Título: Lula quer filtrar novas polêmicas sobre plano
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 15/01/2010, O País, p. 8

Planalto tenta diminuir desgaste político com grupo que analisará propostas controversas do programa de direitos humanos

BRASÍLIA. Após a crise com os militares, o governo já tem uma estratégia pronta para diminuir o desgaste político em torno de outras polêmicas envolvendo o Programa Nacional dos Direitos Humanos. O Palácio do Planalto pretende se valer do grupo de acompanhamento que vai analisar o programa para filtrar as propostas, fazer a mediação e, em alguns casos, até mesmo propor alterações.

De acordo com um ministro, a determinação do presidente Lula é de adequar o programa com a posição do governo em relação a alguns temas. Em outros casos, a ordem é de adiar o debate por tempo indeterminado. Neste primeiro momento, o Planalto quer ganhar tempo e esfriar o debate, para tirar a crise do noticiário. O grupo ficará encarregado de transformar essas propostas em políticas públicas.

- Esse grupo vai elaborar, inclusive, os projetos de lei. E nada será enviado ao Congresso que tenha posição divergente do governo - disse o ministro.

Na questão do aborto, por exemplo, vai prevalecer a posição do Planalto. Lula ficou contrariado com o fato de o programa ter incluído como intenção do governo apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto. Para ele, esse tema só deve ser tratado pelo governo como questão de saúde pública.

O tema motivou forte reação da Igreja Católica. Foi preciso enviar emissários do Planalto para tranquilizar o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Dimas Barbosa.

Além do aborto, assessores do Planalto argumentam que o governo não deve ter uma posição em defesa do projeto que estabelece a união civil de homossexuais. Sobre símbolos religiosos em repartições públicas, a avaliação do Planalto é que o assunto deveria ter sido ignorado no programa, pois criou um atrito desnecessário. O governo também deve enviar emissários para tentar tranquilizar o setor agrário e a mídia, que reagiram às propostas.

Após criticar o plano, semana passada, sob o argumento de que sua pasta não havia sido ouvida, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, decidiu trabalhar em silêncio para emplacar propostas do setor agrícola. Segundo seus assessores, a ideia não é levar um dossiê, mas sugestões "a título de contribuição".

Há questões, como a da soja geneticamente modificada, que já tinham sido decididas e não poderiam entrar novamente no programa. Também há insatisfação quanto a mudanças nas regras para desocupação de terras invadidas.

Ontem, auxiliares de Lula avaliaram que a crise com os militares está resolvida. Para o Planalto, interessa a criação da Comissão da Verdade para que as famílias dos desaparecidos durante a ditadura militar possam "enterrar os seus mortos e conhecer a história".