Título: Tentar fazer Dilma parecer com Lula é ilusão
Autor: Fabrini, Fábio
Fonte: O Globo, 24/01/2010, O País, p. 8
Ex-companheiro de ministra na luta armada, petista, hoje no comando da campanha, defende que ela assuma fama de durona
BELO HORIZONTE. Ex-guerrilheiro que militou com Dilma Rousseff contra a ditadura militar e tem com ela uma ligação de 42 anos, o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel (PT) afirma que terá papel de destaque na coordenação da campanha da ministra à Presidência, mesmo que seja candidato ao governo de Minas Gerais.
Ele vincula sua candidatura ao Palácio da Liberdade a uma decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
E, a despeito disso, já trabalha na construção da candidata à Presidência que se apresentará ao eleitor. Para o petista, a Dilma que emergirá nas eleições presidenciais, a partir de julho (início oficial da campanha), deve ser como ela é, sem tentar esconder a fama de durona nem reproduzir a linguagem do presidente e sua forma de cativar o público.
¿ Isso de fazê-la parecida com Lula é ilusão. Ela não é operária, não passou fome e não nasceu no Nordeste. Nunca vai ser igual. Se for assim, vai soar falso ¿ avalia Pimentel, que tem se reunido semanalmente com Dilma e integra o ¿estado-maior¿ da campanha governista.
Assim é chamada a comissão provisória que traça a estratégia eleitoral. Além dele, participam do núcleo o ex-ministro Antônio Palocci; o chefe do Gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho; o presidente do PT, Ricardo Berzoini; e os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Franklin Martins (Comunicação Social).
Desempenho de Dilma foi testado por eleitores Com o marqueteiro João Santana ¿ que fez a campanha de Lula em 2006 e cuidará da imagem da candidata ¿, Dilma tem treinado a postura e o discurso.
Na visão de Pimentel, as origens e o temperamento da ministra não serão problema: o que falta é escolher temas mais populares para tratar publicamente, deixando de lado o tom técnico.
Foi ideia dele testar o desempenho de Dilma com eleitores, ainda em 2008. Um conjunto de entrevistas a programas de TV, dos tempos em que a ministra ainda não era pré-candidata, foi mostrado a 18 grupos país afora.
Em 12 minutos, a chefe da Casa Civil apresenta-se a seu modo: não só diz ser mineira de classe média, mas de classe média alta; explica que o pai era búlgaro; e acrescenta que foi educada nos melhores colégios de BH.
¿ Nada ajudava, mas o resultado foi positivo. Passou uma ideia de mulher verdadeira, de um político que não se faz de coitado para conseguir voto ¿ diz Pimentel.
N a s r e u niões, fala-se da agenda e dos temas a serem trabalhados na précampanha.
O ex-prefeito diz que a ministra é boa estrategista.
Segundo ele, veio de Dilma a sugestão de explorar a entrevista do presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, que disse que os tucanos acabariam com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e mudariam a política econômica. A reação de Dilma às críticas de Guerra detonaram uma crise entre os partidos esta semana.
¿ Aquilo foi uma bola bem colocada para chutarmos.
Em 1968, ano da publicação do Ato Institucional no5, Pimentel era um secundarista engajado no movimento estudantil quando conheceu Dilma. Estudava no Colégio Estadual Central, reduto de subversão à ditadura, por onde ela passara antes de iniciar o curso de economia na UFMG.
Eles militavam no Comando de Libertação Nacional (Colina), organização que aderira à luta armada.
O ex-ministro Nilmário Miranda (Direitos Humanos) se lembra da ascendência da ministra sobre os demais estudantes.
Com pouco mais 15 anos, ela era referência da Política Operária (Polop) no Estadual Central. Pimentel conviveu com ela mais tarde, já no Colina. Dilma estava casada com o primeiro marido, Cláudio Galeno Linhares, que viraria amigo do ex-prefeito e, décadas depois, seu assessor na Prefeitura de BH. O apartamento do casal era aberto a reuniões com militantes.
¿ Durante muito tempo, Dilma foi o contato de minha célula estudantil com a cúpula da organização.
Frequentei muito a casa dela e também a da mãe. O ambiente era de crescimento cultural, trocávamos livros e discutíamos ¿ diz Pimentel, acrescentando que Dilma se destacava pela capacidade intelectual e de liderança: ¿ Há 40 anos, o espaço da mulher era muito menor e ela já era chefe de uma organização.
Ela tinha uma capacidade de análise invulgar.
Aliança do PT com Aécio, em 2008, é criticada Com o desmantelamento do Colina pela repressão, Dilma e Pimentel fugiram para o Rio, no início de 1969. Em seguida, ele partiu para o Rio Grande do Sul, já na VPR, e ela, para São Paulo, na VAR-Palmares. Ambos foram presos no ano seguinte. Em 1972, a ministra foi solta. Proibida de continuar o curso na UFMG pelo Decreto 477, mudouse para o Rio Grande do Sul. O ex-prefeito foi solto no ano seguinte, cursou economia e cuidou dos negócios da família. Os dois se reencontraram em 2002, na coordenação da campanha de Lula à Presidência.
Libertado sob condicional, Pimentel manteve militância discreta até 1978. No início dos anos 80, fundou o PT em Minas.
¿ Em BH, fui fiador do aluguel da primeira sede do partido.
Até se candidatar a vice-prefeito da capital na chapa de Célio de Castro, em 2000, deu aulas na UFMG e foi secretário municipal de Fazenda. Assumiu a prefeitura dois anos depois, quando Célio (morto em 2008) adoeceu. Em 2004, reelegeu-se.
Apesar da militância histórica e da proximidade com Dilma, o ex-prefeito tem relação conflituosa com setores petistas e da base aliada. É apontado como um dos articuladores do chamado ¿Lulécio¿ em 2006, estratégia para que os mineiros votassem em Lula para presidente e Aécio Neves para governador.
Em 2008, a aliança com Aécio para eleger Marcio Lacerda (PSB) prefeito de BH estremeceu mais a relação com parte da militância.
O acordo favoreceu o racha no PT, que hoje se divide entre as pré-candidaturas de Pimentel e do ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Social).
¿ A composição política feita pelo Pimentel só dividiu o partido. Em nível nacional, o PSDB é oposição ao PT. Aliança com os tucanos não soma ¿ critica a prefeita de Betim, Maria do Carmo Lara.