Título: Esta década será menos fácil para as forças progressistas
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 25/01/2010, O País, p. 4

Um dos principais nomes do FSM, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos desembarca sem otimismo, e diz: a próxima década será difícil para movimentos sociais e governos progressistas.

O GLOBO: Afinal, qual foi o resultado de uma década de FSM? BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS: O FSM teve um impacto superior ao que se imaginava. Em vários níveis: o fórum ajudou a construir uma consciência mundial dos movimentos sociais, mostrando que os partidos não são a única via. Foi na América Latina o seu maior impacto. O protagonismo dos movimentos produziu as transformações políticas. O FSM mudou o discurso e até um a prática do Fórum Econômico Mundial (FEM). Foi uma década da qual devemos nos orgulhar.

Como o senhor analisa a relação Lula e FSM? BOAVENTURA: Lula esteve sempre no FSM. Além de liderar um partido, ele era um homem com uma história fundamentada dentro do movimento social. E essa presença de um político que construiu seu nome no movimento foi muito importante para o Fórum e tenho certeza de que o Fórum ajudou Lula a ter a imagem internacional focada em um mundo melhor.

Qual é a perspectiva que o senhor levará ao FSM? BOAVENTURA: Esta década que estamos entrando será menos fácil para as forças progressistas do que foi a década anterior.

Porque os ganhos que, por via democrática, os partidos e movimentos de esquerda conseguiram causam incômodo ao capitalismo global. Esses governos e os movimentos que têm por trás deles têm assumido posições mais nacionalistas. E isso causa uma reação. A América Latina é uma zona de influência dos Estados Unidos. Na década que acaba de terminar, a ação do imperialismo aqui foi muito débil. Acontece que isto está mudando. (Barack) Obama deve fazer um redirecionamento para a América Latina. Estou temeroso.

Mas há indícios dessa inquietude ou dessas estratégias americanas? BOAVENTURA: Uma das coisas que mais me preocupa é o crescimento do paramilitarismo.

Eles não estão presentes apenas na Colômbia, mas na Bolívia, Equador e Venezuela. O FSM tem que tirar uma posição forte e estruturada em defesa da democracia e dos movimentos sociais.

Qual é a análise que o senhor faz do governo do presidente Lula? BOAVENTURA: Ele é a orientação mais progressista para o Brasil. Acho que tem feito uma boa política externa. Mas tem havido muita violência no campo, muita insensibilidade ambiental. Lula não tem sido sensível, nesta parte final de seu mandato, a essas questões. Talvez esteja mais preocupado com a eleição, com as alianças.