Título: Hemodiálise pela metade
Autor: Campos, João
Fonte: Correio Braziliense, 29/05/2009, Cidades, p. 28

Falta de especialistas no atendimento a doentes renais faz com que pacientes tenham sessões de duas horas. O padrão seriam quatro. Maria Aparecida sai de São Sebastião para se tratar no Hospital de Base três vezes por semana O sistema de atendimento aos pacientes renais crônicos de Brasília está à beira do caos. Sem funcionários suficientes para operar as máquinas de hemodiálise, os cerca de 1.240 dependentes do tratamento sentem diariamente a fragilidade do serviço. Nos quatro hospitais da rede pública credenciados pelo Ministério da Saúde, as sessões de purificação do sangue chegam a ter o tempo reduzido pela metade para que pessoas não fiquem sem a assistência. Segundo especialistas, a medida coloca em risco a vida de pacientes. E o quadro tende a piorar. Dados da Secretaria de Saúde indicam que, enquanto a estrutura está estagnada, um novo doente renal dá entrada em hospitais do DF a cada três dias.

A Resolução nº 154/2004 do Ministério da Saúde estabelece os padrões para o atendimento aos pacientes renais. A norma determina uma unidade para cada grupo de 200 mil habitantes. No DF, existem 11 instituições. O ideal para a demanda da população seriam 15. As regras exigidas estabelecem ainda que cada unidade deveria ter capacidade para atender até 200 pessoas. Isso significa que, na capital, teríamos 2,2 mil vagas para doentes. No entanto, a realidade é distante disso. Hoje, a estrutura é suficiente para 1.240 pessoas, atendidas no limite em quatro hospitais ¿ de Base (HB), Universitário e regionais de Taguatinga (HRT) e Sobradinho ¿ e em sete clínicas privadas.

O coordenador de hemodiálise do DF, Emanuel Cícero Dias, reconhece a precariedade do sistema. ¿Faltam profissionais para operar as máquinas e unidades de serviço. Se tivéssemos o quadro ideal, poderíamos dobrar os atendimentos¿, comentou. Cícero explica que o problema maior são os casos agudos, que chegam via pronto-socorro. ¿Não podemos deixar essas pessoas sem atendimento, mas isso prejudica quem está em tratamento. Fazemos o possível para amenizar o sofrimento¿, justificou.

Funcionário público, o doente renal de 34 anos prefere não se identificar. Luta para receber atendimento digno no HRT. ¿A fila é grande e não há enfermeiros. A seção que deveria ser de quatro horas passa a ser de duas para não deixar pessoas morrerem¿, revelou. Para o presidente da Associação dos Renais de Brasília, Carlos Alberto Rosa, submeter os pacientes à mudança no tratamento é colocar a vida deles em risco. ¿Faço tratamento há 17 anos e sei do alto risco de morte quando se diminui o tempo de filtragem do sangue. A situação é crítica¿, protestou. De acordo com ele, a situação grave ocorre pela queda no número de transplantes (veja quadro).

Sorte A doença renal crônica leva à perda irreversível da função dos rins, órgão responsável por ¿filtrar¿ o sangue. A cura depende de transplante. Enquanto o paciente espera doador, são necessárias, em média, três seções de quatro horas de hemodiálise por semana. Maria Aparecida Peixoto, 59 anos, sabe o que é essa rotina. Sai de São Sebastião para receber tratamento no HBDF, único local que consegue manter a qualidade dos serviços por receber apenas casos agudos. ¿Tem tanta gente com problema. Graças a Deus, aqui sou bem atendida¿, comentou. A Secretaria de Saúde espera convocar 85 técnicos em enfermagem aprovados no último concurso até o fim do ano. A contratação poderia dobrar o número de atendimentos, segundo Emanuel Dias. Há ainda duas unidades em processo de credenciamento: os hospitais regionais do Gama e da Asa Norte.

Atendimento longe do ideal

11 clínicas de atendimento a pacientes renais credenciadas pelo Ministério da Saúde. O ideal seriam 15.

164 profissionais da nefrologia à disposição da população. O ideal seriam 362.

1.240 pacientes atendidos, no limite, pela rede pública. Pela lei, deveria haver capacidade para 2,2 mil pessoas.

40 máquinas subtilizadas pela falta de técnicos em enfermagem que as operem.

98 transplantes de rins realizados no ano 2000, quando havia 500 doentes renais crônicos. Em 2008, apesar de o número de pacientes ter dobrado, os transplantes caíram para 38.

Fontes: Secretaria de Saúde do DF e Associação dos Renais de Brasília (Arebra).

30 NOVAS AMBULÂNCIAS Em até 90 dias, a rede pública de saúde terá 30 ambulâncias novas para o atendimento a pacientes da região. A compra dos veículos, feita em parceria com o Ministério da Saúde, foi anunciada pelo secretário de Saúde, Augusto Carvalho. O Samu receberá 10 carros. Os outros 20 ficarão à disposição das unidade públicas, como hospitais e postos de saúde. Cada ambulância custou R$ 127 mil.