Título: Barbas de molho
Autor: Feuerwerker, Alon
Fonte: Correio Braziliense, 03/06/2009, Política, p. 4

Percebeu-se no PSDB que os tucanos não podem se dar ao luxo de desperdiçar substância na operação política de somar as forças paulistas e mineiras.

Os bons números do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o otimismo já projetado para o desempenho da ministra Dilma Rousseff na corrida presidencial dão argumentos a quem deseja adiar a escolha do candidato do PSDB à Presidência da República. O período recente registrou alguns movimentos, especialmente no Democratas, em favor de antecipar a decisão, contra o que resistiu principalmente o governador Aécio Neves. Agora, com Lula novamente em alta e Dilma subindo a ladeira, talvez seja mesmo hora de a oposição colocar as barbas de molho.

A tese do ¿candidato já¿ supõe que no dia seguinte à coroação ele estará vitaminado para sair pelo país recolhendo apoios, costurando alianças e falando mal do governo. Em teoria, o nome indicado agora emergiria da escolha mais forte, pronto a preencher o vácuo político que hoje suga para cima a candidatura do Planalto. Em teoria.

Na prática, pode acontecer o contrário. É possível que no day after o finalmente candidato se visse sozinho na estrada. Pronto a virar alvo combinado do governismo e do fogo amigo. Abandonado à própria sorte, enquanto os supostamente aliados e também o preterido estariam livres para, nos bastidores, explicarem aos jornalistas, em ¿off¿, por que tudo está dando errado. E, pior, sem que o ungido soubesse exatamente o que dizer. Em público ou em particular. A situação não chegaria a ser propriamente uma novidade.

O desafio colocado ao PSDB não é trivial. Os tucanos que aceitam conversar sem rodeios admitem o gigantismo da tarefa de derrotar um Lula tão musculoso. Publicamente, criticam a valorização excessiva do empate técnico (na pesquisa Sensus) entre Dilma e o governador José Serra em intenções espontâneas de voto. No particular, revelam estar impressionados, já que Serra vem de três eleições de repercussão nacional enquanto Dilma nunca foi candidata nem a vereadora.

Há mais um detalhe que deu força nas últimas horas à ala cautelosa. Percebeu-se no PSDB que os tucanos não podem se dar ao luxo de desperdiçar substância na operação política de somar as forças paulistas e mineiras. José Serra bate Dilma de longe em São Paulo. Aécio tem desempenho melhor ainda contra a ministra em Minas Gerais. O ideal será que a saída de um implique transferência total de intenções de voto para o outro, como aconteceu, por exemplo, no segundo turno da eleição presidencial de 1989, de Leonel Brizola para Lula. Mas isso não costuma ser automático.

Assim, numa dessas reviravoltas costumeiras da política, alguns serristas passaram a considerar a pré-candidatura Aécio uma barreira para conter o crescimento de Dilma. Em outras palavras, com Aécio fora do páreo, é possível que uma gorda parte de seus votos em Minas migrasse para a candidata de Lula. Até porque a atratividade eleitoral do presidente da República entre os eleitores mineiros é conhecida, tendo funcionado bem em 2002 e 2006.

O aecismo também sentiu a mudança no vento. O discurso agora é que será mais fácil convencer o eleitor de Serra a migrar para Aécio do que o contrário. Por quê? Porque se em Minas Lula pode seduzir o voto não propriamente petista, em São Paulo esse efeito seria praticamente irrelevante, dada a sedimentação do isolamento do PT bandeirante.

Numa coisa porém aecistas e serristas parecem estar de acordo. A chance de derrotarem Lula parte, antes de tudo, da preservação do capital político em seus respectivos estados. E o Planalto sabe disso, decorrendo daí a intensa movimentação para construir anabolizadas alianças antitucanas nas duas maiores unidades da federação.