Título: Pedra no sapato da supertele
Autor: Rosa, Bruno; Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 16/01/2010, Economia, p. 19
Oi suspende processo de incorporação de ações da BrT, que despencaram na Bolsa
Quase dois anos após fazer a oferta de compra pela Brasil Telecom (BrT), a Oi (ex-Telemar) suspendeu o processo que unificaria todas as ações das empresas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Essa operação societária é um dos passos essenciais para consolidar a criação da supertele nacional. Na noite de quinta-feira, às vésperas de entrar na fase final da incorporação dos papéis, a Oi informou que o total das despesas provisionadas relativas a 103 mil processos judiciais de clientes contra a BrT mais que dobrou. A provisão de perdas, de acordo com o fato relevante da Oi, passou de R$1,245 bilhão para R$2,535 bilhões. A mudança prejudica o acionista minoritário da BrT, pois a relação de troca das ações foi cancelada, sem data para ser redefinida.
Já os ex- controladores da BrT - como os fundos de pensão Previ, dos funcionários do Banco do Brasil, e Petros, da Petrobras, além do Opportunity, de Daniel Dantas, e Citigroup - não terão seus valores de venda revistos. Assim como os milhares de acionistas minoritários da BrT que já venderam as ações à Oi. Segundo uma fonte envolvida no negócio, a suspensão só vale para quem ainda tem os papéis. A alegação, explica a fonte, é que os atuais acionistas da Oi sairiam prejudicados se a relação de troca anterior fosse mantida.
Com isso, as ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da BrT tiveram a maior queda do Ibovespa, o principal indicador da Bolsa. Os papéis recuaram 10,84%, contra queda de 1,18% do Ibovespa. Fora do índice, as ações ordinárias (ON, com direito a voto) da BrT caíram 17,30%. Já a ação da Oi caiu 3,9% ontem.
Histórico polêmico com minoritários
Operacionalmente, não haverá mudanças em relação à fusão, e a companhia segue com seu processo de sinergias. A BrT tinha concessão para oferecer telefonia fixa nas regiões Sul e Centro-Oeste e autorização para atuar em telefonia móvel.
A nova provisão de perdas que levou à suspensão da incorporação das ações é relativa às decisões judiciais envolvendo clientes do Rio Grande do Sul, área de concessão da antiga BrT. As ações remetem ao período anterior à privatização das empresas do setor, como as do Sistema Telebrás, quando os clientes compravam um Plano de Expansão, que dava direito a uma linha telefônica e a ações da empresa. No RS, muitos clientes da BrT contestaram judicialmente o cálculo do preço dessas ações no momento da venda - que costumava ocorrer anos depois da aquisição. Isso porque as telefônicas pagavam aos clientes com base no mês em que os papéis eram comprados, só que os clientes exigiam receber o valor no fim daquele ano, para se beneficiar com a hiperinflação. Com isso, há indenizações que chegam a R$100 mil.
Em março passado, a Oi informou que havia feito provisões de perdas de R$1,450 bilhão, o que incluía diversos passivos tributários, trabalhistas e cíveis. Na ocasião, já informava que o passivo poderia ser maior.
Em maio, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que novas decisões judiciais envolvendo o pagamento das ações da BrT no RS teriam de ser feitas com base no mês em que foram compradas, encerrando a questão. A partir daí, a Oi contratou a BDO Trevisan Auditores Independentes para calcular exatamente o passivo.
- Depois do acórdão do STJ, a Oi decidiu contratar a BDO para ter um valor mais detalhado, pois não havia uma visão clara sobre o assunto - diz a fonte envolvida na operação.
Segundo essa mesma fonte, a Oi não tem obrigação de comprar as ações dos atuais acionistas minoritários da BrT, se eles considerarem o valor muito abaixo do que havia sido estabelecido. Pelo acordo anterior, uma ação ON da BrT equivalia a 0,4137 ação ON da Telemar e um papel PN da BrT valia 0,2530 ação ON da Telemar.
- Do outro lado, se a relação for desvantajosa, quem sai prejudicado é o acionista da Oi. Por isso, a Oi não tem pressa para refazer essa conta de relação - explica a fonte.
Caso a proposta da nova relação de troca, que será levada à uma Assembleia Geral, não for aprovada pelos donos das ações da BrT, a supertele irá continuar com as diferentes classes de ações na Bolsa.
- O lado ruim disso é o que aconteceu hoje (ontem), com a queda no preço dos papéis - afirma um executivo do setor.
A operadora, porém, deverá receber questionamentos das partes envolvidas. O principal deles é se a nova relação de troca de ações vai incluir todo o passivo divulgado ontem ou apenas o valor antigo. Como a compra da BrT foi feita de "porteira fechada", a Oi não teve acesso a esses números na época da oferta de compra.
- É importante saber se todo esse rigor de provisionamento feito na BrT se aplica também às contas da Oi. A relação de troca das ações foi estabelecida em valor de mercado, não incluía os passivos. É um absurdo se os antigos controladores não tiverem de devolver parte do dinheiro. Assim, mais uma vez, o minoritário perde - diz uma das partes envolvidas.
Segundo Eduardo Teixeira da Silveira, sócio do Lobo & deRizzo Advogados, alguém vai perder:
- O minoritário vai sair perdendo. E como os antigos controladores da BrT são os mesmos que estão na Oi, o ressarcimento pelos controladores é um assunto que vai ser evitado.
Segundo Daniella Marques, gestora da Oren Investimentos, o cancelamento da oferta foi mais uma sinalização ruim sobre a governança da Oi.
- É um problema recorrente na empresa e acho que será difícil ver, da parte deles, algum alinhamento com o minoritário - avaliou ela.
Procurada, a CVM disse que as operações de reestruturação societária são analisadas pela Superintendência de Relações com Empresas.
Além dessa questão, a Oi enfrenta problemas de captação. A empresa se endividou muito para a compra da BrT. Com dívidas de R$21,528 bilhões (setembro de 2009), a Oi informou em dezembro que não havia atingido índices financeiros exigidos por credores, o que lhe impede de pegar novos empréstimos.
Entre os papéis que puxaram a queda da Bolsa ontem estiveram ações do setor bancário, que seguiram queda registrada em Nova York. O índice Dow Jones recuou 0,94%, e o Nasdaq, 1,24%. O dólar subiu 0,45% para R$1,773.