Título: China: salvadora e algoz
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Fonte: O Globo, 29/01/2010, Economia, p. 23

País asiático garante compras, mas toma mercado brasileiro BRASÍLIA e RIO. Do total exportado para a China ¿ país que, em 2009, se tornou o principal parceiro comercial do Brasil ¿ 76,8% são produtos básicos e apenas 23,2% são industrializados, ou seja, bens de maior valor agregado. Na contramão, 98,4% dos itens importados do país asiático são manufaturados, segundo levantamento do Ministério do Desenvolvimento (MDIC). Outra constatação preocupante é que a participação das vendas brasileiras no total importado pelos chineses é de apenas 1%.

Na equação que mostra o intercâmbio comercial, há uma relação perversa: o Brasil envia matérias-primas para a China e os chineses beneficiam os produtos e os devolvem ao mercado nacional como bens industrializados, gerando riqueza e empregos no país asiático.

¿ Indiretamente, estamos fortalecendo nosso concorrente, dando condições para que o país possa crescer ainda mais ¿ avaliou o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.

Para alterar essa equação, o governo pretende criar uma política mais agressiva e ganhar espaço no mercado chinês. Os técnicos do MDIC acreditam que o Brasil pode aumentar substancialmente as exportações de itens como autopeças, petróleo e combustíveis, produtos siderúrgicos, motores de veículos, preparados alimentícios, fertilizantes e aviões. Para isso, a tarefa mais importante será a de promoção comercial.

¿ Sem uma política de médio e longo prazos, aproveitando os ganhos com as commodities, vamos eternizar aquilo que é nossa maldição: somos fornecedores de produtos básicos para o mundo ¿ afirmou o economista Fábio Silveira, da RC Consultores.

No ano passado, o Brasil exportou US$ 20,191 bilhões para a China e importou, daquele país US$ 15,9 bilhões.

O superávit de quase US$ 3,4 bilhões ocorreu após dois anos seguidos de déficits comerciais. Minérios, óleos brutos de petróleo e soja em grão lideraram as vendas para aquele mercado.

O diretor-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luís Afonso Lima, destacou que a China é um grande demandante. No entanto, observou Lima, não se pode esquecer que os chineses estão tomando espaço das empresas brasileiras em manufaturas na América Latina: ¿ A China tem a vantagem de ter um câmbio com flutuação suja (é na prática controlado), nisso não podemos competir. Mas poderíamos ter feito o dever de casa, para ganharmos mais competitividade na região.

Ele lembrou que, em 2010, com o enfraquecimento das economias americana e europeia, a China deve ganhar ainda mais importância para os exportadores brasileiros.

Como consequência, os produtos básicos manterão sua importância na pauta. (Eliane Oliveira e Henrique Gomes Batista).