Título: DEM ameaça expulsar Arruda
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 29/11/2009, O País, p. 3

Envolvimento de governador em esquema de propina é comparado ao mensalão do PT

O GOVERNADOR ARRUDA: ele comandava diretamente o esquema de propina, segundo a PF; no alto, dinheiro apreendido

Acúpula do DEM convocou uma reunião extraordinária da Executiva Nacional do partido para decidir sobre a expulsão do governador José Roberto Arruda (DF). Dirigentes do DEM afirmaram ontem ao GLOBO que a situação de Arruda ficou insustentável, diante dos resultados da investigação da Polícia Federal e do Ministério Público, que flagrou um esquema de cobrança de propinas e distribuição de dinheiro para deputados aliados. Segundo a PF, Arruda comandava uma ¿organização criminosa¿ que pagava mensalmente propina a deputados aliados e integrantes do governo. O dinheiro era arrecadado com empresas que têm contratos com o governo do Distrito Federal.

No DEM, já foi formada uma convicção majoritária pela contundência das provas contra Arruda, o único governador do partido.

Hoje, uma comissão do DEM tentará ouvir as explicações de Arruda sobre o episódio, mas muitos dirigentes já reconhecem a dificuldade do governador para justificar fatos considerados graves no que já é chamado de ¿mensalão do DEM¿. O partido teme a associação desse episódio com o chamado mensalão do PT ¿ o pagamento de mesadas a parlamentares pela cúpula do PT em troca de apoio ao governo Lula.

¿ O partido não vai tolerar desvios éticos. Esperamos uma resposta convincente do governador Arruda. Até lá, ele tem o benefício da dúvida. As consequências políticas desse episódio para o DEM vão depender do nosso comportamento. Se agir como o PT no mensalão, o DEM vai sair arranhado. Mas se agir de acordo com a realidade, o partido não vai perder o seu discurso ¿ disse o senador Demóstenes Torres (DEM-GO).

Haveria risco de contaminar partido

Ontem, a preocupação maior era de que uma demora na expulsão de Arruda pudesse contaminar o partido de forma definitiva, com consequências eleitorais graves para o próximo ano. Esse foi o argumento mais forte para a consolidação do consenso pelo desligamento de Arruda. Inicialmente, o DEM vai sugerir que o governador tome a iniciativa de pedir a desfiliação, para evitar um desgaste político ainda maior.

¿ Nós não conhecemos a dimensão do problema. E temos que evitar contaminar o partido, para que não haja prejuízo eleitoral. Mas está claro que essa é uma crise no partido e no DF. Não há dúvidas de que isso vai nos causar dificuldades ¿ disse o vice-líder na Câmara, José Carlos Aleluia (BA).

O escândalo no governo Arruda levou o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), a cancelar uma viagem que faria à Espanha, onde participaria de um congresso do Partido Popular. Ele voou para Brasília ontem para acompanhar de perto a crise. Um dia depois da operação da PF, Maia mudou o tom e passou a adotar um discurso cauteloso:

¿ Estou aguardando a análise de todo o processo.

O líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), também voltou para Brasília.

Hoje outros integrantes da Executiva, como o deputado ACM Neto (DEM-BA), também desembarcam na capital para marcar a estratégia do partido e dar a oportunidade para que Arruda apresente sua versão dos fatos. Há um clima de desconfiança generalizado em relação ao governador, até porque ele passou o dia de ontem evitando as lideranças do DEM. Um influente líder do DEM chegou a afirmar que, num ¿processo infeccioso, o melhor a fazer é amputar uma perna para evitar a contaminação de todo o corpo¿.

Outro integrante da cúpula explicou que o DEM trabalhou muito nesses últimos anos para reposicionar a imagem da legenda e que o mensalão do PT ajudou nessa estratégia. Por isso, se o partido não agir rápido agora, pode jogar isso fora. A avaliação é que o problema não é a eleição do DF, mas a radiação desse escândalo entre as principais lideranças democratas em todo Brasil. Existe um sentimento de perplexidade no partido com Arruda, por ele ter colocado o DEM, neste episódio, em posição de cautela.

¿ Quem com mensalão fere, com mensalão será ferido ¿ alfinetou o presidente eleito do PT, o ex-senador José Eduardo Dutra (SE).

¿ Será difícil o Arruda sair dessa. Mas ele precisa falar. Não podemos condená-lo antes de o governador ser ouvido ¿ reforçou o líder do PT, deputado Cândido Vaccarezza (SP).

A apreensão na cúpula do DEM não foi por acaso. Até porque é ele o único governador do partido e é apresentado como uma espécie de vitrine e modelo de gestão dos democratas para todo o Brasil. Trecho de gravações autorizadas pela Justiça flagram o governador do Distrito Federal orientando o seu então secretário de Relações Institucionais, Durval Barbosa, sobre o pagamento de propina a parlamentares e integrantes do governo.

Segundo relatos de parlamentares do DEM, Arruda foi vago nas explicações ao partido ¿ ele apenas afastou os envolvidos na sexta-feira, mas não refutou as acusações ¿, o que aumentou o clima de desconfiança no comando da legenda. Vários democratas lembraram de forma reservada o episódio da quebra do sigilo do painel do Senado ¿ em que Arruda mentiu ao negar o ocorrido e teve que renunciar o mandato em 2001 para não ser cassado ¿ para reforçar o clima de suspeita em relação ao governador.

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