Título: Banco do Brasil no rastro de devedores da União
Autor: Beck, Martha; Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 06/12/2009, Economia, p. 29

Governo federal quer se concentrar em grandes dívidas para recuperar R$ 400 bi e deixar casos menores para o BB

BRASÍLIA. Num esforço para aumentar as receitas, o governo deu início a uma ofensiva para recuperar, pelo menos, R$ 80 bilhões inscritos na dívida ativa da União. Esse montante é o início de um processo de ¿limpeza¿ dos débitos de pessoas físicas e jurídicas, que hoje somam R$ 805 bilhões. Excluídos os casos perdidos, o estoque está estimado em R$ 400 bilhões.

A ideia do governo é retirar da conta os valores irrecuperáveis e correr atrás dos devedores que ainda podem ser encontrados, concentrando esforços nas grandes quantias.

A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) vai separar pequenos e grandes devedores em dois grupos. Os primeiros, cujas dívidas somam entre R$ 20 mil e R$ 30 mil, deixariam de ser cobrados diretamente pela PGFN, que repassaria o trabalho para uma instituição federal, provavelmente o Banco do Brasil (BB), que já assumiu a cobrança de débitos rurais. Os devedores nesta faixa de valor respondem hoje por 10% do estoque e 60% do número de processos. Assim, os procuradores da Fazenda poderão se concentrar na cobrança de grandes valores.

¿ O que não queremos é gastar energia e recursos de execução judicial com quem não pode pagar ¿ diz o diretor de gestão do Departamento da Dívida Ativa da PGFN, Paulo Ricardo Cardoso.

Segundo a lista de devedores no site da PGFN, estão inscritas na dívida ativa empresas que já faliram como Transbrasil, Mesbla e Casas Pernambucanas.

Cardoso lembrou que cada um dos 1.800 procuradores da Fazenda Nacional cuida, em média, de 15 mil processos. A dívida ativa tem hoje 7,3 milhões de inscrições, das quais 70% correspondem a débitos superiores a R$ 100 mil. A maior dívida de um único contribuinte é de R$ 6 bilhões e a menor, de mil reais.

Inadimplentes poderiam ir para cadastro de Serasa e SPC

Mesmo inscritos na dívida ativa e contabilizados como potenciais créditos do governo, há débitos que já não têm qualquer chance de serem recuperados. É o caso de grandes empresas que já faliram há muito tempo ou de laranjas sem condição financeira ou patrimonial para quitar e que sequer sabem da existência do débito. Até aqueles que têm chances de serem pagos ainda podem levar anos para chegarem aos cofres públicos.

A terceirização da cobrança das pequenas dívidas será uma forma de poupar recursos, além de aumentar as chances de recuperação dos créditos. Hoje, cada processo de cobrança tem um custo em torno de R$ 17 mil e dura, em média, 12 anos. Foi esse custo que fez com que a PGFN perdoasse R$ 3,5 bilhões em dívidas de contribuintes com débitos de até R$ 10 mil, vencidos até 31 de dezembro de 2002. A medida beneficiou 1.156.585 contribuintes, sendo 800.575 empresas e 356.010 pessoas físicas.

Segundo o plano do governo, os débitos considerados impagáveis devem deixar de ser contabilizados na dívida. Mas ainda não está claro se sairão em definitivo ou se passarão a constar de uma espécie de lista, que poderá ser consultada e passar por nova cobrança de tempos em tempos. Uma das alternativas é usar o sistema espanhol, que deixa os nomes em outra lista revista a cada quatro anos.

Cardoso diz que simplesmente dar baixa nos débitos não parece ser o meio mais adequado de lidar com o tema. Isso porque corre-se o risco de liberar devedores que têm condições de pagar e manter outros que não têm, além de contabilizar o que não pode ser recuperado.

Também não foi definido o valor de corte dos pequenos, entre R$ 20 mil e R$ 30 mil. A decisão deve ser tomada mediante um ato conjunto assinado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o advogado geral da União, Luís Inácio Adams. Há nove grupos à frente do projeto de depuração da dívida neste momento na PGFN. A conclusão dos trabalhos está prevista para o primeiro semestre de 2010.

Antes de depurar do estoque os débitos impagáveis daqueles que têm boas chances de sucesso com a cobrança, a PGFN terá que recalcular os valores das dívidas. Isso porque, em razão dos planos econômicos das últimas décadas, muitas correções ficaram defasadas e têm erros para mais ou para menos.

¿ Trata-se de um estoque antigo. Há dívidas do milênio passado ¿ diz o diretor.

A cobrança hoje é feita por aviso do Serpro ao contribuinte.

A PGFN não apura valor de dívida, apenas recebe os cálculos concluídos dos órgãos de origem responsáveis pelos autos de infração (Receita Federal, Previdência, Ministério do Trabalho etc.). O novo sistema de cobrança para os pequenos devedores ainda não foi lançado porque a PGFN estava esperando a conclusão do Refis da crise.

Após as instâncias administrativas nos órgãos de origem, o contribuinte passa a ser um devedor da União e é inscrito na dívida ativa. Na hora da inscrição, são acrescidos sobre o valor de débito 10% de encargos.

Se o valor ajuizado não for pago, outros 10% serão adicionados ao principal. O nome do contribuinte é encaminhado ao Cadastro de Inadimplentes (Cadim) e vai para a página da PGFN na internet. Para acelerar a cobrança de débitos, a PGFN pretende pôr os nomes dos devedores na Serasa e no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC).