Título: Dubai: de polo turístico de luxo a risco de calote bilionário
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 29/11/2009, Economia, p. 36

Crise mostra percalços dos países do Golfo na tentativa de diversificar economia e depender menos de petróleo. Emirado criou bolha imobiliária financiada por dívida de US$80 bi

O COMPLEXO de casas Palm Island, em forma de palmeiras, construído no litoral de Dubai: especulação imobiliária

Notícias vindas do mundo árabe derrubaram bolsas ao redor do mundo nos últimos dias, mas ao menos dessa vez não se pode apontar o dedo para a volatilidade dos preços do petróleo. Na verdade, o temor provocado pela expectativa de um calote bilionário por parte de Dubai, o mais famoso dos Emirados Árabes Unidos, está justamente ligado aos esforços das economias do Golfo para reduzir sua dependência do petróleo. Ainda que, no caso especifico de Dubai, a experiência de diversificação esteja mostrando resultados muito mais assustadores que promissores.

Ilhas artificiais e o prédio mais alto do planeta

Na semana passada, o conglomerado estatal Dubai World pediu a seus credores para adiar o pagamento de US$59 bilhões em dívidas da incorporadora Nakheel, da qual detém o controle, abalando os mercados financeiros em todo o mundo. Reflexo da crise global, que derrubou em 50% os preços dos imóveis em Dubai.

Ao contrário de Abu Dhabi, o vizinho que hoje controla 90% das reservas petrolíferas dos Emirados Árabes Unidos (a quinta maior do mundo), Dubai precisou muito mais cedo se preocupar com a era pós-óleo: sua produção caiu vertiginosamente desde as descobertas dos anos 60 e hoje o petróleo e gás natural respondem por menos de 6% da arrecadação.

A solução foi um investimento maciço no setor de serviços financeiros e de turismo, para aproveitar as vantagens geográficas de se estar no meio do caminho entre Ásia e Europa.

A partir dos anos 90, o emirado passou por um boom de construções e investimentos, que incluíram prédios nababescos, gigantescas ilhas artificiais, um shopping center com estação de esqui, e o maior aeroporto do mundo, além do prédio mais alto do planeta.

Modelo baseado em mão de obra migrante

Tudo sob a coordenação do xeque Mohammed Bin Rashid Al-Maktoum, governante de Dubai cujo retrato é quase tão presente nas ruas como arranha-céus e engarrafamentos. O problema é que Al-Maktoum financiou seu sonho à base de empréstimos vultosos em várias partes do planeta, estimados em US$80 bilhões.

¿ Dubai encantou muita gente com uma promessa insustentável, garantida apenas pela especulação e pela exploração da força de trabalho migratória. O modelo econômico baseado no luxo e no turismo foi concebido para uma época em que a economia mundial não passava pelas tempestades de hoje. Mas é preciso que o estouro dessa bolha não passe a impressão de que a diversificação econômica no Golfo é impossível ¿ afirma o britânico Chris Davidson, analista político e econômico de Oriente Médio que viveu dez anos em Dubai.

Davidson aponta para exemplos mais positivos no vizinho Abu Dhabi, que usou os benefícios do petróleo para investir na ampliação de sua base industrial e nos setores de turismo e varejo, que incluem a construção do imponente complexo Yas Marina, que recentemente sediou uma etapa do Mundial de Fórmula-1.

(*) O repórter viajou a convite do governo dos Emirados Árabes Unidos