Título: Terra do samba e do idoso
Autor: Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 07/12/2009, Economia, p. 21

Renda maior no Rio de Janeiro abre espaço para crescimento econômico

SÔNIA NESI, cabeleireira de 63 anos, mora e trabalha em Copacabana, bairro com a maior concentração de pessoas com mais de 60 anos da América Latina. E não pensa em parar de trabalhar tão cedo: atualizações para atender à quarta geração de clientes

Aterra do samba e do culto ao corpo também é a capital brasileira do idoso. O Rio de Janeiro é o estado com a maior proporção de pessoas acima de 60 anos do país: são 2,3 milhões ou 14,9% do total da sua população. O contingente, entretanto, não traz uma ameaça à economia fluminense, esperam economistas. A renda mais elevada e a necessidade de serviços específicos podem, ao contrário, dar fôlego a uma economia extremamente dependente do petróleo. No entanto, o envelhecimento pode suscitar um movimento migratório no Rio, interrompido nos últimos anos, atraindo trabalhadores de outras regiões do país.

- Existe uma oportunidade. O estado já começa a apresentar uma demanda por serviços específicos, adaptações físicas em espaços públicos e profissionais qualificados, especialmente em saúde. Se o estado fizer o seu dever de casa, o envelhecimento pode, sim, se transformar em crescimento - disse Hildete Pereira, professora da UFF, acrescentando ainda que a renda do idoso ajuda - e muito - a movimentar o varejo fluminense.

No Rio, a renda do idoso é, em média, de R$1.250,58, acima da nacional (R$1.012,97). Quem tem mais de 80 anos no Estado do Rio ganha, em média, R$1.427,95 mensais, enquanto que o rendimento médio do grupo no país é R$926,89. Na Região Metropolitana do Rio, chega a R$1.551,61. Um reflexo da maior escolaridade dos moradores do estado. Segundo o IBGE, quem tem mais de 60 anos no país possui, em média, 4,1 anos de estudo. No Rio, são dois anos a mais. E na região metropolitana, a escolaridade é maior, chegando a 6,5 anos na média.

- A escolaridade explica os avanços na renda - resumiu Hildete.

Na avaliação de Mauro Osório, presidente do Conselho Estratégico de Informações da Cidade do Instituto Pereira Passos, o turismo é um dos setores que pode ganhar com o envelhecimento populacional. Ele lembra que "a cidade que é boa para idoso é boa para o turista". Se estiver bem adaptada, estará cada vez mais na rota dos turistas, especialmente dos que têm mais de 60 anos:

- O turismo é a vocação do Rio, especialmente da cidade.

R$300 para manter mais velhos em casa

Na capital dos idosos, já saem do papel iniciativas que olham para essa população mais velha. Um dos exemplos é a pioneira Universidade Aberta da Terceira Idade (UnATI), primeira universidade voltada para os idosos do Brasil. Outro é o fato de o município ser a primeira cidade a receber um projeto de gestão da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos que visa a levantar necessidades dos idosos, formar redes de apoio e traçar politicas públicas. E ainda tem a Secretaria de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida do município do Rio - que se orgulha de já ter implantado, por exemplo, 120 núcleos de ginástica, cinco academias e cinco casas de convivência. Outro projeto é a concessão de bolsa de R$300 para que as famílias fiquem com seus idosos. Trinta famílias participam do projeto. Em 2009, serão 70.

- Temos orçamento de R$12 milhões. Já a Saúde, R$3 bilhões - compara a secretária Cristiane Brasil, acrescentando que está sendo feito um diagnóstico das necessidades do Rio. - Já sabemos, por exemplo, que os 20 principais pontos turísticos precisam de adaptações para o idoso.

É o bairro de Copacabana que concentra a maior quantidade de idosos do estado. Segundo Cristiane, trata-se da maior concentração de idosos da América Latina, onde 27% dos moradores têm mais de 60 anos. O bairro é o endereço de casa e do trabalho da cabeleireira Sônia Nesi, de 63 anos. Para ela, Copacabana reúne a praticidade de serviços que uma pessoa mais velha necessita, além da beleza natural da praia.

- Posso envelhecer fisicamente. Ao me abaixar, o joelho avisa: "Sônia, você já não é tão nova". É só nessa hora. Tenho a energia dos jovens. Estou sempre viajando para me atualizar e, assim, consigo atender à quarta geração de muitos clientes - conta ela, que não pensa, tão cedo, em largar as tesouras.

E as oportunidades surgem desde já. O empresário Raimundo Costa, até então com empreendimentos na Barra, no Jardim Botânico e em Ipanema, notando o aumento da rotatividade da terceira idade nos restaurantes, resolveu abrir mais uma filial do seu Frontera. em Copacabana:

- Os idosos têm saído mais para se distrair, têm curtido mais a vida. Pela primeira vez, até o nosso menu será diferenciado, com muitas sopas e comidas de fácil degustação, as preferidas do nosso público sênior.

O envelhecimento populacional do Rio de Janeiro é uma herança dos tempos de capital federal, lembra Lúcia Cunha, especialista do IBGE. Segundo ela, nas décadas de 40 e 50, houve forte queda na taxa de mortalidade infantil e crescimento na escolarização das crianças:

- Além disso, no fim dos anos 60 e início de 70, o processo de queda da taxa de fecundidade iniciou no Rio de Janeiro. Juntos, esses fatores ajudam a explicar o motivo pelo qual o estado é o que tem a maior proporção de idosos do país.