Título: Bastidores da elição de Obama no ventilador
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 13/01/2010, Mundo, p. 25

Livro expõe manobras de Hillary e Clinton e ofensas democratas ao então senador negro, além de críticas republicanas a Sarah Palin

OBAMA E CLINTON se abraçam depois de o ex-presidente apresentar o então candidato democrata num comício na Flórida

O SENADOR Harry Reid observa Obama discursar na Casa Branca: comentários racistas

Traições, baixarias, demonstrações de racismo, perseguições políticas e até crueldades pessoais. A roupa suja da campanha presidencial americana de 2008 começa a ser lavada em público pelo livro ¿Game change¿ (¿Mudança de jogo¿), escrito pelos jornalistas Mark Halperin, da revista ¿Time¿, e John Haileman, da revista ¿New York¿. A obra tem revelações picantes o bastante para abalar as relações entre Barack Obama e alguns de seus principais assessores, entre elas sua ex-adversária Hillary Clinton.

O livro chegou ontem às livrarias. A competição entre os Clinton e Obama pela indicação do Partido Democrata é descrita de modo chocante. E mesmo os encontros entre Obama e alguns líderes democratas são constrangedores, diante da forte resistência no partido a ter um negro candidato à Casa Branca. Do lado republicano, as descrições dos ensaios de Sarah Palin para o debate televisivo com Joe Biden, o vice de Obama, ridicularizam a então governadora do Alasca, e um dos assessores chega a dizer que com aquele desempenho o Partido Republicano teria ¿uma derrota histórica¿. As revelações já estão sendo consideradas um problema para a reeleição de muitos políticos em 2009, sobretudo democratas.

Casos de Clinton ganham um capítulo

Entre as cenas de racismo explícito contra Obama está uma que inclui Harry Reid, líder da maioria no Senado, mostrando que, a portas fechadas, os brancos do Partido Democrata falam dos negros de um modo bem diferente do que costumam usar em discursos. Reid teria dito que Obama seria um candidato negro ¿aceitável¿ porque ele tinha ¿pele mais clara¿ e ¿não fala aquele dialeto negro dos africanos¿, referindo-se ao inglês usado nas comunidades negras pobres nos EUA. Após o livro chegar às livrarias, Reid pediu desculpas a Obama, reconhecendo ter feito ¿comentários inapropriados¿ durante a campanha, e Obama o perdoou publicamente:

¿ O senador Reid é um homem bom que sempre esteve do lado certo da História. Mesmo que ele tenha usado linguagem inadequada, estava tentando me elogiar, e não devemos fazer uma tempestade sobre isto ¿ minimizou Obama.

Mas ¿Game change¿ confirma algumas histórias descritas em ¿Two faced racism¿ (¿Racismo de duas faces¿), outro lançamento editorial que está tirando o sono dos políticos americanos, dos sociólogos Joe Feagin e Leslie Picca, que descrevem o líder da maioria democrata no Senado, Harry Reid, como um dos mais racistas do Congresso e por isso já há políticos que querem retirá-lo do cargo de liderança:

¿ Apesar do discurso politicamente correto, os democratas falam grosso quando estão de portas fechadas ¿ avalia Feagin.

No que se refere a Hillary Clinton, a repercussão de ¿Game change¿ pode ser explosiva. Ela e o marido teriam jogado pesado para convencer o senador Ted Kennedy a não apoiar Obama. Bill teria dito que seria bom o senador pensar nas dificuldades de eleger um candidato negro: ¿Há apenas alguns anos, um cara como Obama estaria nos servindo cafezinho¿, teria dito Clinton.

Os frequentes casos extraconjugais de Bill Clinton também merecem um capítulo à parte em ¿Game change¿. Hillary, durante a campanha, teria nomeado um ¿comitê de guerra¿ para lidar com as traições do marido, caso elas viessem à tona. O tal comitê passou a investigar Clinton e confirmou vários romances extraconjugais do ex-presidente, sendo um deles uma relação duradoura com uma atriz canadense, eleita deputada em seu país, chamada Gina Gershon, que já estaria durando ¿pelo menos um ano¿. Os Clinton não fizeram comentários.

¿ Não recebemos queixas nem desmentidos até agora. Checamos as informações e respeitamos o anonimato quando foi pedido. Trabalhamos juntos na campanha e fizemos mais de 200 entrevistas enquanto a memória de todos os envolvidos ainda está fresca ¿ afirma John Haileman.