Título: Há uma espécie de apartheid social
Autor: Paul, Gustavo; Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 17/01/2010, O País, p. 8

ROBERTO FONSECA

Presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia, o médico Roberto Porto Fonseca diz que é prioritário investir mais em saúde porque os pacientes do SUS, muitas vezes, não recebem o tratamento adequado.

Catarina Alencastro

Qual o principal problema do tratamento de câncer no Brasil?

ROBERTO FONSECA: Nós deveríamos ter campanhas perenes, por parte do governo, no que diz respeito a prevenção primária e diagnóstico precoce. O início do tratamento precoce traz a redução da mortalidade. Esse é o principal problema do nosso país. Não temos feito o diagnóstico precoce porque nem sempre você dá acesso ao paciente para que ele descubra o mais rápido possível que está com a doença, comece tão logo o tratamento e faça avaliações periódicas.

E o tratamento disponível no serviço público, é adequado?

FONSECA: Você tem uma fila de milhares e milhares de pacientes esperando para serem atendidos por um aparelho de radioterapia. Isso é um absurdo. Outro problema diz respeito à inserção de novas tecnologias. Todos os dias aparecem tratamentos novos.

O SUS falha em oferecer medicamentos modernos?

FONSECA: Nem todos são incorporados pelo SUS. Falta dinheiro? Bem, então tem que tirar dinheiro de outro lugar, porque saúde é, pelo que me consta, prioridade número um para qualquer ser humano. Nem que seja preciso, em vez de comprar aviões da França, investir mais em saúde.

Então quem tem dinheiro recebe o melhor tratamento e quem não tem está enrascado?

FONSECA: É isso mesmo. No Brasil para quem pode pagar, você não tem nada que fique a desejar para outros países. Os centros especializados são tão bons quanto os americanos, não há dúvida. A questão toda é que, num país onde a Constituição diz que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, o paciente do SUS está precisando melhorar. No que diz respeito ao acesso ao melhor tratamento de câncer disponível no país, há uma espécie de apartheid social.