Título: Estudo aponta violência de polícias de Rio e SP
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 09/12/2009, O País, p. 12

Human Rights Watch critica combate ao crime nos dois estados: desde 2003, policiais mataram 11 mil pessoas

Duas são as principais causas das altas taxas de homicídio nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, conclui o mais recente informe do Human Rights Watch (HRW), divulgado na manhã de ontem na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Rio. Uma é a ação das facções envolvidas com o tráfico de drogas, através de ataques a quadrilhas rivais e contra a polícia. A outra é composta pelas forças encarregadas de combater criminosos: as polícias Civil e Militar, que teriam feito das execuções extrajudiciais uma rotina.

¿Reduzir o crime violento e conter essas facções representa um grande e, às vezes, perigoso desafio para as forças policiais.

Frequentemente, no entanto, ao invés de reduzir a violência, a polícia em ambos os estados acaba por contribuir com ela através do uso ilegal de força letal¿, diz um trecho do estudo.

O relatório contém estatísticas sobre esse tipo de desvio, além da síntese de casos comprovados de abuso de poder, pinçados dos próprios arquivos oficiais. Desde 2003, as polícias do Rio e de São Paulo mataram mais de 11 mil pessoas.

Policiais do Rio mataram 1.137 pessoas em 2008 Em 2008, dado mais recente, o Rio teve 1.137 homicídios cometidos por policiais durante o expediente ou fora dele (como membros de milícia). Em São Paulo, o índice foi de 397. Em todos os Estados Unidos a polícia matou 371 pessoas. O documento mostra ainda que, para cada suspeito morto por policiais no Rio, estes conseguiram prender 23. Em São Paulo o índice foi melhor: 348 detidos para cada morto.

Nos EUA, a proporção foi de 37.351 presos por cada morto.

Um levantamento específico sobre as dez áreas do Rio onde a polícia é mais violenta ¿ Méier, Engenho de Dentro, Madureira, Duque de Caxias e Pavuna, entre outras ¿ mostrou um resultado pior. Ali, para cada 12 policiais mortos, a polícia matou 825 pessoas, supostamente em defesa própria ¿ para cada policial morto, a polícia matou 69 pessoas.

¿ Policiais são autorizados a usar força letal como último recurso para se protegerem ou protegerem outros. Mas a noção de que esses homicídios seriam cometidos em legítima defesa ou seriam justificados pelos altos índices de criminalidade é insustentável ¿ disse o chileno José Miguel Vivanco, diretor executivo da divisão das Américas da HRW, sediada em Nova York.

Na grande maioria dos homicídios causados por policiais durante o expediente, os envolvidos informaram que seus tiros teriam sido atos de legítima defesa. Em São Paulo, essa alegação é designada como ¿resistência seguida de morte¿. No Rio isso é definido como ¿autos de resistência¿.

O HRW reconheceu os altos riscos enfrentados pelos policiais.

Mas ponderou que a sua reação muitas vezes tem sido tão criminosa quando a ação dos bandidos: ¿Dado que os policiais dos dois estados muitas vezes enfrentam uma ameaça real de violência por parte de membros do crime organizado, é provável que muitas dessas `resistências seguidas de morte¿ tenham sido resultado do uso legítimo de força pela polícia. Muitos casos, no entanto, claramente não foram¿.

Recomendações para acabar com a impunidade Vivando entregou uma cópia do informe ao governador Sérgio Cabral, na véspera da divulgação.

E contou que Cabral teria prometido se reunir com diretores do HRW no início de 2010 para discutir as conclusões e recomendações da organização.

A mais importante delas é a de acabar com a impunidade. E a maneira mais eficaz de obter isso, segundo o HRW, é interromper a praxe de que os próprios policiais investiguem os seus colegas. A sugestão é para que os Ministérios Públicos criem unidades especiais.