Título: Mujica não é um democrata convicto
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 30/11/2009, O Mundo, p. 21

JULIO MARIA SANGUINETTI

MONTEVIDÉU. A vitória de José "Pepe" Mujica era o cenário temido pelos partidos tradicionais do Uruguai. Em entrevista ao GLOBO, o ex-presidente Julio Maria Sanguinetti (1985-1990 e 1995-2000), primeiro chefe de Estado eleito democraticamente após a última ditadura, disse que o novo presidente poderia seguir os passos de Venezuela e Argentina, que "são democracias formais, mas não respeitam de forma suficiente as leis".

O triunfo de Mujica não é uma boa notícia para o Partido Colorado...

JULIO MARIA SANGUINETTI: Sentimos preocupação, porque respaldamos a candidatura de Lacalle. E por que respaldamos Lacalle e não Mujica? Porque Mujica não é um homem claro no que diz respeito a suas convicções democráticas, fala com desprezo sobre Constituição, Justiça, enfim, por alguma razão foi guerrilheiro e esteve tantos anos preso. Ele jamais condenou seu passado. Mujica não oferece garantias sobre um governo democrático.

O senhor questiona as simpatias dele com outros presidentes da região...

SANGUINETTI: Mujica oscila muito. Foi muito amigo dos Kirchner e às vezes parece próximo a Chávez. Depois diz que prefere o modelo do presidente Lula. O que fica claro é que não é uma pessoa com ideias definidas, o que não nos dá muitas certezas. Mujica costuma dizer que "como digo uma coisa, digo outra coisa", o que reflete suas contradições.

A vitória de Mujica põe em risco a democracia uruguaia?

SANGUINETTI: Se estamos falando em risco de golpe de Estado e violência, a resposta é não, porque nossas instituições democráticas são fortes e ninguém as pode desafiar. Mas uma coisa é a formalidade democrática e outra coisa a qualidade da democracia. Temos governos na região que foram democraticamente eleitos, que são democracias formais, mas que não respeitam de forma suficiente as leis. Venezuela e Argentina são alguns exemplos, sobretudo no relacionamento com a imprensa. (Janaína Figueiredo)