Título: Não acham que a Unesco é importante
Autor: Queiroz, Silvio; Carvalho, Giselle
Fonte: Correio Braziliense, 29/05/2009, Mundo, p. 22

As eleições para a direção da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura (Unesco) terão início em setembro, mas para o brasileiro Marcio Barbosa, que há oito anos é o vice-diretor, é urgente uma definição do governo brasileiro. Com um currículo exemplar ¿ o engenheiro carioca esteve à frente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) por oito anos e ingressou na Unesco por meio de um disputado concurso ¿ , ele ainda tenta entender os motivos que levaram o Itamaraty a declarar apoio ao candidato egípcio, Faruk Hosni, em vez de bancar a candidatura de um brasileiro. E o tempo urge: o prazo para que o governo retroceda termina no domingo.

O que leva o sr. a acreditar que o Brasil teria chances de conquistar a chefia da Unesco? No cargo de vice-diretor há oito anos, tive a oportunidade de assumir a liderança em diversas ocasiões. Ao que me parece, fiz um bom trabalho. A atual gestão, liderada pelo japonês Koichiro Matsuura, tem credibilidade, é bem aceita. Para ser eleito, o candidato precisa obter 30 votos do total de 58 países que participam do pleito. Até agora, eu teria o apoio de cerca de 20 nações. A eleição na Unesco, normalmente, só é definida em segundo, terceiro turno. Teria boas chances de conquistar outros aliados ao longo da disputa, já que tenho um baixo nível de rejeição, diferentemente do candidato egípcio.

Qual a sua impressão sobre a candidatura de Hosni? Não sei. Quem está aqui dentro enxerga o cenário por outro ângulo. Não me parecem verdadeiras as chances de vitória de Hosni. Ele já vem fazendo campanha há cerca de dois anos. Não há união no mundo árabe em relação à sua candidatura.

Quais seriam os motivos, na sua opinião, que levaram o governo brasileiro a apoiar o egípcio? Não sei. É o que estou tentando entender. A Unesco é uma organização de peso. Dirigir esse órgão é como, digamos, ser um chefe de Estado ou presidente de um país. O maior escritório da Unesco no mundo é localizado no Brasil. Minha frustração é perceber que houve interesse do governo em dar atenção a outras instituições, como a Organização Mundial do Comércio (OMC). Não contava que, neste momento, fossem colocar a Unesco em outro plano. Não acham importante¿

De acordo com as regras do pleito, o sr. poderia ser inscrito por outras nações. Considera a possiblidade? Não quero ser inscrito por outro país. Se o governo brasileiro é contra a minha inscrição, mesmo tendo seguido uma carreira científica de sucesso, por que seguiria em frente com essa candidatura? Por que meu próprio país não me apoia? Não quero considerar isso. Hoje (quarta-feira), a quatro dias do fim do prazo, não me sinto inclinado a aceitar.

A posição do governo em relação à sua candidatura pode ser decorrente de uma briga política interna? Sou e sempre fui apartidário. Me parece que a imprensa brasileira, de alguma forma, tenta vincular a minha vinda para a Unesco com a gestão Fernando Henrique Cardoso. Não tem ligação. Olha, trabalho em órgãos públicos desde o governo Sarney. Saí do país porque passei em concurso, o que (espero) consegui por meus próprios méritos. Não sou filiado a nenhum partido, nunca fui. Estão distorcendo as coisas. Aliás, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), ex-presidente da Câmara, veio à Unesco no fim do ano, um dos membros da delegação brasileira. Conversamos bastante, ele se mostrou satisfeito com o trabalho que estamos realizando. A Unesco é algo que está muito acima de disputas políticas internas.