Título: Dieta de alto risco
Autor: Vianna, Maria ; Marinho, Antônio
Fonte: O Globo, 31/01/2010, Saúde, p. 33

Médicos alertam para perigos de remédios e suplementos para emagrecer, que podem causar sérios danos ao organismo

MULHERES OBESAS: a epidemia de obesidade é um problema mundial, mas cresce a preocupação com o uso inadequado de remédios e outros tratamentos para perder peso depressa

Emagrecer com medicamentos tem se mostrado cada vez mais arriscado. Esta semana, autoridades de saúde alertaram sobre os possíveis efeitos nocivos da sibutramina, popular droga para perder peso. A Agência Europeia de Medicamentos (Emea) recomendou que os médicos deixem de receitar o remédio. Outra pílula antiobesidade, o rimonabanto, teve a venda proibida em 2008. Isso porque essas fórmulas ofereceriam mais riscos do que benefícios. A última dobrava a chance de depressão, e a sibutramina pode causar infarto. Segundo médicos, é possível ficar no peso saudável sem drogas. A pressão para entrar em forma rapidamente é que atrapalha. Pesquisa internacional inédita revelou que o Brasil é um dos países em que as pessoas se sentem mais pressionadas a emagrecer. Embora não haja qualquer dúvida de que é preciso combater a epidemia de obesidade, especialistas advertem que isso precisa ser feito com cuidado e paciência.

A busca pela perda de peso rápida ¿ e muitas vezes, exagerada ¿ é tão grave que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) restringiu a prescrição e a venda dos anorexígenos (moderadores de apetite derivados de anfetaminas). O Brasil consome 60% das anfetaminas no mundo. E pesquisa em 16 países, feita pela Synovate para a Seleções (Readers Digest), mostrou que 77% dos homens e 89% das mulheres brasileiros se sentem obrigados a perder quilos. E 83% acham que se dá ênfase demais à essa questão, contra 68% dos indianos e 62% dos americanos, em segundo e terceiro lugar, respectivamente. Na metade dos países, os entrevistados já tentaram perder peso pelo menos uma vez. No Brasil o percentual de respostas positivas alcançou 71%.

Esse comportamento, associado à automedicação e a procura por tratamentos com profissionais inexperientes, aumenta o perigo. Esta semana, a jornalista Lanusse Martins, de 27 anos, morreu durante lipoaspiração numa clínica particular em Brasília. Nos últimos anos, ocorreram numerosos outros casos semelhantes no país.

Para Ricardo Meirelles, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), criou-se um padrão de beleza que leva a uma expectativa irreal, e há pessoas que atingem peso abaixo do mínimo saudável do índice de massa corporal (IMC), que varia de 18,5 e 24,9 kg/m².

¿ Muitas se submetem a dietas sem embasamento científico e inadequadas, além de tomarem fórmulas manipuladas com substâncias perigosas ¿ diz Meirelles.

No Brasil, a Anvisa acompanhou o órgão que controla drogas e alimentos nos Estados Unidos (a FDA), dando mais ênfase que não se prescreva sibutramina nos casos de doença coronariana, insuficiência cardíaca, hipertensão arterial, doença vascular periférica, derrames ou isquemia transitória e arritmias cardíacas.

Na opinião de Meirelles, as opções de remédios de auxílio ao emagrecimento já são poucas, e incluem anorexígenos (dietilpropiona, fenproporex e mazindol), drogas de controle da saciedade (sibutramina) e inibidores da absorção intestinal de gorduras (orlistat). Essas drogas devem ser usadas em pacientes com IMC acima de 30 kg/m² ou naqueles com IMC entre 25 e 30 kg/m², mas com doenças como diabetes, colesterol e triglicerídeos altos.

O endocrinologista Alfredo Halpern, professor da faculdade de medicina da USP, diz que há estudos de longa data comprovando a eficácia e segurança da sibutramina, porém não serve para todos:

¿ Sou contra a suspensão da droga. A decisão na Europa causou polêmica, sem dúvida, mas acho que foi mais uma medida de proteção.

Medicamentos são para poucos

Já o endocrinologista Josivam de Lima, da Sbem, explica que o último estudo com a sibutramina envolveu pessoas com problemas cardiovasculares. Isso não quer dizer que ela não seja útil para outras, como, por exemplo, mulheres na faixa dos 20 anos, que precisam emagrecer para preservar seu sistema reprodutivo.

E Lima alerta que a sibutramina não é indicada para quem precisa emagrecer muito, porque se perde no 10% do peso, o suficiente apenas para responder melhor a dietas e exercícios:

¿ A vantagem da sibutramina é que ela não reduz o apetite, apenas aumenta a saciedade. Nos consultórios, 20% das mulheres que pedem remédios para emagrecer têm IMC normal.

O que ainda continua valendo no tratamento é a orientação dietética e a prática de exercícios, diz Meirelles. Mas a mudança de hábitos geralmente é difícil; daí o frequente insucesso. No controle do peso é preciso avaliar também a existência de outras doenças que possam causar o excesso, como alterações das glândulas tireoide e das suprarenais:

¿ Nem todas as pessoas com excesso de peso têm alterações metabólicas, como diabetes ou dislipidemia. A localização do acúmulo de gordura é importante, sendo a parte acumulada no interior da cavidade abdominal, junto às vísceras, a mais prejudicial, porque é facilmente metabolizada e lança na circulação grande quantidade de ácidos graxos.