Título: Agressão gera onda solidária a Berlusconi
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Fonte: O Globo, 15/12/2009, O Mundo, p. 29

Ataque cometido por desequilibrado vira fato político e analistas preveem que premier italiano recupere popularidade ROMA O sétimo andar do hospital San Raffaele, em Milão, foi palco ontem de um vaivém contínuo de políticos e parentes do primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi. Consternados, filhos, assessores e os presidentes da Câmara e do Senado foram pessoalmente prestar solidariedade ao premier ¿ ferido na véspera por um manifestante em tratamento psiquiátrico que lhe atirou uma miniatura de catedral enquanto o chefe de governo distribuía autógrafos após um comício em Milão. Berlusconi também recebeu no hospital uma mensagem do Papa e um telefonema da mulher, Veronica Lario, que está se separando dele. O premier pediu para lhe comprarem os jornais assim que acordou e falava pouco. Abatido, com o nariz e dois dentes da arcada superior quebrados, Berlusconi tentava ontem entender o motivo do ataque: "Por que tanto ódio de mim?", perguntou a um político amigo. Do lado de fora, os italianos se perguntavam se a agressão foi provocada pelos vários meses de escalada da tensão política, da troca de insultos e do "clima de ódio" no país. Direitistas atribuíram o ataque ao clima de violência alimentado pela esquerda. Já o Partido Democrata, principal organização da oposição, pedia ao premier de 73 anos para não se fazer de vítima. O temor é de que Berlusconi ¿ que diante de processos de corrupção e escândalos sexuais passou os últimos meses afirmando ser alvo de um complô da esquerda para derrubar seu governo ¿ use o episódio politicamente. Alguns analistas disseram que o "fator solidariedade" pode realmente ajudá-lo a ganhar simpatia e fortalecer sua posição na frágil coalizão governista de centro-direita. O ataque foi primeira página de jornais de todas as tendências políticas no país e até opositores admitiram que a imagem do chefe de governo coberta de sangue deixou todos estarrecidos. ¿ Acho que sua popularidade vai subir aos olhos da opinião pública e isso dificultará a tentativa de qualquer um de centro-direita de assumir seu lugar em breve ¿ disse o analista político Massimo Franco. Pesquisa publicada um dia antes do ataque mostrou que a popularidade dele caíra 4 pontos percentuais e estava pouco acima dos 50% ¿ ainda um percentual alto para quem teve cassada a imunidade jurídica em outubro e enfrenta vários processos por corrupção e fraude fiscal. ¿ Há muita simpatia por ele e condenação da violência por causa do passado histórico da Itália ¿ afirmou James Walson, chefe do departamento de Ciências Políticas da Universidade Americana de Roma. Agenda política suspensa Berlusconi ontem passava bem, mas médicos decidiram mantê-lo mais um dia em observação. Alimentando-se com dificuldade, Il Cavaliere perdeu meio litro de sangue com a pancada da miniatura de catedral, o suvenir mais vendido na praça-símbolo de Milão. O objeto de alabastro que se espatifou com o impacto não era o único portado pelo agressor, Massimo Tartaglia, de 42 anos, no momento do ataque. Na bolsa, ele também tinha um crucifixo, objetos de mesa e até uma lâmina. Depois de quase três horas de interrogatório, Tartaglia disse à polícia ter atacado Berlusconi pelo que considerou serem motivos políticos: ¿ Odeio a política do Povo da Liberdade e especialmente a do primeiro-ministro ¿ declarou. Mas depois Tartaglia escreveu uma carta ao chefe de governo pedindo desculpas por seu "ato superficial, covarde e incomum". Na véspera, o pai do agressor relatara que seu filho faz tratamento psiquiátrico desde os 18 anos e que a família é de esquerda, mas negou que houvesse ódio ao político ou histórico de agressões por parte de Tartaglia. Na rede social Facebook, foram criados vários grupos de apoio a Tartaglia. Também circulava ontem pela internet um joguinho eletrônico em que Berlusconi é alvo de torres e catedrais. O principal colaborador do chefe de governo, o deputado Paolo Bonaiuti, confirmou que o premier, antes do comício, estava preocupado "com a tensão e o ódio que o circundavam". A recuperação total de Berlusconi deve durar cerca de 20 dias. O premier precisou cancelar sua agenda política, incluindo uma reunião marcada para amanhã com primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan. Também sua participação na conferência do clima em Copenhague ¿ ele viajaria na quinta-feira ¿ foi suspensa. COLABOROU: Vera Gonçalves de Araújo oglobo.com.br/mundo Sexo, drogas e corrupção Silvio Berlusconi vem sendo alvo de escândalos em série este ano. Eis alguns: MENORES: O suposto caso com uma menor de idade aspirante a modelo detonou no início do ano o pedido de divórcio feito por sua mulher, Veronica Lario. Segundo ela, seu marido "frequenta menores de idade". PROSTITUIÇÃO: Um empresário preso numa investigação de tráfico de drogas disse em depoimento que contratava prostitutas para festas em mansões de Berlusconi. Uma das profissionais gravou conversas sobre sexo com o premier. GUERRA À IMPRENSA: Veículos que expõem seus escândalos sexuais e políticos são alvo de ações na Justiça. Berlusconi pede indenização de milhares de dólares. FRAUDE: Bilionário dono de um império de comunicação, o premier é alvo de uma série de processos antigos por corrupção e evasão fiscal. As ações podem ser agora retomadas depois que a Justiça cassou sua imunidade política, em agosto. "BERLUSCONI, TENHA uma rápida recuperação. Os verdadeiros italianos estão com você sempre", diz o cartaz ao lado do policial. Acima, cópia do suvenir lançado LA REPUBBLICA: "Berlusconi agredido em Milão" EL PAÍS: "Berlusconi agredido por um exaltado em comício tenso" LA NAZIONE: "O tempo do ódio" CORRIERE DELLA SERA: "Berlusconi ferido na praça: muito ódio" WALL STREET JOURNAL: única foto na página da versão europeia do jornal.