pediu apoio da estatal em favor das regiões Nordeste e Norte contra a pressão do Rio e de São Paulo