Título: Lula sob alta pressão
Autor: Camarotti, Gerson ; Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 29/01/2010, O País, p. 3

A caminho de Davos, presidente passa mal, é internado às pressas e obrigado a cancelar agenda

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou mal em sua visita a Pernambuco anteontem e precisou ser internado às pressas na madrugada de ontem no Real Hospital Português, em Recife. O médico da Presidência, Cleber Ferreira, confirmou que ele sofreu uma ¿crise de hipertensão¿ esporádica, provavelmente provocada pelo estresse e cansaço. Depois de uma gripe mal curada, exames realizados no hospital indicaram que ele apresenta, também, princípio de infecção respiratória. Por isso, além de diuréticos para reduzir a pressão, Lula deverá passar cinco dias tomando antibióticos.

O presidente deixou o hospital por volta das 6h. De lá, foi para seu apartamento em São Bernardo do Campo, onde fica de repouso até domingo, voltando depois a Brasília.

Durante todo o dia de anteontem, Lula deu sinais públicos de cansaço.

Foi visto com a mão sobre o peito e teria se queixado de dores no tórax.

Em público, reclamou de dor na garganta.

Lula passou mal novamente quando já estava no avião que o levaria à Suíça, rumo ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, onde receberia o título de Estadista Global 2009. No avião, o médico mediu sua pressão e aconselhou-o a desistir da viagem: ¿ Eu tirei o presidente do avião.

Achei que ele não deveria viajar. Foi por ordem médica que ele não viajou.

Até o último momento, ele queria viajar.

Eu disse, não, presidente, vamos para casa ¿ contou Cléber Ferreira.

Segundo o médico, Lula tem uma pressão invejável para seus 64 anos ¿ normalmente dez por oito ¿ e não é hipertenso.

O Real Hospital Português é um dos melhores de Recife, e conta com equipamentos sofisticados para diagnóstico precoce de várias doenças, inclusive câncer. O presidente foi levado por volta de 0h45m (horário de Brasília), em cadeira de rodas. Durante duas horas, não houve informação oficial sobre seu estado. Às 2h45m (1h45m em Recife), a imprensa teve informações.

Lula cumprira uma maratona de compromissos por nove horas em Recife. Na inauguração de uma unidade de pronto-atendimento da Secretaria de Saúde, disse: ¿ Estou com a garganta não muito boa, e não queria ser o primeiro paciente da UPA ¿ brincou. ¿ Ela está tão organizada, que dá até vontade de ficar doente, para ser atendido

Um dia inteiro de mal-estar

Depois da UPA, em Paulista ¿ a 20 quilômetros da capital ¿, Lula foi ao Palácio do Campo das Princesas, trocou de roupa e compareceu a uma cerimônia pelo Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. Retornou ao palácio para jantar. Durante todo o dia, segundo o médico, afirmou que não estava se sentindo bem.

¿ Durante o dia sua pressão foi monitorada, mas estava boa. No avião, com as portas fechadas, a gente detectou crise hipertensiva, pressão de dezoito por doze. Optou-se então pelo consenso de suspender a viagem.

Precisávamos ver as condições reais dele, e graças a Deus, (a pressão) está controlada. Agora ela se normaliza. O presidente não teve dor no peito ¿ afirmou Ferreira, que lembrou que Lula estava se curando de uma gripe.

Talvez por isso o presidente tenha apresentado início de infecção respiratória, informação transmitida informalmente ontem pelo médico Sérgio Montenegro, do Hospital Português.

Ele disse que Lula tomou antibióticos e fez exames: ecocardiograma, eletrocardiograma, radiografia do tórax, tomografia e exames de laboratório.

O médico Cléber Ferreira assegurou que os resultados foram bons. E atribuiu a hipertensão ao cansaço.

¿ Em crises hipertensivas, se o paciente reagir bem, pode voltar ao trabalho.

Ele teve um dia atípico e provavelmente vinha de alguma coisa que desencadeou a crise hipertensiva: o estresse, o cansaço, e ele estava com um pouquinho de coriza, de uma gripe já debelada. São fatores que se associam à crise hipertensiva.

No hospital, o presidente teve companhia da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha.

Deixou o hospital às 6h. Na saída, tinha o semblante abatido, e acenou para os repórteres. Com o susto, Lula foi obrigado a cancelar os compromissos até domingo ¿ Davos (Suíça), Salvador e São Bernardo. Por orientação médica, auxiliares de Lula tentarão conciliar uma rotina mais saudável com a agenda do ano eleitoral e do PAC. Todos sabem que dificilmente ele aceitará a restrição da agenda.

A preocupação com o ritmo acelerado do presidente cresceu com a proximidade da campanha e da estratégia dele de dar visibilidade política à ministra Dilma Rousseff. A determinação no governo é deixar transparecer normalidade, mas a internação pegou de surpresa o primeiro escalão.

¿ A população pode ficar tranquila, o presidente está bem. Foi uma pequena crise hipertensiva. Segunda-feira, se não for antes, ele vai estar pronto já andando por aí ¿ disse Dilma.

Segundo Dilma e Padilha, Lula acordou por volta de 5h30m, chamou os dois e Franklin Martins e disse que tinha recebido alta e poderiam ir embora.

Apreciou Recife do alto ¿ estava no 13oandar ¿, comentou como a cidade crescera e falou com médicos e funcionários sobre obras do PAC.

¿ Ele acordou todo mundo: ¿Vamos embora, tive alta¿. Ele levou todos para a base aérea e despachou o discurso que faria em Davos ¿ contou Padilha, que é médico.

Dilma sugeriu que os compromissos sejam intercalados ¿ uma semana mais leve e outra mais pesada.

¿ São um esforço enorme. Quem acompanha o presidente e teve agenda com ele sabe. A gente chamava de rali Paris-Dakar, porque tem dia em que não para nem para almoçar