Título: O Aedes está de volta
Autor: Galdo, Rafael ; Costa, Célia
Fonte: O Globo, 23/01/2010, Rio, p. 12

Infestação do transmissor da dengue é 3 vezes acima do tolerável; prefeitura entra em alerta

Omosquito Aedes aegypti parece estar ganhando a guerra no Rio. Os índices de infestação predial na cidade continuam altos e, segundo especialistas, como o entomologista Rafael Freitas, da Fiocruz, o número de vítimas da dengue só não é grande porque a maioria da população já teve a doença e está imune aos três vírus que circulam no país. Conforme o último Levantamento do Índice de Infestação Rápido pelo Aedes aegypti (LIRAa), realizado em outubro do ano passado, a média do Rio é 2,9%, quase três vezes o tolerável pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é 1%.

Existem pontos na cidade onde a situação é ainda pior. Na Área Programática (AP) 3.1, que compreende os bairros de Penha, Ilha do Governador e Ramos, o índice é 5,2%. Os dois bairros com maior infestação têm realidades distintas. Santo Cristo, bairro degradado e com áreas abandonadas, tem 9,5%. Mesmo índice apresenta a Lagoa, região nobre, mas com problemas como água empoçada em áreas públicas, como o Parque do Cantagalo. Ainda não há um levantamento dos índices do verão, mas a preocupação é com o grande volume de chuvas e as altas temperaturas, condições favoráveis à proliferação do mosquito da dengue.

Agentes vistoriaram 45 mil imóveis

O secretário municipal de Saúde, Hans Dohmann, disse que os índices de outubro dispararam o sinal de alerta para o verão, quando o número de casos da doença aumenta. Nas duas primeiras semanas de janeiro, foram registrados 13 casos de dengue, enquanto no mesmo período do ano passado 326 pessoas foram infectadas.

Dohmann atribui a redução à intensificação do combate aos focos. Para o secretário, o fato de que a maioria da população já teve contato com um dos vírus da dengue não é motivo para descanso: ¿ Ainda não se sabe o peso que isso tem na redução do número de casos. Mas este é um período que serve para intensificar o combate aos focos.

Segundo o entomologista Rafael Freitas, o LIRAa é uma tentativa de descobrir a quantidade de mosquitos numa determinada área, mas não é um retrato fiel da situação.

¿ Não há agentes suficientes para ir a cada casa. É apenas uma amostragem e serve somente como um alerta ¿ disse Freitas.

Três mutirões de combate à dengue, de acordo com o secretário de Saúde, foram feitos recentemente na região da Penha e na do Maracanã.

Nas últimas semanas, foram visitados 45 mil imóveis e 40 toneladas de lixo foram removidas. Os agentes detectaram 15 mil focos do Aedes aegypti.

Uma das dificuldades era entrar em favelas ou áreas dominadas por grupos armados. Esse quadro, segundo Dohmann, começou a ser mudado com a fixação dos agentes em comunidades. A redução do número de pendências ¿ casos em que os funcionários da prefeitura não conseguem entrar nos imóveis ¿ foi grande.

De acordo com Dohmann, cem mil imóveis que estavam pendentes foram visitados em toda a cidade.

Na Lagoa, bairro com maior índice de infestação na Zona Sul, é com desconfiança que moradores passam pela ciclovia na altura do Parque do Cantagalo. Eles temem que as grandes poças d¿água perto das quadras esportivas sirvam de criadouro do mosquito. A dentista Sandra de Carvalho Zamagna lembra que os alagamentos são constantes na área e que, apesar das queixas, não foram tomadas providências para eliminá-los.

¿ Chove, enche tudo, e essas poças persistem por muitos dias, mesmo com sol. É um desrespeito com as pessoas que vêm aqui. Além do descaso, representa um enorme risco de proliferação do Aedes aegypti e de outros mosquitos ¿ afirma Sandra.

Em Botafogo, área que na epidemia de 2008 teve o segundo maior número de casos da doença na Zona Sul (a primeira foi a Rocinha), moradores da Rua da Matriz apontam as obras paradas de construção de um prédio no número 85 como o grande vilão do combate à dengue na região. No local, a água da chuva fica acumulada numa laje inacabada.

Vizinha da construção, a corretora de seguros Conceição Mendonça diz que no verão, quando o perigo de contrair dengue é maior, passa o dia com repelente no corpo e com aparelhos para matar mosquitos ligados.

Mesmo assim, conta que é difícil escapar das picadas.

¿ Acontece uma invasão de mosquitos na minha casa. O maior medo é da dengue. E temos certeza de que o foco dos insetos é essa obra ¿ afirma ela, lembrando que há dois colégios, um deles da prefeitura, perto da obra.

Já na Zona Norte, em outra área campeã de infestação, a Penha, não é raro encontrar pneus abandonados perto do Mercado São Sebastião.

Em bairros como esse, onde há muitas favelas, costuma ser mais complicado e escasso o combate ao mosquito da dengue. Apesar disso, ressalta a dona de casa Roseli Duque de Oliveira, moradora do conjunto IAPI da Penha, depois das epidemias dos últimos anos, os vizinhos e ela estão mais atentos a focos: ¿ Tenho muitas plantas em casa e nunca deixo água nos pratinhos. Vasculho minha casa em busca de água parada. E percebo mais cuidado da população para evitar a dengue.

O Telessaúde (3523-4025) estará voltado agora, a princípio, para denúncias de focos de dengue e para a solicitação de visitas dos agentes de saúde. O atendimento contará com a atuação de dois enfermeiros epidemiologistas, treinados para ajudar na triagem das ligações.