Título: Início de ano turbinado
Autor: Almeida, Cássia; D¿Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 19/01/2010, Economia, p. 17

Com consumo maior e queda do calote, BC deve subir juros para conter inflação

Cássia Almeida, Ronaldo D¿Ercole, Fabiana Ribeiro e Patrícia Duarte

RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA.

Esse janeiro não vai ser igual àquele que passou. Com a confiança tanto do empresário quanto do consumidor em alta, os primeiros indícios do forte aquecimento da economia começam a aparecer nos indicadores econômicos, a ponto de os analistas de mercado ouvidos pelo Banco Central já terem aumentado, pela segunda semana seguida, a expectativa de alta da taxa de juros Selic, atualmente em 8,75% ao ano, para conter o consumo aquecido e evitar a subida da inflação. Um comportamento inverso ao que se viu no começo de 2009, quando o país estava no meio da recessão.

Os indicadores antecedentes, aqueles que mostram em qual velocidade anda a economia, estão em sua maioria em alta. A LCA Consultores olha para três setores: consumo de energia (alta de 1,7% frente a dezembro), venda de veículos (-6%) e importações (5,6%). Todos estão em alta, com exceção dos veículos. Bráulio Borges, economista-chefe da LCA, explica que houve antecipação de compra de carros diante dos estímulos fiscais no ano passado. Outro indício de retomada está no levantamento da Confederação Nacional do Comércio, que mostra que há espaço para as famílias se endividarem, já que apenas 60,2% dos consumidores estão com dívidas: ¿ O ajuste de estoque acabou e toda a demanda vai se transformar em mais produção. A expansão, dessa vez, vem dos investimentos. O licenciamento de caminhões e ônibus está ladeira acima há três meses.

No varejo, alta de 5,1% em janeiro

Segundo Borges, outro fator a dar impulso ao investimento das empresas é o crédito. A inadimplência começou a cair e a rede bancária, que vinha ainda cautelosa em financiar o setor produtivo, começa a fornecer crédito, ao lado do BNDES, que passou boa parte do ano de 2009 como uma das únicas fontes para as empresas. Prova disso é que a Volks e a Peugeot Citröen anunciaram a contratação de 1.400 pessoas somente em suas unidades no Estado do Rio.

Paulo Picchetti, responsável pelo Sinalizador de Produção Industrial da Fundação Getulio Vargas confirma que o setor começa 2010 em forte recuperação, devido à retomada das exportações, do nível de emprego e da confiança dos empresários para investir: ¿ O alento maior é que os setores ligados a investimentos (máquinas e equipamentos), que tiveram grandes baixas em 2009, voltaram a sinalizar expansão.

Vendas em alta e queda na inadimplência.

O indicador de vendas a prazo, do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), aponta alta de 5,1% nas vendas da primeira quinzena de janeiro ante a segunda de dezembro. Na mesma comparação, o SCPC/Cheque, que mede as vendas à vista, aumentou 8,5%. Os carnês em atraso caíram 2,6% no período, enquanto os cancelamentos (dívidas que saíram do registro do SCPC) cresceram 8,2%: ¿ Há crédito abundante, queda dos juros e prazos mais longos do crediário. Ao longo do ano, a previsão é que o varejo cresça entre 5% e 6% ¿ prevê o economista da Associação Comercial de São Paulo, Marcel Solimeo.

CNC: consumidor pode ter mais dívida

Na avaliação da Confederação Nacional do Comércio (CNC), há espaço para se ampliar o consumo ¿ especialmente de bens duráveis ¿ nos próximos meses. Segundo pesquisa da entidade com cerca de 18 mil entrevistados, a parcela de famílias brasileiras endividadas é de 60,2%.

Contudo, apenas 9,2% dos consumidores não terão como pagar suas dívidas em janeiro. Para Carlos Thadeu de Freitas, chefe da Divisão Econômica da CNC, há espaço para o consumidor assumir novas dívidas: ¿ Em média, 28,4% da renda estão comprometidas com dívidas.

No mercado, esse aquecimento da economia se refletiu na expectativa de juros maiores este ano. Pela segunda semana seguida, o mercado elevou a projeção sobre os juros básicos da economia, segundo a pesquisa semanal Focus do Banco Central. Os especialistas acreditam que a Selic fechará 2010 em 11,25% anuais, 0,25 ponto percentual a mais do que a projeção anterior. O movimento de alta começaria em abril. O Ministério da Fazenda diz que há espaço para crescimento sem inflação. Segundo os assessores do ministro Guido Mantega, o atual quadro sinaliza que o PIB tem condições de crescer entre 5% e 5,5%, sem risco de pressão inflacionária. n