Título: O ano do Brasil na Bolsa
Autor: Schreiber, Mariana ; Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 31/12/2009, Economia, p. 19

Bovespa sobe 142% em dólar e lidera ganhos no mundo. Real tem maior alta global: 33,9%

O ano de 2009 se encerra hoje revelando o vigor da recuperação do mercado financeiro nos países emergentes, com destaque para o Brasil. Considerando a variação do dólar, a bolsa brasileira, medida pelo Índice Bovespa (Ibovespa), acumulou rentabilidade de 142,70% no período, a maior valorização entre as 13 principais bolsas do mundo, segundo dados da Bloomberg.

Isso significa que a bolsa brasileira recuperou US$ 738 bilhões do seu valor de mercado, de US$ 588 bilhões no fim de 2008, chegando ao US$ 1,326 trilhão atual. Entre os fatores que ajudaram a Bovespa a se recuperar mais rapidamente, estiveram o fato de o país ter sofrido menos com a crise ¿ ajudado por seu mercado interno ¿ e a nova alta das matériasprimas em 2009, puxada pela volta da China às compras.

Outro fator que ajudou o desempenho da bolsa brasileira a superar o das suas concorrentes estrangeiras em dólar foi a própria valorização do real no ano, de 33,91%, sendo a moeda que mais se valorizou no mundo no período.

Na sequência, vieram o dólar australiano (27,38%), o peso chileno (25,78%), o dólar neozelandês (24,63%) e o dólar canadense (15,64%). Em comum entre essas economias, está o fato de suas moedas serem fortemente correlacionadas a matérias-primas. Ou seja, conforme os preços de aço, petróleo e metais sobem, essas divisas também se valorizam, já que estes países são grandes exportadores destes produtos.

Segundo a consultoria Economatica, que acompanha a variação do dólar desde 1965, a queda acumulada de 25,32% do dólar em relação ao real este ano foi a maior na história. E supera a de 2003, primeiro ano em que a moeda americana recuou na comparação com o real, cedendo 18,23%. Desde então, o dólar recuou em todos os anos, com exceção de 2008, quando a crise financeira mundial elevou a procura por dólares, investimento considerado mais seguro. Naquele período, a divisa subiu 31,94% frente ao real. Apesar disso, o dólar acumula desvalorização de 50,7% no governo Lula.

No campo das ações, logo após a bolsa brasileira, a Rússia foi a que teve melhor desempenho, com rentabilidade de 126,51% no ano. Por causa disso, 2009 deverá ser lembrado como o ano de confirmação da importância dos países conhecidos pela sigla Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). A sigla foi criada em 2001 pelo economista do Goldman Sachs, Jim O¿Neill, para designar o grupo de emergentes que tenderia a ganhar força na economia.

Os quatro países ocuparam as quatro primeiras posições no ranking de desempenho das bolsas de todo o mundo em 2009. Já a Bolsa de Nova York, com o índice Dow Jones, ficou quase na lanterna, com apenas 20,06%.

¿ A grande maioria dos países teve quatro trimestres de PIB (conjunto de bens e serviços produzidos) em queda, enquanto nós tivemos apenas dois, o último de 2008 e o primeiro de 2009.

O nosso setor financeiro não foi pego como o de outros países. É normal termos essa recuperação agora ¿ diz o economista-chefe da corretora Ágora, Álvaro Bandeira.

Para a Economatica, a valorização do Ibovespa em dólar foi a terceira maior da história da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Os 142,70% de 2009 só perdem para os 287,89% de 1991 e para os 151,06% de 1988. Já a alta do Ibovespa em reais, de 82,66%, foi a segunda maior do governo Lula, só perdendo para os 97,34% de 2003.

Álvaro Bandeira, da Ágora, diz que a alta da bolsa em 2009 não foi uma bolha ¿de jeito nenhum¿. Ela tem consistência e a Bolsa pode atingir novos recordes de pontuação no ano que vem. Para ele, o Ibovespa pode chegar a 82 mil pontos no fim de 2010, um ganho de 19,55% em relação aos 68.588 pontos do fim de 2009.

Já para o professor da PUC-SP Antônio Corrêa de Lacerda, o processo de valorização da bolsa brasileira ¿foi exagerado¿: ¿ A bolsa sinaliza aumento na confiança da economia brasileira. Porém, isso foi exagerado. Não deixa de ser uma bolha, pois o Brasil tem sido alvo de recursos e especulação.

Alta das papéis revela confiança

No entanto, especialistas dizem que a alta da Bolsa tende a antecipar movimentos da economia real. Assim, a alta de 2009 pode ser uma previsão de bons lucros em 2010, quando muitos economistas projetam expansão da economia acima de 5%. Para Gilberto Braga, professor de Finanças do Ibmec, o ritmo intenso da bolsa nesse ano sinaliza, sim, uma maior confiança na economia brasileira.

¿ Há uma confiança de que as empresas brasileiras se favorecerão do processo de retomada.

No último pregão do ano, o Ibovespa subiu 0,43%. Em dezembro, o índice avançou 2,30%. Já o dólar comercial fechou estável, a R$ 1,743, acumulando desvalorização de 25,32% no ano. Em dezembro, a divisa cedeu 0,80%.

O fluxo cambial (diferença entre a entrada e a saída de dólares na economia) em dezembro foi positivo em US$ 2,152 bilhões até o dia 24, informou ontem o Banco Central (BC). O câmbio financeiro, que abrange operações com capitais (investimentos em bolsa e empréstimos) e serviços (turismo, juros, remessa de lucros) teve saldo de US$ 3,362 bilhões, diferença entre compras de US$ 33,120 bilhões e de vendas de US$ 29,758 bilhões.

Na parte comercial, há um saldo negativo de US$ 1,211 bilhão no mês.

Isso corresponde à diferença entre US$ 12,501 bilhões em importações e US$ 11,290 bilhões em exportações.

No ano, há um saldo de US$ 28,898 bilhões graças, sobretudo, à conta comercial, de US$ 9,848 bilhões, e à movimentação financeira de US$ 19,050 bilhões. Segundo o BC, a compra de dólares no mercado à vista elevou as reservas internacionais em US$ 2,927 bilhões, contribuindo para um estoque de US$ 238,735 bilhões.