Título: ONGs ameaçam denunciar governo à OEA se programa for modificado
Autor: Éboli, Evandro ; Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 13/01/2010, O País, p. 4

Marina, candidata à Presidência, defende criação da Comissão da Verdade

BRASÍLIA. Entidades não governamentais ameaçam denunciar o governo brasileiro à Organização dos Estados Americanos (OEA) se o texto do Programa Nacional de Direitos Humanos sofrer alterações, como desejam as Forças Armadas e a Igreja Católica. Em nota conjunta, a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) e outras entidades defendem o programa.

A Justiça Global, entidade de defesa dos direitos humanos, informou que poderá recorrer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA caso Lula altere o plano por pressão dos militares.

¿ Politicamente será um retrocesso e indica que a chantagem dos militares ao colocar cargos à disposição surtiu efeito.

Teremos um prejuízo inestimável para a democracia. É uma ingerência de alcance absurdo das Forças Armadas sobre um decreto presidencial ¿ disse Andressa Caldas, diretora-executiva da Justiça Global.

Essa entidade já denunciou o governo em outros casos: ¿ Podemos recorrer à OEA, para que se manifeste sobre a ingerência. Mais grave do que possível denúncia internacional é a reação da sociedade civil.

Abre um precedente perigoso.

Em nota, as ONGs listam imprensa, Igreja, militares e ruralistas como opositores do programa.

¿Tentam disseminar uma visão anacrônica dos direitos humanos, reagindo violentamente a qualquer tentativa de mudança deste quadro no país. É imprescindível tocar em questões como a democratização da propriedade e dos meios de comunicação e a abertura dos arquivos da ditadura militar¿. A nota é assinada por outras entidades: Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos, Movimento Nacional de Direitos Humanos e Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos Sociais, Culturais e Ambientais

Senadora aponta viés eleitoral

A senadora Marina Silva (AC), pré-candidata do PV à Presidência, criticou ontem o lançamento do programa a poucos meses das eleições. Ela disse ver contaminação política no decreto de Lula e afirmou que o texto reabilita bandeiras deixadas de lado. Apesar das críticas, Marina defendeu a criação da Comissão da Verdade, destinada a investigar crimes cometidos pela ditadura.

Para a senadora, a intenção do governo é agradar setores mais à esquerda, contrariados com o abandono de causas históricas do PT: ¿ Obviamente, isso tem uma contaminação política ao vir a público às vésperas da eleição.

Num governo de oito anos, por que não foi feito antes? Ela evitou citar o nome da futura adversária, a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff: ¿ Causa estranhamento.

Não se deve jogar a criança fora com a água do banho, mas tudo fica contaminado pela eleição.

A senadora fez elogios ao ministro Paulo Vannuchi, e defendeu a proposta da Comissão da Verdade.

¿ A verdade é libertadora. É preciso ter explicação para o que aconteceu nos dois lados, sem revanchismo. Todos os países fizeram isso. Não concordo que o decreto vá afetar a Lei da Anistia. A questão da punição aos torturadores está no Supremo.

Não será resolvida por decreto ou pelo Congresso.