Título: Obama deve congelar gastos para conter o déficit
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 27/01/2010, Economia, p. 21

Anúncio está previsto para hoje. Medida valeria por 3 anos e evitaria despesas de US$250 bi até 2020

WASHINGTON. Pressionado por políticos democratas conservadores e independentes, o presidente dos EUA, Barack Obama, fará da redução do déficit público o ponto central de seu discurso anual sobre o Estado da Nação, previsto para hoje no Capitólio. Os parlamentares temem que o Orçamento público esteja escapando do controle da Casa Branca e que o aumento do déficit possa forçar o país a pagar juros ainda mais altos para captar dinheiro com seus papéis, elevando uma dívida pública já bastante alta.

Obama deverá anunciar o congelamento, por três anos, dos gastos públicos a partir de outubro ¿ relativos ao Orçamento de 2011 ¿, com exceção das despesas nas áreas de defesa, previdência para veteranos de guerra, segurança nacional e alguns programas internacionais. Segundo assessores do presidente, esse congelamento evitará gastos adicionais de cerca de US$15 bilhões este ano e US$250 bilhões até 2020. Mas a medida provocou a ira de muitos democratas, que não veem problema na imagem de um Estado grande num momento de emergência econômica e temem cortes em programas sociais do governo, como a própria reforma no sistema de saúde, projeto que se arrasta há quase um ano no Congresso.

O discurso ocorre um dia após o Escritório do Orçamento do Congresso, uma organização bipartidária que estuda as contas públicas dos EUA, ter dito que os gastos de emergência efetuados pelo governo para combater a recessão, aliados à fragilidade da própria economia, farão com que déficit público dos EUA chegue a US$1,3 trilhão este ano. Trata-se de um rombo abaixo do previsto inicialmente, mas ainda assim, representa o maior déficit público dos EUA desde o fim da Segunda Guerra Mundial. A estimativa da dívida federal em 2009 é de US$12,867 trilhões (90,4% do PIB).

Também ontem, o Senado americano rejeitou a proposta de Obama de criar uma força-tarefa bipartidária para atacar o déficit fiscal. O grupo seria responsável por elaborar um plano combinando cortes de impostos e de gastos. A proposta teve 53 votos dos 60 necessários.

Em entrevista por telefone, Rob Nabors, vice-diretor do Escritório de Administração e Orçamento da Casa Branca, admitiu que o congelamento afetará os planos do governo:

¿ Os objetivos do presidente de fato não mudaram ¿ disse Nabors. ¿ Mas algumas áreas, sobre as quais prometemos fazer algo em quatro, cinco anos, verão os resultados dos nossos esforços num prazo mais longo de seis ou sete anos agora. O que vamos fazer é reduzir o crescimento de alguns desses programas enquanto eliminamos outros que não são prioridades.

O presidente Barack Obama completou na semana passada um ano no comando dos EUA com índices de popularidade cada vez mais baixos devido à percepção de que a retomada econômica ocorre de forma mais lenta que o desejado, as taxas de desemprego permanecem acima de 10%, a polarização partidária aumentou ¿ com os republicanos preocupados apenas em barrar no Capitólio qualquer projeto da Casa Branca ¿ e a população parece pessimista sobre as prometidas reformas no sistema de saúde e bancário que não saíram do papel. Sem contar duas guerras, uma delas no Afeganistão, que já dura oito anos.

Os republicanos, que semana passada conseguiram uma cadeira no Senado ¿ dificultando ainda mais a vida de Obama na Casa ¿ foram rápidos para debochar da proposta presidencial:

¿ Dada a fúria gastadora sem precedente dos democratas, esse anúncio é como se você dissesse que vai fazer uma dieta depois de ganhar um concurso de quem come mais tortas ¿ afirmou Michael Steel, porta-voz do líder republicano na Câmara dos Representantes, John A. Boehner.

O congelamento de gastos vai representar apenas um oitavo do orçamento americano de US$3,5 trilhões, com o grosso dos gastos referentes a programas de previdência e saúde. O congelamento não afeta o pacote de recuperação econômica de US$787 bilhões nem as medidas anunciadas anteontem para reduzir a pressão dos gastos da classe média do país