Título: Para Itamaraty, ajuda europeia é acanhada
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Fonte: O Globo, 15/01/2010, Mundo, p. 26

Países do continente pretendem doar US$4,3 milhões. EUA são o maior aliado na captação de recursos

BRASÍLIA. O Itamaraty considera baixo o valor de parte das doações anunciadas por países desenvolvidos para ajudar o Haiti. O assunto foi tratado ontem em reunião do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, com o secretário-geral do Itamaraty, Antônio Patriota, e diplomatas envolvidos na operação de socorro ao país caribenho devastado, na terça-feira, por um terremoto que atingiu 7 pontos na escala Richter.

A União Europeia aprovou a doação de 3 milhões de euros (cerca de US$4,3 milhões), enquanto o Canadá enviará US$5 milhões - apenas um terço dos US$15 milhões que o governo brasileiro pretende dar.

- Achamos que alguns países ricos poderiam ser mais generosos - disse um dos diplomatas que participaram do encontro, classificando de "um pouco acanhada" a doação da UE.

Já a oferta dos EUA, que anunciaram a doação de US$100 milhões, foi considerada "muito boa". Para o Itamaraty, está claro que o país, junto ao Brasil, lidera o esforço internacional de reconstrução haitiana.

Ao final do telefonema com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, anteontem, o presidente Barack Obama terminou a conversa falando "obrigado" em português. Para a diplomacia brasileira, a sintonia entre Washington e Brasília já havia ficado evidente no diálogo "muito caloroso" entre Amorim e a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, também anteontem.

Hillary passou a Amorim o telefone especial da unidade de respostas a terremotos do Departamento de Estado. Eles conversaram sobre a melhor forma de coordenar as operações no Haiti. Na mesma linha, Lula propôs a Obama a realização de uma reunião dos países doadores. O assunto foi tratado ontem em conversa telefônica entre Amorim e o chanceler do Canadá. O ministro brasileiro deverá falar hoje também com o chanceler australiano.

O esforço para arrecadar doações ao Haiti poderá contar com shows beneficentes do músico brasileiro Carlinhos Brown ao lado da cantora colombiana Shakira e do haitiano Wyclef Jean.

A iniciativa, tratada ainda como ideia preliminar, é realizar um ou dois shows nos EUA, provavelmente em Washington, e outro em Brasília. O assunto está sendo discutido pela Agência Brasileira de Cooperação, braço do Itamaraty para a ajuda internacional, com a agência correspondente americana. Ambas bancariam a infraestrutura, destinando o dinheiro dos ingressos para as vítimas do terremoto.

O governo brasileiro tem recebido ofertas de apoio material e humano. Os hospitais Albert Einstein e Sírio-Libanês, ambos de São Paulo, estão dispostos a ceder médicos para atuar em Porto Príncipe, assim como uma fabricante de bebidas, que poderia doar 90 mil garrafas de água mineral.

Quem procura o Itamaraty para fazer doações é orientado a esperar. A preocupação do governo é com a logística para assegurar a hospedagem e alimentação de profissionais que se deslocarem ao Haiti - o raciocínio vale para os médicos, por exemplo. Um diplomata da área de chancelaria foi enviado a Porto Príncipe para tratar desses problemas. Outros quatro chegaram ontem à embaixada brasileira em Santo Domingo, na República Dominicana, de daria suporte às ações no país vizinho.

Diplomatas querem mais poderes para Minustah

O Ministério das Relações Exteriores começa a discutir uma proposta de revisão do mandato das forças de segurança da ONU no Haiti, a Minustah. Suas atribuições, para os diplomatas brasileiros, devem ser ampliadas na reconstrução daquele país. Militares americanos já chegaram ao Haiti. A ideia é que atuem de forma coordenada com os capacetes azuis.

O Núcleo de Atendimento a Brasileiros do Itamaraty recebeu ontem mais de 500 telefonemas. A maior parte era de pessoas em busca de informações sobre familiares ou amigos que estavam no Haiti, no dia do terremoto. O Itamaraty divulgou que cerca de 30 civis brasileiros já foram localizados em Porto Príncipe e outras cidades haitianas. Segundo registros da embaixada local, o país atingido pelo terremoto teria 44 civis e 1.266 militares brasileiros.