Título: Mais uma crise no governo
Autor: Oliveira, Eliane; Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 09/01/2010, O País, p. 3

Ministro da Agricultura critica Programa de Direitos Humanos e é contestado por colega

BRASÍLIA

Depois da crise envolvendo as Forças Armadas e o ministro Paulo Vannuchi (Direitos Humanos), o Programa Nacional de Direitos Humanos gerou novo confronto no governo. Desta vez, os ministros Reinhold Stephanes (Agricultura) e Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) expuseram ontem publicamente divergências em relação ao programa, que invade praticamente todas as áreas de ação do governo e também trata de reforma agrária. Stephanes, aliado dos ruralistas, disse que o programa ataca o agronegócio. Cassel, próximo dos movimentos sociais, defendeu o decreto e afirmou que, no Brasil, ¿há quem aposte na violência no campo e na truculência¿.

O ministro da Agricultura se queixou de que sua pasta não foi convidada a participar das discussões do programa e afirmou que o decreto que o editou cria insegurança jurídica, ao flexibilizar as regras para reintegração de posse de propriedades invadidas.

Stephanes também se queixou de que o ato demonstra preconceito contra a agricultura comercial.

¿ Ele (o decreto) aumenta a insegurança jurídica no campo. Da forma que está colocado, traz esse preconceito implícito em relação à agricultura comercial ou ao agronegócio, como também aumenta a insegurança jurídica que nós já temos em função de várias outras questões ¿ afirmou.

Cassel diz que plano é contemporâneo

Cassel defendeu o modelo proposto no Programa de Direitos Humanos de só cumprir a reintegração de posse de áreas invadidas após a realização de audiências de conciliação. Disse que esse sistema tem sido adotado por vários juízes, antes de se conceder liminar para retirada dos sem-terra. Diante das críticas do agronegócio e de Stephanes, Cassel respondeu: ¿ Neste país tem gente que aposta no diálogo, na negociação e na solução pacífica dos conflitos. E tem quem aposte na violência, na truculência e na solução de liminar. A violência no meio rural sempre serviu para encobrir grilagem de terra pública, para encobrir trabalho escravo e devastação ambiental. Infelizmente, tem gente que gosta de polícia, de tiro e de mortes.

Para Cassel, o Programa de Direitos Humanos é contemporâneo: ¿ É um plano que passou por muitas mãos, por conferências no Brasil todo. Ele é contemporâneo, se preocupa com meio ambiente, com direitos sociais, com cidadania, com a não violência, direitos das mulheres. Enfim, com temas que são caros a todos.

O decreto também tem sido criticado por abordar temas variados, como taxação de grandes fortunas, impacto da biotecnologia e mudanças nas regras de concessão de rádio e TV.

Stephanes disse que não se pode mais dividir a agricultura em familiar e comercial, já que há uma classe média rural em crescimento. O ministro deixou claro que não participou da elaboração do decreto: ¿ Se houve debate, o Ministério da Agricultura não participou. Temos que participar dessa discussão.

Stephanes afirmou que levará sua posição diretamente ao presidente Lula. Disse que, ao participar dos debates, tentará modificar o plano.

A Secretaria Especial de Direitos Humanos informou que não procede a crítica de Stephanes de que sua pasta não participou da discussão. Representantes do Ministério da Agricultura participaram e, segundo a secretaria, enviaram sugestões incluídas no texto.

Apesar de criticar o programa, Stephanes descartou prejuízos financeiros causados pelo decreto.

¿ Nós já temos insegurança jurídica com relação a invasões, a questões do código ambiental, a questões indígenas e a outras questões quilombolas.

Stephanes ressaltou as qualidades do agronegócio brasileiro: ¿ É um dos mais eficientes do mundo.

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