Título: Gordura é boa fonte para tratar lesões de medula
Autor: Marinho, Antônio
Fonte: O Globo, 29/11/2009, Ciência, p. 45

Grupo da UFRJ conseguiu recuperar os movimentos em animais que sofreram traumas agudos graves

No Rio há outros estudos promissores na área de células-tronco. Por exemplo, a aplicação de células adultas retiradas de tecido adiposo, gordura, apresentou bons resultados na recuperação de lesão de medula em animais submetidos a traumas em laboratório. A pesquisadora Karla Menezes, do Centro de Ciências da Saúde da UFRJ, obteve essas células de um material fácil de encontrar e inclusive descartado em milhares de cirurgias de lipoaspiração.

Os testes ¿ realizados em 35 animais (ratos) com lesão de medula de leve a grave (transecção) ¿ indicaram que as células-tronco retiradas de tecido adiposo, cultivadas, purificadas e estimuladas, auxiliam na recuperação das funções motoras. Os animais receberam uma única injeção de células em até uma hora após sofrerem o trauma agudo. Na escala de 0 a 21 de avaliação da capacidade locomotora, aqueles que não passaram pelo tratamento alcançaram nota 4. Já os animais submetidos ao tratamento tiveram em média nota 9,5. Alguns chegaram a 12.

¿ Em humanos, isso significaria grande ganho de força, equilíbrio e, talvez, sensibilidade. Parece que as células aumentam a vascularização, melhorando o fluxo de oxigênio e nutrientes na área afetada. Um motivo da morte de neurônios é a falta de oxigênio. As células secretaram fatores que ajudaram os neurônios a sobreviver. Mas só testamos em casos agudos ¿ diz Karla, do Laboratório de Biologia da Matriz Extracelular, e cujo estudo é chefiado por Tatiana Sampaio.

Há mais experiência com células-tronco adultas da medula, mas células adiposas parecem ser uma boa fonte. E com a vantagem de serem obtidas do paciente. Existem outras linhas de pesquisa. Em Portugal, por exemplo, o médico Carlos Lima, do Hospital Egas Moniz, testa em humanos com lesão de medula óssea células-tronco extraídas da mucosa do nariz.

Substância da maconha pode ser útil em transplantes

Ainda no Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, cientistas descobriram que um composto da maconha pode aumentar a eficiência dos transplantes de células-tronco no sistema nervoso. Segundo o artigo, que será publicado na revista americana ¿Cell Biology International¿, o canabinoide aumentaria a taxa de sobrevivência das células para 45%. Hoje, esse índice é de, no máximo, 20%.

A análise foi feita com células tronco embrionárias de camundongos. Segundo Rehen, um dos coordenadores do estudo, o baixo índice de toxicidade do canabinoide permite o seu uso em testes clínicos ¿ o composto, inclusive, já é usado nos EUA para aumentar o apetite de pacientes com câncer.

¿ Se comprovarmos a segurança do canabinoide em células-tronco embrionárias, podemos usá-lo em doenças degenerativas, como o mal de Parkinson, ou em casos de perda de tecido, como lesões na medula ¿ explica. ¿ São episódios onde a perda celular é mais focada e, por isso, conseguiríamos monitorar melhor os resultados.

Um eventual fracasso do canabinoide não implicaria na morte do paciente ¿ apenas faria com que sua recuperação não fosse tão rápida como nos casos em que o composto é aceito no organismo.

¿ A partir do momento em que o canabinoide aumenta a sobrevivência celular, sabemos que é possível combiná-lo com transplantes ¿ pondera Rehen. ¿ A próxima etapa é aplicar o composto na lesão. Primeiro fazemos em camundongos; se der certo, podemos pensar em testar em humanos.

*Com o Independent. Colaborou Renato Grandelle.