Título: Campanha por conta do Senado
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 17/01/2010, O País, p. 3
De olho na reeleição, senadores usam verba do gabinete para fazer até pesquisas eleitorais
Às vésperas do início da campanha, senadores que disputarão eleições em outubro têm usado a verba indenizatória para turbinar a própria imagem e fazer propaganda de suas ações em jornais e emissoras de rádio e TV. Levantamento do GLOBO mostra que, nos últimos cinco meses, 43 parlamentares-candidatos gastaram dinheiro público para comprar espaço na imprensa ou pagar serviços de gráficas, produtoras de vídeo e agências de publicidade. A verba de gabinete foi usada até para contratar institutos especializados em pesquisas eleitorais.
O artifício dá uma vantagem extra aos senadores, que, além de não serem obrigados a se licenciar do cargo para concorrer, já contam com exposição gratuita em veículos oficiais como a Rádio Senado, a TV Senado e a "Voz do Brasil". O ato que regulamenta o uso da verba estabelece que o dinheiro deve ser destinado ao pagamento de despesas "diretas e exclusivamente relacionadas ao exercício da função parlamentar". Como exemplos, o texto cita gastos com transporte, aluguel e compra de material de escritório.
Senadores negam conotação eleitoral
Dois senadores em campanha pediram reembolso pela contratação de institutos de pesquisa: Gim Argello (PTB-DF), pré-candidato ao governo do Distrito Federal, e Efraim Morais (PTB-PB), que tenta a reeleição. Entre novembro e dezembro, Gim deu R$14 mil ao Instituto Exata Opinião Pública. No mesmo período, jornais e blogs políticos de Brasília divulgaram levantamentos da empresa em que ele aparece até em simulações de segundo turno, embora não passe de 6% das intenções de voto no Datafolha. Apesar de as datas dos repasses e das pesquisas coincidirem, o senador disse só ter contratado o instituto para atividades ligadas ao mandato.
- Fiz diversas pesquisas para identificar o que Brasília precisa. O instituto serve para detectar o que falta no Distrito Federal. É através das pesquisas que eu descubro - explicou-se.
Acusado de empregar cabos eleitorais em seu gabinete na Paraíba, Efraim repassou R$9 mil ao Exato Instituto de Pesquisa de Opinião Pública e Estatística, com sede em Campina Grande. Ele foi procurado para justificar o gasto, mas não respondeu.
Outros senadores admitiram que o uso da verba indenizatória em ações de marketing amplia suas chances de se elegerem. Adelmir Santana (DEM-DF), que repassou R$66,9 mil à agência Bgens Multimídia para reformular seu site pessoal, admitiu que o objetivo da despesa foi reforçar a própria imagem com o eleitorado de Brasília.
- Quem não é dono de emissora precisa tirar o máximo de proveito da internet para se aproximar do eleitor. Lamentavelmente, há uma desigualdade no sistema eleitoral. Não há dúvida de que os candidatos que estão no exercício de funções públicas já saem com vantagem na campanha - disse Santana, que também pagou R$10,5 mil à agência Ícone Comunicação.
A senadora Fátima Cleide (PT-RO), que paga R$6,3 mil por mês à agência Atua Comunicação, disse que o dinheiro é aplicado na produção de outdoors, programas de rádio e outras ações de marketing. Ela afirmou que preferia não usar a verba indenizatória para fazer propaganda, mas alegou que, sem a despesa com recurso público, não teria condições de concorrer à reeleição:
- Eu sonhava não precisar da verba indenizatória para isso, mas meus adversários são empresários e têm dinheiro para pagar mídia e aparecer mais. Quem não é visto não é lembrado, e eu sou uma das políticas mais esquecidas no meu estado.
Parlamentares que usaram a verba de gabinete para comprar espaço publicitário disseram não ver conotação eleitoral na despesa. José Agripino Maia (DEM-RN), que repassa R$5 mil mensais à Rádio Cultura de Macaíba e quantias menores a outras emissoras, disse que o dinheiro garante a transmissão de um programa diário de cinco minutos sobre o seu mandato.
- O político tem obrigação de prestar contas do seu mandato, e a população pode checar se você está fazendo o que diz no rádio. O mais fácil seria não fazer nada e se esconder - disse Agripino, que defendeu o gasto maior com uma só emissora:
- É caro, mas a rádio é campeã de audiência. Alcança um milhão de ouvintes.
O Senado não revela os gastos anteriores a abril de 2009, quando os pagamentos passaram a ser divulgados em seu Portal da Transparência. A partir de fevereiro de 2008, é possível ver as despesas por categoria, mas não as empresas que receberam o dinheiro. Apesar dos pedidos desde o último dia 7, a Secretaria de Comunicação Social da Casa não informou o total de despesas em 2007, 2008 e 2009, o que permitiria saber se houve aumento do gasto em ano pré-eleitoral.
Com base nos dados disponíveis, O GLOBO identificou casos de elevação expressiva das despesas com "divulgação da atividade parlamentar". Entre 2008 e 2009, o gasto de Paulo Paim (PT-RS), candidato à reeleição, passou de R$14 mil para R$63 mil, um salto de 347%.
- Vou continuar usando a verba para divulgar meu trabalho. Não tem nada a ver com campanha. Mas sou a favor do fim da verba indenizatória. Devíamos receber um salário maior, sem esses penduricalhos - disse ele.