Título: Produto Interno Baixo
Autor: Almeida, Cássia; Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 11/12/2009, Economia, p. 31

Crescimento de 1,3% no 3º trimestre decepciona e país deve fechar o ano em estagnação ou queda

Aeconomia brasileira avançou 1,3% de julho a setembro deste ano frente ao trimestre anterior. O número, bem abaixo das expectativas dos analistas, que giravam em 2%, surpreendeu o mercado e trouxe de volta o temor de que o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) recue este ano. As projeções, revistas com o resultado, estão agora entre 0,2% e -0,5%. Se as estimativas se confirmarem, será a primeira queda no PIB desde 1992 (-0,47%), ano do Plano Collor, logo depois do confisco de 1990 (quando a economia recuou 4,35%). De janeiro a setembro deste ano, a economia encolheu 1,7% e nos últimos 12 meses a redução é de 1%. É a primeira vez desde 1999, ano da maxidesvalorização do real, que há retração no PIB num período de 12 meses. No ano, a economia produziu R$2,293 trilhões de bens e serviços.

- Não houve uma mudança de cenário, mas a economia está se recuperando mais devagar. O consumo das famílias também teve desaceleração, se compararmos com as taxas registradas antes da crise. Mas os gastos continuam crescendo porque o crédito está crescendo, acompanhado pela expansão da massa salarial - explica a gerente de Contas Trimestrais do IBGE, Rebeca Palis.

A desova de estoques, que parecia terminada no segundo trimestre, foi uma das explicações para o crescimento menor que o esperado. Essa é uma variável difícil de projetar, segundo analistas. Cálculos da LCA Consultores indicam que o PIB teria crescido 2,3% no trimestre, se os estoques permanecessem iguais de julho a setembro. Nas contas da Convenção Corretora, o ajuste de estoques tirou 1,8 ponto percentual na taxa acumulada no ano. Ou seja, em vez da queda de 1,7% no PIB, teríamos estabilidade.

- Havia ainda estoques no setor intermediário (insumos para indústria). A notícia boa é que a variação de estoques (de menos R$4,4 bilhões) não indica que a demanda está menor. Ela continua crescendo forte, e o crescimento de 2010 não será afetado - afirmou Fernando Montero, economista-chefe da Convenção Corretora.

Mesmo com PIB de 5%, país não cresce

E a alta de 1,3% no trimestre, que indica crescimento anualizado de 5%, foi puxada pelos setores que mais sofreram com a crise financeira internacional. O investimento cresceu forte, com alta de 6,5% frente ao segundo trimestre, embora ainda registre queda expressiva (-12,5%) contra o terceiro trimestre de 2008.

- A recuperação foi significativa. Passamos de uma taxa de investimento (em relação ao PIB) de 15,8% no segundo trimestre para 17,7%. Mas a poupança está muito baixa (15,5%, a menor desde 2001)- afirmou Armando Castelar, economista da Gávea Investimentos.

A indústria se destacou no terceiro trimestre. A alta foi de 2,9% frente ao período de abril a junho. Frente a 2008, a queda persiste. No terceiro trimestre foi de -6,9%.

A percepção de que o quarto trimestre será bem melhor está nos indicadores de atividade econômica já disponíveis. Em relatório divulgado ontem, o Itaú Unibanco afirmou que a surpresa negativa "contrasta com um conjunto amplo de indicadores que mostram expansão forte da atividade econômica em vários segmentos: indústria, comércio, emprego, renda e confiança de empresários e consumidores".

E o consumo se manteve em alta superior ao PIB no terceiro trimestre. Subiu 2% contra o período de abril a junho e 3,9% contra o mesmo trimestre de 2008. Há seis anos, o consumo das famílias vem crescendo, refletindo o aumento da massa salarial de 2,5% e do crédito para pessoas físicas de 17,9%.

Marco Antônio Chaves Novaes, presidente da Ingleza - fabricante mineira de ceras e produtos para limpeza -- confirma que o mercado interno sustentou a economia neste ano. A fabricação de alguns produtos caiu entre 5% e 7%, mas agora ele já recuperou totalmente as vendas e espera fechar 2009 com um faturamento entre 2% e 3% acima do bom ano de 2008:

- A queda não foi muito grande, houve sim um grande susto. Mas para nós, que destinamos 92% da nossa produção para o mercado interno, a recuperação foi melhor, tanto que planejamos crescer entre 12% e 14% em 2010.

Mesmo com o consumo em alta e a expectativa de expansão expressiva no fim do ano (acima de 4%), será preciso que a economia avance 5% frente ao quarto trimestre de 2008 para que a economia permanece do mesmo tamanho do ano passado. É um percentual que poucos analistas estão prevendo.

- Para chegar no mesmo nível de 2008, a alta frente ao terceiro trimestre tem que ser de 3,5%. Isso significa crescimento anualizado de 14%. Não é impossível, mas é improvável que isso aconteça - afirmou Castelar.

Menor contribuição do setor externo

Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, teme que esse avanço menor do PIB faça o governo cair na tentação de ser mais ativo na política fiscal:

- A hipótese de os juros subirem no início do ano foi por água abaixo. O perigo é aumentar muito o déficit em transações correntes (contas com o resto do mundo) e o déficit público. Será que, em dois ou três anos, o investidor estará disposto a cobrir o rombo nas contas externas de US$70 bilhões? Qualquer pequena crise no mercado mundial pode ter efeitos no câmbio.

O setor externo ainda contribui de forma positiva para o PIB, mesmo com as exportações tendo registrado uma queda de 10,1% no terceiro trimestre contra o mesmo período do ano passado. Isso porque a queda das importações foi ainda maior: 15,8%.

- Essa contribuição será anulada em breve, pois as importações já estão crescendo por causa do real valorizado. E se a economia crescer 5% no ano que vem, as importações subirão 15%. Em média, cada 1 ponto percentual de alta no PIB eleva as importações em 3%. No total, prevemos que as importações cresçam entre 22% e 25%, contra aumento de 10% das exportações - afirmou José Augusto de Castro, da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).